Thursday, 18 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1283

Em defesa do bom profissional

O assunto já foi abordado algumas vezes pelo Observatório da Imprensa, assim como por outros, igualmente importantes, meios de comunicação do país. Porém, a discussão ainda gera polêmica e revela uma certa guerra indisposição entre os profissionais que possuem a mesma especialização, mas que escolheram diferentes formas de atuar no mercado de comunicação. Falta, primeiramente, bom senso e respeito entre os que ocupam funções distintas do jornalismo.

Recentemente, o jornalista Luiz Antonio Mello escreveu um artigo no Observatório da Imprensa intitulado “Açeçores de Imprenssa”, mencionando a crise na capacitação do profissional de assessoria, o que tem gerado uma rejeição generalizada a este profissional por parte dos jornalistas de redação. É certo que alguns assessores de imprensa, além de não possuírem nem mesmo a especialização em jornalismo, se utilizam, digamos, de práticas discutíveis. E, justamente pela proliferação desses poucos indivíduos, aqueles que trabalham com seriedade encontram dificuldade para ter acesso às redações. Vamos lembrar, porém, que um erro não deve justificar outro: se houve perda de controle sobre a proliferação de assessorias de todos os quilates, comprometendo essa ponta da comunicação, não se justifica que o pessoal das redações também reaja fechando os espaços, ou dificultado o acesso a eles indiscriminadamente. Há necessidade de um meio termo, de os sérios continuarem com espaço na redação.?

Uma peça da engrenagem

Muitos colegas, do lado de cá das assessorias (que, inclusive, já atuaram em redação, como eu), também relatam, com frequência, a difícil tarefa de exercer seu oficio tanto pela falta de espaços qualificados (fruto da crise que vivemos hoje no mercado carioca) como também pela receptividade dos colegas jornalistas. Muitas vezes, os que atuam nas redações recebem o assessor de forma hostil: mal o atendem via telefone – quando atendem; abordam o assessor, sem antes mesmo lhes darem a palavra por instantes, com frases como “É material? Pode deixar aqui….”; ou lançam mão de manobras que impossibilitam qualquer bate-papo, mesmo rápido. Alguns são tão inacessíveis que um profissional de assessoria pode ficar mais de uma semana tentando ter, ao menos, um contato. E quando consegue, é atendido por assistentes que também dificultam o acesso. Existem também aqueles que nem ao menos retornam, educadamente, com uma posição sobre o material sugerido, mesmo que seja para dizer que não interessa.

Pergunto: não seria esta a melhor e mais direta forma de aproveitar ou descartar uma informação sugerida pelo assessor? O que pouparia, inclusive, o tão precioso tempo do jornalista para finalização e entrega de sua reportagem, para edição ou fechamento de sua coluna e, ao mesmo tempo, facilitar a vida do assessor na busca, em tempo, de outro espaço para divulgação das atividades de seu assessorado? Alguns, porém, se acham acima do bem e do mal e fazem de sua tão honrosa profissão uma espécie de mercado que pode parecer beirar o corporativismo.

Isso funciona talvez porque, muitas vezes, o jornalista de redação confunde o destaque que tem, por exemplo, como figura jurídica (repórter, colunista ou editor do veículo X) com a pessoa física que é e passa a se achar uma celebridade. Despreparado para exercer essa função de celebridade, deslumbra-se e distancia-se de seu meio de origem e de seu real papel enquanto profissional, preferindo fazer de seu círculo autoridades, elites em geral, ou um grupo bastante seleto de “amiguinhos”. Se, em algum momento, é demitido ou retirado dessa posição, perde todo esse círculo imediatamente e cai na realidade quanto a seu real valor. Descobre, então, que não passava de uma peça da engrenagem da máquina de informar que são os veículos de comunicação.?

Que a assessoria não venha a ser demonizada

Muito deve ser modificado no que se refere à prática do assessor, justamente para não se generalizar. Porém, do outro lado, também existe a necessidade de que não haja deslumbramento de alguns colegas de redação com a evolução de suas carreiras. Não se pode perder o chão, assumindo posturas como a da inacessibilidade. Os jornalistas que têm o poder da caneta (e do PC) nas mãos não devem esquecer que sua matéria-prima sempre será a informação primária e esta quem mais detém são as assessorias de imprensa. Ou seja: as redações necessitam das assessorias e vice-versa.?

Outro ponto a se considerar é que, assim como ocorre no campo das assessorias – um número sem igual de profissionais recém-formados e mal treinados, disparando uma avalanche de e-mails e releases indiscriminadamente (prejudicando e até rotulando a imagem do assessor de imprensa) –, nas redações também existe um grande número de profissionais recém-formados que são jogados indiscriminadamente na elaboração de uma matéria, por exemplo e, pressionados pelo tempo, acabam, muitas vezes, veiculando a notícia de forma distorcida ou relatando equivocadamente determinado fato. A falta de preparo é generalizada. Ou seja, façamos justiça aos profissionais capacitados que existem tanto nas redações quanto nas assessorias, mas o despreparo existe nos dois lados de atuação desta nossa profissão.

Finalizando, devemos lembrar que a figura do assessor – não confundir com “açeçor” (fazendo alusão ao termo utilizado pelo colega Luiz Antonio Mello no artigo anteriormente veiculado por este canal) – existe e deve ser respeitada. O bom assessor (que também teve a mesma especialização profissional) exerce sua atividade honestamente facilitando o acesso da imprensa a informações relevantes de clientes que atuam nos mais diversos segmentos da sociedade (governo, ONGs, entidades privadas, associações de classe etc) ou fornecendo informações de interesse público a respeito de suas atividades, cujo resultado final para o jornalista será a notícia primária, o que interessa aos veículos e a seus públicos. Faço votos, portanto, para que essa especialização na profissão (que muito se confunde, é bem verdade, com função no campo das Relações Públicas – cujo tema merece outra análise) não venha a ser demonizada por conta de maus atores.

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Beatriz Lima é jornalista e diretora da BLNews