Friday, 19 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

As redações como laboratórios de jornalismo participativo

Se as redações quiserem ajudar a frear a disseminação de desinformação online e ter acesso a melhores testemunhas oculares da mídia, deveriam assumir o engajamento com as comunidades. Trazer as comunidades para dentro do processo da informação é uma ferramenta poderosa para disseminar valores jornalísticos, treinar moradores nos processos da reportagem e fomentar o conteúdo produzido pelos usuários, que é mais útil para as redações. As redações estão bem situadas para se tornarem laboratórios de jornalismo participativo, ajudando mais pessoas a navegar, verificando e criando matérias fortes via internet e redes sociais.

No mês passado, depois que um jovem na cidade de McKinney, no Texas, captou um vídeo de um policial sacando de uma arma contra adolescentes negros e imobilizando uma jovem no chão, o site de crítica da mídia On The Media produziu a matéria Breaking News Consumer Handbook: Bearing Witness Edition [Manual do consumidor de notícias de última hora: edição do fornecimento de provas] O manual [handbook] a que alude o título da matéria consiste de uma única imagem com 11 pontos de balas traçando os pontos importantes de um conselho legal, seguro, ético e tecnológico para pessoas que estejam gravando atividades da polícia para notícias de última hora. A matéria faz um excelente trabalho dissecando essas questões complexas e transformando-as em algo de fácil abordagem e relevante para a maioria das pessoas.

Na verdade, a “Edição do fornecimento de provas” já fazia parte do quinto Manual de notícias de última hora. No outono de 2013, quando divulgou a primeira edição do manual, o site On The Media publicou um texto dizendo que estavam cansados de dizer à mídia como poderia melhorar as notícias de última hora e, em vez disso, era sua audiência que lhes estava dando atenção. “Ao invés de contar com os veículos jornalísticos para que o façam corretamente, estamos olhando para o lado oposto”, escreveram eles. “A seguir vão algumas dicas de como, na esteira de uma matéria importante e trágica, você pode separar as boas informações das ruins.”

Liderar pelo exemplo

O Manual das notícias de última hora do On The Media é apenas um exemplo de como as redações podem autorizar as comunidades a melhorar o acesso a uma informação precisa e válida durante a divulgação da notícia. Várias redações vêm desmascarando publicamente informações como parte de seu trabalho. Exemplos disso são Objetivamente, do blog Gizmodo, e a coluna “O que foi falso na internet esta semana”, publicada regularmente pelo Washington Post. Neste caso, estas redações estão liderando pelo exemplo e ajudando a cultivar mais ceticismo em seus leitores. Alguns desses textos não se limitam a destacar fotos adulteradas e boatos, mas também explicam como os autores conseguiram desmascarar as falsificações – que ferramentas usaram, o que procuraram, as perguntas que fizeram.

Não basta simplesmente divulgar a notícia com exatidão; atualmente, precisamos que as redações ajudem a desmascarar a desinformação, principalmente nas notícias de última hora. E devíamos envolver nossas comunidades nesse esforço. Durante o noticiário de última hora, voltamo-nos para nossas comunidades, para as redes sociais, para juntar os fatos que estão acontecendo, para encontrar fontes e coletar imagens e fotos no local. É nessas pessoas que confiamos, nesses momentos. Portanto, deveríamos fazer tudo o que podemos para ajudar essas pessoas a compreender qual é a melhor forma de criar e compartilhar informações mais confiáveis.

Por que envolver os leitores?

Há inúmeros benefícios em envolver as nossas comunidades e treinar nossos leitores e vizinhos a serem participantes ativos e testemunhas oculares:

– Ajudamos a que eles nos ajudem ao criar vídeos, fotos e mesmo tweets e dicas que são mais úteis às redações e falar sobre o tipo de detalhes de que precisamos para verificar as reportagens no local.

– É mais provável que eles desmascarem a desinformação e ajudem a desacelerar a disseminação de boatos se não for compartilhada informação ruim.

– Eles terão mais consciência de seus direitos a coletar e disseminar informações e e irão defender esses direitos.

– Eles irão fazer a reportagem com segurança e levar em conta a ética jornalística.

– Isso pode ajudar a coordenar permissão e concessão de licenças.

– Torna o trabalho do jornalismo mais transparente, responsável e válido.

Além destes, há vários outros benefícios que podem advir de maior envolvimento da comunidade.

Este deveria ser um serviço que fornecemos a nossos leitores, mas através de colaborações com bibliotecas, escolas e organizações sem fins lucrativos podemos chegar a mais pessoas. Cursos abertos, maciços e digitais [Massive Open Online Course – MOOC, na sigla em inglês], como um sobre jornalismo literário que vem sendo oferecido pela Universidade do estado do Arizona [ASU, na sigla em inglês] também são ferramentas potenciais que podemos usar. Algumas redações, como as dos sites WHYY e Making Contact, estão investindo em treinamento de jornalismo comunitário, enquanto organizações como Media Mobilizing Project, Press Pass TV e Citizens Campaign têm um longo histórico de equipar e capacitar as comunidades através da mídia. Temos que garantir que essa verificação e o jornalismo literário também fazem parte desses esforços. (A verdade é que muitas redações e escolas de Jornalismo precisam de mais acesso a treinamento sobre verificação e mídia como testemunha ocular – o que é um dos objetivos da First Draft Coalition.)

Minha experiência trabalhando na interseção do jornalismo e das comunidades é de que as pessoas estão ávidas por ferramentas e estratégias para poder identificar melhor as notícias e informações confiáveis e para separar as informações com que são inundadas, principalmente em relação a crises, desastres e assuntos controvertidos em suas comunidades.

Aumentando a probabilidade da verdade

Em 2013, num evento sobre “verdade e confiança” organizado pelo Instituto Poynter, Clay Shirky argumentou que as pessoas estão procurando adotar conhecimentos de jornalismo e ceticismo porque, devido à inundação de informações em que navegam, não têm escolha. Já houve um tempo em que a confiança da audiência decorria, em grande parte, da escassez. A abundância de notícias e informações vem cultivando uma audiência mais sofisticada que não só quer compreender a notícia, como também o processo atrás dela. “O homem que lê um jornal, sabe qual é a notícia; o homem que lê dois, nunca tem certeza”, diz Shirky, brincando. Ele disse que atualmente nós devíamos pensar sobre a notícia do jeito que pensamos na previsão do tempo, acrescentando sempre uma probabilidade.

No evento de 2013 acima mencionado, Tom Rosenstiel, do Instituto de Imprensa Americano [American Press Institute], destacou que, embora uma diversidade de fontes nos possa ajudar a chegar à verdade, também é verdadeiro que, no meio de uma inundação de informações, é mais difícil criar o conhecimento porque temos que peneirar entre um maior número de detalhes. Diminuir a lacuna entre essas duas coisas é, muitas vezes, o trabalho do jornalismo durante as notícias de última hora. Como diz Dan Gilmor na apresentação do curso de jornalismo literário [MOOC] citado acima, “nós estamos numa época de sobrecarga de informação e muitas coisas que vemos, ouvimos ou lemos são equivocadas, desonestas ou mesmo perigosas. No entanto, você e eu podemos assumir o controle e fazer com que a mídia nos sirva – a todos nós – na medida em que nos tornemos consumidores atuantes e participantes”. Isso é uma boa notícia. Estamos todos nessa.

Quando se trata de dar a notícia de última hora – e do futuro do jornalismo, de uma maneira mais geral – estamos todos nessa.

Em momentos de crise, quando os fatos são uma questão de vida e morte, deveríamos ficar contentes de poder contar com mais pés no chão e deveríamos dar o exemplo, quando envolvemos nossas comunidades para nos ajudarem a fazer brilhar um holofote da verdade.

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Josh Stearns é diretor de jornalismo e sustentabilidade na Fundação Geraldine R. Dodge