Tuesday, 19 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1279

Como dissemos…

Observatório da Imprensa 6/02/2007: ‘A ministra Marina Silva, do Meio Ambiente, em cuja gestão o desmatamento da Amazônia foi reduzido em 50% – e que recentemente recebeu um prêmio da ONU por seu trabalho em defesa do ambiente – só mereceu pouco mais do que dez linhas em alguns jornais. Isso nos mesmos dias em que os mesmos diários deram páginas e páginas sobre o relatório divulgado na sexta-feira (2/2), em Paris, pelo Painel Inter-governamental sobre Mudança Climática (IPCC)…. Reconhecida internacionalmente, para a imprensa brasileira a ministra parece estar na categoria dos santos de casa que não fazem milagre. Principalmente quando o santo é mulher.’

Parece que o pedido de demissão foi o milagre que faltava para Marina da Silva ganhar espaço na imprensa. De manifestações internacionais à biografia completa, passando por artigos emocionados, Marina da Silva recebeu, por dois dias, mais espaço na imprensa do que em cinco anos de governo:

‘As forças mais destrutivas para a Amazônia exigiam a saída dela. O governo Lula deu o Plano Amazônia Sustentável (PAS) na mão do Mangabeira Unger. Isso obviamente foi uma tapa na cara da ministra’ Frank Guggenheim – diretor-executivo do Greenpeace (Folha de São Paulo, 13/05/2006)

‘Marina aprendeu a ler já adolescente, já que no Seringal Bagaço, a 70 km de Rio Branco, onde nasceu, não havia escolas. Mais tarde, em 1985, formou-se em História pela Universidade Federal do Acre… No ano passado, Marina recebeu o maior prêmio das Nações Unidas na área ambiental, o Champions of the Earth (Campeões da Terra). A ministra foi uma das sete personalidades premiadas.’ (Folha de São Paulo, 13/05/2006)

‘CAÍSTE DE pé! Trazes no sangue a efervescente biodiversidade da floresta amazônica. Teu coração desenha-se no formato do Acre e em teus ouvidos ressoa o grito de alerta de Chico Mendes. Corre em tuas veias o curso caudaloso dos rios ora ameaçados por aqueles que ignoram o teu valor e o significado de sustentabilidade. Na Esplanada dos Ministérios, como ministra do Meio Ambiente, tu eras a Amazônia cabocla, indígena, mulher. Muitas vezes, ao ouvir tua voz clamar no deserto, me perguntei até quando agüentarias’ . (Artigo de Frei Beto, publicado na Folha de São Paulo em 16/05/2008)

‘Foi por sua origem humilde, como a do presidente, e pela influência que tinha com as entidades conservacionistas no Brasil e no exterior, que Lula a escolheu para o Ministério… No Ministério do Meio Ambiente, Marina Silva não fez o que o Brasil precisava, mas o que determinavam sua formação e a sua ideologia. Debite-se essa desastrada experiência não a ela, mas a quem a escolheu para o cargo e nele a manteve por tanto tempo’ (Editorial de O Estado de São Paulo, 15/05/2008)

Marina da Silva voltará a ser notícia quando assumir, depois dos feriados, seu posto de senadora. Com toda a certeza a imprensa vai estar lá, esperando, da parte dela, críticas ao governo e ao seu sucessor. Se ela se limitar a manter a coerência, logo vai cair no esquecimento. Pois, como disse Dora Kramer em seu artigo Mico, porém dourado: ‘menos de 48 horas depois da demissão de Marina, o assunto predominante no noticiário era o substituto’. (O Estado de São Paulo, 18/05/2008)

O sucessor, com sua coleção de coletes e ‘exímio condutor de holofotes’ (como disse Dora Kramer) tem tudo para cativar a mídia. Ou tem, pelo menos, mais apelo do que a discreta e frágil Marina da Silva que, além de petista e ambientalista, era uma mulher que nunca deu à imprensa a chance de falar de sua maquilagem, sua roupa ou sua vida pessoal.

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Jornalista