Tuesday, 19 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1279

À beira do abismo

Certa vez, o New York Times citou como exemplares as características da imprensa norte-americana; atualmente, elas simbolizam a profunda enfermidade da indústria. A circulação da ‘Grande Dama’, como é conhecido o NYT, está despencando – caiu mais 3,9%, de acordo com os dados mais recentes do Audit Bureau of Circulations (ABC) dos Estados Unidos. Suas receitas com publicidade também caíram (12,5% mais baixas no mês de março, em relação ao ano passado), assim como as ações da empresa, New York Times Company, que subiram em relação ao mês de janeiro, mas ainda estão 20% abaixo do que estavam em julho de 2007. No dia 29 de abril, a Standard & Poor’s classificou o débito da empresa em um ponto acima de zero.

Na reunião anual da empresa, uma semana antes, seu acuado diretor Arthur Sulzberger tentou rejeitar os boatos de que sua família se estaria preparando para se descartar da empresa que possui desde 1896, declarando que ‘esta firma não está à venda’. Num esforço para acalmar seus críticos, Sulzberger concordou em trazer para a diretoria dois representantes de um hedge fund com nomes ameaçadores, Firebrand e Harbinger. Espera-se por um massacre nos andares da redação da lustrosa sede do Times, quando serão cortadas dúzias do que já foram os mais seguros empregos em jornalismo – uma vez que serão poucos os que aceitarão uma generosa oferta de demissão voluntária.

Disputa de gigantes

História semelhante pode ser encontrada em quase todos os jornais norte-americanos. Segundo a emissora ABC, a circulação média dos 530 maiores jornais diários caiu 3,6% em relação ao mesmo período do ano passado; no caso dos jornais semanários, a queda foi de 4,6%. As receitas com publicidade despencam – no caso da Media General, a queda foi de 22,3%. Em 2007, o faturamento das empresas jornalísticas caiu para US$ 42,2 bilhões – uma cifra que nada tem de insignificante, mas bem abaixo de seu pico de US$ 48,7 bilhões, em 2000.

Grande parte desse declínio é atribuído à ascensão da internet, que oferece uma cobertura jornalística gratuita, 24 horas por dia, e que proporcionou um espaço novo e melhor para os classificados, que já foram a base mais sólida da receita da maioria dos jornais. Parte desse declínio, entretanto, se deve à desaceleração da economia norte-americana, em especial no mercado imobiliário, que contribui com grande parcela para a publicidade. É o caso da Media General, que ficou particularmente exposta nas regiões em que o mercado despencou abruptamente, através de jornais como Tampa Tribune, da Flórida.

O arrocho no crédito também veio em má hora para um grupo de donos de jornais que usava empréstimos – facilmente disponíveis até o verão passado – para sustentar seus negócios e, atualmente, terão que pensar duas vezes. Sam Zell, o magnata que comprou a Tribune Company – proprietária de jornais como o Chicago Tribune e o Los Angeles Times – está achando que as coisas estão piores do que se esperava. Está tentando vender o Newsday, um tablóide nova-iorquino envolvido numa disputa dura entre dois outros gigantes, Mort Zuckerman e Rupert Murdoch, e talvez outras empresas. É esclarecedor, no que diz respeito à indústria, que qualquer deles provavelmente incorporaria o Newsday a um de seus respectivos tablóides – o New York Daily News e o New York Post – ao invés de tentar preservá-lo por si só.

Capacidade de reagir

O entusiasmo de Murdoch é um lembrete de que nem todos os jornais estão debilitados. Ele comprou o Wall Street Journal no ano passado e vem investindo numa expansão significativa de seu noticiário político e internacional. Essa incursão no tradicional reduto do Times parece estar funcionando: a circulação do Journal vem aumentando. O clima alegre em sua redação está em franco contraste com o restante da indústria – embora Murdoch tenha pisado na bola esta semana ao demitir o editor do jornal, apesar de ter garantido que não iria interferir na linha editorial por ocasião da compra. Outro exemplo de êxito é o website Huffington Post, que vem rapidamente passando de uma série de blogs políticos para um jornal completo, com abordagens liberais, próximas às do New York Times.

Estudiosos da indústria das comunicações como Lauren Rich Fine, da Kent State University, não acham que o Times venha reagindo adequadamente. ‘Agora é o momento de fortalecer o setor comercial’, diz ela. Lauren Fine também alerta para o fato de que, embora todos os jornais estejam sendo atacados pela internet, sua capacidade de reagir provavelmente irá depender de seus públicos – nacional, metropolitano ou local. No primeiro caso, é possível investir numa cobertura internacional ou econômica diferente; no último caso, podem prosperar tornando-se ‘mais intensamente locais’. No entanto, ele mostra receio no que se refere aos grandes jornais metropolitanos, que podem ficar presos no meio.

Porcos voadores

Entretanto, nem tudo está perdido. Vêm ocorrendo muitas novidades, principalmente nos jornais locais, como demonstra o último relatório ‘Newspaper Next’, do Instituo de Imprensa Norte-americano, um grupo empresarial. Cita 24 exemplos de jornais que se tornaram ‘informações e contatos de utilidade pública’ por meio de iniciativas como fóruns locais por internet. O Pocono Record passou a chamar os repórteres de ‘gerentes de conteúdo’, uma vez que eles supervisionam toda a cobertura, impressa e online, e recebem um abono por aumento de visitas ao site.

O herói, para os otimistas da indústria da comunicação, é Brain Tierney, um ex-executivo de relações públicas que liderou um grupo de investidores que fez um empréstimo bastante alto para comprar os dois principais jornais diários de Filadélfia. De lá para cá, os jornais ganharam fôlego com um forte impulso de marketing. Tierney também encontrou novas formas de incentivar a publicidade, tais como a criação de uma coluna de negócios patrocinada por um banco local. Num discurso recente, ele disse que era voz corrente que porcos iriam voar antes que a circulação aumentasse, para, em seguida, revelar que comemorou o aumento da circulação projetando porcos voadores nas paredes do Philadelphia Inquirer.