Tuesday, 19 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1279

A mídia e as beldades de Momo

Como em toda cobertura do Carnaval, as mulheres foram o grande destaque. Ou melhor, a nudez feminina. ‘Elas são um espetáculo’, disse a revista Veja, encerrando a cobertura de Carnaval (13/02/2008) nas duas páginas de fotos de mulheres vestindo biquínis e plumas. Resumiu em tópicos o texto sobre as escolhidas. Os dois primeiros itens do texto legenda eram, no mínimo, reveladores: o tamanho dos seios e a exposição corporal, que ia de baixa a extrema. Por pura falta do que dizer, a legenda terminava com o ‘diferencial’ de cada uma. Preciosidades do tipo ‘exemplo de integração nipo-brasileira’, ‘simpática e querida por todo mundo, principalmente por um admirador secreto’, ‘o conjunto e a conservação da obra, que mulher acima dos 40 não queria estar igualzinha?’

O jornal O Estado de S.Paulo também abusou das fotos de mulheres seminuas, mas encontrou uma boa justificativa, transformando as imagens em ilustração para matérias que discutem a nudez feminina no Carnaval.

A primeira dessas matérias foi publicada na segunda-feira (4/2). Depois de discutir em mais de meia página o ‘duelo da ex e a atual de Belo’ (o título é incompreensível para não iniciados, mas supõe-se que os leitores do jornal devem saber quem são elas e quem é o personagem motivo da briga) e mostrar imensas fotos das moças, a matéria de pé de pagina diz: ‘Tendência é reduzir ainda mais mulheres nuas’.

Segundo carnavalescos de escolas de samba de São Paulo, a tendência é de que as musas das avenidas cubram seus corpos cada vez mais – ou ao menos, um pouco mais. Eles dizem que se trata de uma evolução natural do carnaval,que passou a respeitar mais a mulher e quer descolar o rótulo de ser apenas uma festa libertina: ‘Já não há espaço para apelação. Hoje, mulher pelada nos desfiles só se estiver completamente coerente com o enredo’, diz o carnavalesco da Vai-Vai. ‘As escolas estão investindo mais na beleza das fantasias. É até uma questão de respeito, não se pode tratar as mulheres como se fossem aviõezinhos de propaganda, levando seus corpos de lá para cá’ (4/2/2008).

70 minutos de fama

Reconhecer que as mulheres eram desrespeitadas nos desfiles é uma excelente notícia. O difícil vai ser convencer as próprias ‘beldades’. A matéria da terça-feira de carnaval (também amplamente ilustrada com fotos de mulheres pouco vestidas) explica por que a nudez é bem-vinda entre as estrelas do desfile: ‘A exposição gera convites para posar em revistas e atuar em campanhas publicitárias, entre outros trabalhos… Para as rainhas de bateria do carnaval do Rio, aqueles cerca de 70 e poucos minutos de desfile, transmitidos ao vivo para quase 190 países, também se transformam em cachês polpudos, convites para festas, capas de revistas, contratos publicitários, um carro novinho em folha, talvez até um apartamento… É uma valorização de passe instantânea, uma visibilidade digna de Big Brother Brasil, em apenas uma noite’ (5/2/1008).

Com argumentos desse tipo, fica difícil acreditar que os carnavalescos – que agora estão adotando o marketing da valorização feminina – consigam fazer seu ponto de vista prevalecer. Vão privar os jornais de fotos sensacionalistas, vão tirar da televisão um dos grandes atrativos dos desfiles e, principalmente, vão tirar das adeptas do silicone e da malhação a sua chance de ter, não cinco, mas 70 minutos de fama? Se eles vão ter sucesso, só saberemos no Carnaval do ano que vem.

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Jornalista