Thursday, 28 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

As razões ocultas do magnata midiático

Jeff Bezos, o rei do livro eletrônico, comprou o Washington Post por uma cifra que poderia ser considerada uma balela e foi a notícia da semana. Por que comprou e o que implica para o futuro incerto dos jornais em formato papel?

Ninguém sabe ainda como interpretar a compra do Washington Post por Jeff Bezos. O Post, fundado em 1877, é um dos jornais mais influentes dos Estados Unidos, junto ao ‘The Wall Street Journal’ e ‘The New York Times’. Além de ser o primeiro matutino que leem todos os políticos da cidade mais poderosa do mundo, é famoso internacionalmente por sua cobertura do escândalo de Watergate durante o governo de Richard Nixon, que resultou na renúncia do presidente (a primeira e única vez que aconteceu na história do país).

Jeff Bezos, sabemos todos, é o fundador, dono e CEO da Amazon.com e um dos homens mais ricos do planeta. Tem 49 anos de idade. Além de revolucionar o mercado de comércio eletrônico (e consequentemente prejudicar gravemente a tradicional venda varejista em todos os ramos comerciais) foi o líder da revolução do e-book, tanto do lado comercial como do elegante e útil dispositivo que sua empresa desenhou para comprar, armazenar e ler livros eletrônicos, o Kindle (que por sua vez, prejudicou gravemente, a indústria editorial tradicional e a das livrarias).

O jornal custou a Bezos 250 milhões de dólares, 1% de sua fortuna pessoal, segundo a revista Forbes, e ele pagou em espécie. Como você ou eu compraríamos uma torradeira em um supermercado, à vista.

Talvez o mais surpreendente de todo este assunto seja o módico preço pago pelo jornal. Para Bezos é um investimento de risco financeiro zero. Repetimos, representa 1% de sua riqueza. Há dezenas de times de futebol que valem muito mais que isso. Somente o contrato de rescisão de Lionel Messi do Futbol Club Barcelona é de 250.000.000 de euros, 33% mais do que o Washington Post custou a Bezos.

Com o Washington Post em seu poder, Bezos não apenas comprou um jornal. Comprou um lugar em Washington. Comprou, também, a agenda mais impressionante que existe no planeta. E um meio no qual, seguramente, iniciará uma série de experiências desde o tecnológico até o comercial e jornalístico, que podem se tornar um marco na tão prometida mudança definitiva do formato, dos jornais de papel ao digital.

Influência política

Em uma sucinta carta aos empregados do Post, publicada no dia 5 de agosto, Bezos assegurou que não ia mudar a política editorial do jornal nem seus valores centrais. Também afirmou que não estaria dirigindo o jornal em suas operações cotidianas, mas que continuaria no outro Washington com o trabalho que ama.

A mais vigorosa linha desta carta de apenas um parágrafo diz:

O jornal continuará respondendo aos seus leitores e não aos interesses privados dos donos. Continuaremos perseguindo a verdade, seja onde for que nos leve e trabalharemos duro para não cometer erros. Quando os cometamos, os admitiremos rápida e completamente.

Bezos é um dos homens de negócios mais astutos de sua geração. Viu oportunidades que hoje parecem óbvias, mas que em seu momento pareciam receitas de fracasso. Se existe algo garantido, é que o Post não foi comprado o Post para obter dinheiro. Pelo menos não no formato no qual está hoje.

Há tempo que o negócio dos jornais em papel não rende. Segundo uma matéria na Businessweek, o Washington Post perdeu 44% de lucros nos últimos seis anos. Donald Graham, o encarregado do jornal familiar disse, explicando sua venda, que não poderia continuar perdendo o dinheiro de seus acionistas.

Ainda que alguns especulem que a compra de Bezos tenha sido para aumentar sua influência política em Washington e assim favorecer sua própria empresa, há outros que enfatizam que Bezos sempre teve uma veneração pela palavra escrita e pelos jornais.

Poucos dias atrás a página Nieman Journalism Lab publicou uma extensa matéria com dezenas de links vinculados ao debate sobre qual foi a motivação de Bezos para sua compra. Esta página, especializada em jornalismo, ressalta pela mera proliferação de ideias contraditórias que se publicaram em diversos jornais estadunidenses o que afirmamos no começo desta matéria: não se sabe por que o fez e ninguém sabe o que vai acontecer.

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Andrés Hax é jornalista do Bitácora, do Uruguai