Tuesday, 23 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Estados Unidos vive
onda de fusões de jornais


Leia abaixo os textos de sexta-feira selecionados para a seção Entre Aspas.


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Folha de S. Paulo


Sexta-feira, 28 de abril de 2006


TV DIGITAL
Hélio Costa


TV digital, um passo adiante


‘Três ministros de Estado e sete assessores técnicos conduziram, em Tóquio, uma importante negociação sobre o padrão que poderá ser a base do Sistema Brasileiro de Televisão Digital (SBTVD). Os governos brasileiro e japonês chegaram a um memorando de entendimento que oferece elementos para que o presidente da República decida como será a televisão brasileira.


Chegar a essa conclusão implicou um longo amadurecimento do debate na sociedade e no Congresso Nacional. Representou também uma tomada de posição em termos de definição de prioridade de Estado e conveniência do interesse nacional.


A TV digital terá forte impacto econômico na sociedade nas próximas décadas. Por isso, o processo não poderia ser diferente. E, em Tóquio, o que se viu foi uma ação firme e estrategicamente conduzida pela delegação brasileira, o ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, o ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Luiz Fernando Furlan, este ministro das Comunicações e seus assessores.


Meu testemunho é positivo, sob três aspectos: de política pública, de mobilização de governo e de posicionamento internacional. No Japão, movidos por esses três parâmetros, demos um passo histórico, a ponto de podermos ter, nos próximos anos, como define o memorando assinado, a evolução de um sistema mundial de TV digital que o próprio ministro das Comunicações do Japão, Heizo Takenaka, ousou chamar de ‘padrão nipo-brasileiro’.


Do ponto de vista de política pública, o SBTVD parte de realidades concretas, a começar do modelo de radiodifusão brasileiro. A TV brasileira se implantou de forma aberta, gratuita e como serviço público concessionário. São empresas bem estruturadas, que ajudaram a formar a identidade nacional, empregam milhares de brasileiros, geram valor econômico e constituíram um padrão de excelência no mundo. Além de contribuírem para garantir o pluralismo, a democracia e as características de nossa sociedade, aberta e tolerante.


Imperfeições no sistema de concessão existem e devem ser corrigidas. Decisões regulatórias estarão em debate e vamos saber fazer o melhor, por meio da livre discussão e da plena assunção de responsabilidades dentro do governo e no Congresso Nacional.


Diante da nossa realidade, testes e comparações da comunidade científica e industrial brasileira, por meio dos 22 consórcios formados por cerca de 90 entidades de pesquisa, públicas e privadas, e 1.400 cientistas e técnicos, indicaram como padrão de modulação que melhor se ajusta às características e necessidades da televisão brasileira aquele que mantém a sua condição de aberta e gratuita com mobilidade. O governo, por meio do ministério, financiou esse processo com o emprego de R$ 60 milhões, desde a edição do decreto 4.901, de novembro de 2003.


Do ponto de vista da mobilização de governo, conseguimos eleger prioridades e definir metas. As novidades anunciadas em Tóquio não caíram do céu.


A Toshiba anunciou no Japão que enviará uma missão para os estudos da instalação aqui de uma fábrica de semicondutores. A política industrial, tecnológica e de comércio exterior brasileira listou essa área como prioridade. Sem essa indústria, o Brasil teria de se conformar com a montagem final de equipamentos, todos importados, com os desequilíbrios que isso implica. E o mais notável nem é o déficit da balança comercial. Chips e software, bases das tecnologias da informação e comunicação, são molas propulsoras da economia do conhecimento.


O compromisso japonês de engajar-se em processos de transferência de tecnologia para o Brasil e de incorporar tecnologias desenvolvidas pelos consórcios do SBTVD foi fundamental. A NEC anunciou a transferência de tecnologia para a fabricação de transmissores digitais. A Sony entende que já não pode competir fazendo televisores de tubos e de retroprojeção e tem de partir para os monitores de plasma e LCD.


Do ponto de vista do posicionamento internacional, o memorando coloca o Brasil em posição privilegiada. Incorporando as inovações desenvolvidas pelos nossos cientistas poderemos formular um sistema internacional aberto, cooperativo, permitindo a transmissão da televisão móvel e portátil grátis e, ainda, sujeito a evoluções. Poderemos mesmo buscar, por esse caminho, uma convergência de linguagens e aplicativos em todo o mundo, dada a inevitável evolução dos padrões.


O governo e a sociedade têm amadurecido nesse processo de definição de política pública. Aqui, sentem-se o peso e a virtude de uma decisão estratégica que caberá ao presidente da República com base no aconselhamento de seus assessores. O debate na sociedade vai continuar e deve estar, pelo menos este é o meu desejo como ministro e senador da República, à altura desta dimensão. O Brasil lidera na América Latina a discussão, o debate e a pesquisa sobre a TV digital para todos os cidadãos, de todas as classes, e não apenas para os que podem pagar pela TV a cabo ou via satélite. Trata-se de uma daquelas decisões que atravessam governos. Essa foi a delegação que o presidente Lula me conferiu quando assumi o ministério. A missão está sendo cumprida.


Hélio Costa, 66, jornalista, é ministro das Comunicações.’


FOTOGRAFIAS HISTÓRICAS
Flavia Marreiro e Raul Juste Lores


Fotos mostram a agonia de Che Guevara


‘Descobertas recentemente, as fotos da agonia do guerrilheiro argentino Ernesto Che Guevara, ícone mundial da esquerda e um dos líderes da Revolução Cubana, recompõem os seus últimos momentos no interior da Bolívia. Na foto mais conhecida até hoje, ele já estava morto.


O material chegou em um envelope anônimo às mãos do escritor argentino Pacho O’Donnell, ex-secretário da Cultura da Argentina e autor de uma conhecida biografia do Che. Foram publicadas primeiramente em fevereiro no jornal argentino ‘Clarín’, e na semana passada, acompanhados de um ensaio assinado pelo próprio O’Donnell, publicadas na revista semanal ‘Noticias’.


‘Imagino quem me mandou, mas não posso dizer. Até hoje em La Higuera [Bolívia] há muito medo de falar sobre isso’, disse à Folha. Segundo ele, as fotos foram publicadas num livro de pouca circulação escrito por Federico Arana Serrudo, que era, em outubro de 1967, chefe da inteligência militar do Estado-Maior boliviano.


‘O texto era uma defesa dos militares que mataram Che, por isso não teve maior repercussão’, especula. Ele não procurou o militar boliviano nem sabe se está vivo. ‘Como todos os militares envolvidos na época, deve ter quase 80 anos hoje.’ Quem tirou as fotos, sustenta ele, foi o piloto do helicóptero que levou Che.


Foto histórica


O’Donnell afirma que uma das fotos, a que ele aparece logo depois de receber os disparos, acaba com a controvérsia sobre a morte do Che. ‘Ele não morreu em confronto, foi assassinado’, explica.


‘A foto em que Che olha para cima tem toda sua mística. Ele sabe que vai morrer, mas não há rancor nem ódio. Há serenidade. Essa foto não deve nada às duas que construíram a imagem do mito -a que está espalhada em camisetas pelo mundo e a dele morto. Essa se junta a elas agora.’


O’Donnell fez dezenas de entrevistas com pessoas que conheceram o guerrilheiro, até sua babá. Conta que, na região onde morreu, na Bolívia, que ele visitou para escrever a biografia, há uma espécie de culto a Che.


O escritor acredita que o fato de essas fotos terem ficado guardadas por quase 40 anos demonstra o quanto o personagem Che ainda está presente.


Che pouco estudado


Na Argentina, não houve uma grande repercussão com a publicação das fotos da agonia do Che. ‘Ao contrário do que muitos podem esperar, o Che ainda não é um herói nacional na Argentina’, diz o diretor do Primeiro Museu Histórico Che Guevara, de Buenos Aires, Eladio González.


‘Ele não é estudado nos livros didáticos. Só aparece nas campanhas eleitorais, nas camisetas dos jovens ou nas bandeiras das torcidas de futebol. De resto, ele é um personagem esquecido e pouco estudado no país.’


Na Bolívia, o governo do presidente Evo Morales engavetou um projeto de lei que blindaria militares bolivianos que participaram da execução do Che, em 1967.


O projeto chegou a ser aprovado pelo Congresso boliviano, mas não foi sancionado pelo então presidente Eduardo Rodríguez, que transmitiu o poder a Morales no final de janeiro. Morales é um admirador declarado do guerrilheiro argentino.


Pela proposta, os militares seriam declarados eméritos e não poderiam ser afastados de suas funções. O projeto teria, porém, alcance limitado, já que a maioria dos militares que participaram da ação morreu ou passou para a reserva.’


TODA MÍDIA
Nelson de Sá


Copa, Copa, Copa


‘O argentino ‘La Nación’ já traz, no alto das páginas on-line, um relógio com o tempo que falta para a Copa do Mundo, em dias, horas, minutos, segundos e ‘milisegundos’.


No destaque de ontem, cenas em que Diego Maradona veste o uniforme da seleção do Brasil e canta o hino, num pesadelo. É ‘o polêmico comercial do 10’, que ‘causou surpresa no Brasil’.


Comerciais e outras cenas, em sites como o fenômeno do You Tube, são os primeiros sinais do impacto que a Copa deverá ter sobre a internet -e vice-versa.


Também no Brasil, onde o blog de humor Kibe Loco! abriu link ontem para outras cenas surpreendentes, como a do apresentador da ESPN Brasil que discutiu no ar, segunda, e saiu do estúdio para não voltar mais, e tudo ao vivo. Do blog:


– Comentaristas esportivos brigam… mas porrada, que é bom, fica só ameaça. Ô raça!


Pela Europa, a Copa é tema que ameaça dominar. Na submanchete do ‘Guardian’, ‘Scolari aceita o emprego na Inglaterra’. ‘Big Phil’, diz o ‘Evening Standard’, ‘concordou em ser o próximo treinador da seleção’.


Só no ‘Guardian’, só ontem, seis textos para tratar de Scolari, inclusive Q&A, de perguntas e respostas, com esta passagem:


– Ele fala inglês? Sim. Mais ou menos. Ele pegou o jargão do futebol, mas precisa de alguns meses até uma entrevista coletiva.


No ‘Daily Telegraph’, quatro textos, inclusive ‘O homem por trás do mito’ e a repercussão, ‘Uma traição aos ingleses’. Os cartolas e técnicos questionam, mas a resposta mais curiosa foi de Gary Lineker, o ex-atacante:


– Tem a credencial da Copa, mas venceu com o Brasil. Minha avó podia ter levado à vitória.


Em Portugal, mais críticas contra ele, no jornal ‘A Bola’:


– Não cumpriu o combinado. Deveria terminar a Copa e depois se reunir com a federação para discutir o que iria fazer.


Por outro lado, do também esportivo ‘Record’, de Portugal:


– É perfeitamente normal… Soubemos cedo demais. O ideal seria a divulgação após a Copa.


LITTLE SURFER GIRL Bruna Surfistinha, após perder a liderança na venda de livros para FHC, foi descoberta por Larry Rohter, do ‘NYT’. Ele entrevistou a ex-prostituta e blogueira, sob o título ‘Ela que controla seu corpo pode irritar seus compatriotas’. Ganhou foto na home page, com a chamada ‘A vida de uma garota de programa brasileira’, e virou o terceiro texto ‘mais popular’


A atriz…


Christiane Torloni, ontem em conversa com Ana Maria Braga, se revoltou com ‘o fundo do poço’ de Lula. ‘Se não acontecer nada, a gente terá uma reeleição lá na frente que vai acabar conosco’, declarou. Dizendo não ter votado nele, chamou ‘às ruas’ os brasileiros que estariam ‘anestesiados’ -com ampla repercussão na blogosfera tucana.


… e o teólogo


Em contraponto, no site Adital, Leonardo Boff saiu em defesa do PT, que ‘inovou na política externa, nas políticas sociais’ e ‘podia inovar’ na economia. Sobretudo, ‘é fundamental consolidar a derrota que o PT infligiu à coalizão que sempre ocupou o poder e que, na perspectiva popular, desgraçou o Brasil’.


De mudança


Foi manchete do ‘Jornal da Record’ à Folha Online, com enunciados semelhantes, ‘Polícia Civil de SP indicia Palocci’.


Segundo o blog de Josias de Souza, ‘o ex-ministro devia ter sido indiciado há mais tempo’ -e não foi somente porque até então seu cargo ‘o manteve fora do alcance da polícia paulista’.


Na mira


Por coincidência, na Folha Online, ‘liminar requisitada pelo Ministério Público de São Paulo’ levou à quebra do sigilo do Instituto Florestan Fernandes, ligado ao PT, e de uma ONG. No registro do portal UOL, ‘Marta Suplicy na mira’.’


TELEVISÃO
Daniel Castro


Público decidirá final de ‘Prova de Amor’


‘Maior fenômeno de audiência da Record, a novela ‘Prova de Amor’ será a primeira no mundo todo a ter vários de seus finais decididos pelos telespectadores entre duas alternativas propostas pelo autor, Tiago Santiago.


Assim como no extinto ‘Você Decide’ (para o qual Santiago escreveu vários episódios), da Globo, a Record usará a votação por telefone (ainda não está definido o sistema), além da internet.


Um teste de ‘novela interativa’ já será feito em maio. No capítulo previsto para o dia 18, o público escolherá o desfecho da personagem Pati Lopo, cuja intérprete, Renata Dominguez, terá de deixar ‘Prova de Amor’ para gravar sua substituta, ‘Bicho do Mato’.


Tiago Santiago escreveu dois finais para Pati. Em um deles, ela morre tragicamente com um tiro disparado de propósito pelo próprio irmão, o vilão Lopo (Leonardo Vieira). No outro, ela tem um final feliz: escapa do irmão e foge para o exterior com o marido (Claudio Heinrich) e a filha.


A interatividade voltará na primeira semana de julho, a última de ‘Prova de Amor’ no ar. ‘Na última semana, haverá um final interativo por dia, a cada capítulo. Até o fim de Lopo será resolvido pelo público, além de triângulos amorosos’, adianta Santiago.


A Record deverá escalar uma apresentadora para anunciar em chamadas nos intervalos os dois finais possíveis e revelar o desfecho escolhido pelo público.


OUTRO CANAL


Seleção 1 A torcida verde-amarela da Globo durante a Copa do Mundo vai extrapolar as transmissões dos jogos do Brasil e o noticiário. Como não haverá futebol nas noites de quartas-feiras, a emissora programou um ‘Festival Nacional’ após a novela das oito entre 7 de junho e 5 de julho.


Seleção 2 Na sessão, serão exibidos os filmes ‘A Taça do Mundo É Nossa’, derivado do ‘Casseta & Planeta’, ‘Deus É Brasileiro’, ‘Dom’, ‘O Xangô de Baker Street’ e ‘O Homem que Copiava’.


Chaveiro Gianfrancesco Guarnieri volta a gravar ‘Belíssima’ na semana que vem. O ator esteve doente. Na novela (em que seu Peppe deverá ser fundamental na elucidação de mistérios), ele desapareceu porque foi fazer uma excursão de teatro pelo país.


Autofagia Se não trabalhasse na Globo, Glória Perez também poderia acusar João Emanuel Carneiro de plágio. Afinal, o personagem de Walter Breda em ‘Cobras & Lagartos’ é o mesmíssimo de ‘América’, apenas sem bigode e com cabelos tingidos. E o papel de Eliane Giardini também remete à viúva Neuta. Mas, nesse caso, trata-se de ‘homenagem’ _não de plágio.


Looping O SBT inventa cada uma. Está reprisando a edição do ‘Jornal do SBT’ da 0h30 imediatamente após sua exibição. O telejornal acaba e reinicia na seqüência _com as mesmas notícias.’


POLÍTICA CULTURAL
Folha de S. Paulo


Pasta libera R$ 9,4 mi à trupe do Canadá


‘Gil afirma que patrocínio do MinC ao Cirque du Soleil é ‘distorção’


O ministro da Cultura, Gilberto Gil, chamou de ‘distorção’ a liberação autorizada por sua pasta de R$ 9,4 milhões em patrocínio para a temporada no Brasil do grupo canadense Cirque du Soleil, prevista para agosto e outubro.


‘Estamos criando mecanismos na lei [Rouanet] para evitar distorções desse tipo, para dar a ela o caráter mais público para o qual ela foi criada’, disse o ministro, anteontem, em São Paulo.


O patrocínio ao Cirque du Soleil, cujos ingressos do espetáculo ‘Saltimbanco’ custam entre R$ 50 e R$ 370, foi aprovado pelo MinC por meio da Lei Rouanet, que autoriza empresas a destinar até 4% de seu Imposto de Renda à realização de projetos culturais.


O patrocinador do Cirque du Soleil no Brasil é o banco Bradesco, que não quis comentar o tema, abordado anteontem na Folha. Segundo o MinC, a empresa CIE, produtora da turnê do grupo canadense ao Brasil, reuniu até agora R$ 7,1 milhões em patrocínio.


Gil previra para ontem a edição de decreto com modificações na Lei Rouanet, o que não ocorreu. O MinC havia divulgado as mudanças que estariam no decreto, classificadas de ‘cosméticas’ em artigo do editor da Ilustrada, Marcos Augusto Gonçalves. Gil rebateu: ‘Há cosméticas por aí que têm capacidade muito grande de agir sobre a pele, a pele cultural do país’.’


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O Estado de S. Paulo


Sexta-feira, 28 de abril de 2006


DIRCEU vs. MÍDIA
Editorial


Aonde a imprensa desceu


‘Todos têm direito às suas próprias opiniões, diz um aforismo americano, mas não aos seus próprios fatos. E os fatos que dizem respeito ao ex-ministro e deputado cassado José Dirceu deveriam induzi-lo a morder a língua antes de emitir opiniões delirantes como a que manifestou quarta-feira durante seminário sobre mídia e política, na Universidade Federal do Rio de Janeiro: ‘Só no período da Oban, do DOI-Codi’ – alusão aos mais infames porões da repressão do regime militar brasileiro – ‘a imprensa brasileira desceu tanto como está descendo neste momento da vida política nacional.’


O problema de Dirceu é que a imprensa e as instituições do Estado – PF e MP -, com todos os seus tropeços e limitações, desceram aos porões da corrupção – no governo Lula e onde mais medrar essa praga aparentemente inerradicável da política brasileira. E, ao fazê-lo, escancararam a degradação ética do antigo combatente da ditadura. Exilado em Cuba, Dirceu aprendeu o que jamais viria a esquecer: que a imprensa e as instituições devem ser livres – mas apenas para servir ao regime revolucionário, encarnado, naturalmente, na pessoa do seu líder máximo.


Aprendeu também com o compañero Fidel que o dissenso, a crítica, a denúncia devem ser aplastados com mão de ferro por serem invariavelmente expressões de um complô da reação contra o governo comprometido com a redenção social, ou assim convém apresentá-los. É fácil imaginar o grau de frustração de quem é obrigado, como Dirceu, a viver sob um sistema político em que os opositores não podem ser simplesmente silenciados – ou ‘neutralizados’, conforme o eufemismo de todos os totalitarismos. À falta disso, a melhor alternativa é se passar por vítima e desqualificar os fatos e os que os colocam ao alcance do público.


Só que o truque tem prazo de validade – que, no caso de Dirceu, expirou no dia 11, quando o procurador-geral da República, Antonio Fernando Souza, nomeado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, divulgou o seu primeiro relatório sobre o mensalão – a ‘sofisticada operação criminosa’ lançada para ‘garantir a permanência do Partido dos Trabalhadores no poder’. No documento, Dirceu é identificado como o ‘chefe do organograma delituoso’ e o ‘principal articulador dessa engrenagem, garantindo-lhe a habitualidade e o sucesso’. O procurador o denunciou por formação de quadrilha, peculato e corrupção ativa.


Não podendo dizer do procurador-geral o que gostaria, Dirceu descarrega sua fúria sobre a ‘parcela do Ministério Público de São Paulo’ que se recusa a pôr uma pá de cal sobre o assassínio do prefeito Celso Daniel, acha que todas as pistas devem ser seguidas e quer ouvir o ex-ministro sobre o esquema de corrupção que está por trás do crime, segundo indícios indesmentíveis. A parte da mídia nessa história consistiria em ter ajudado a reabrir o caso, como um meio a mais para deixar mal o presidente.


Admita-se, apenas para raciocinar, que a incriminação de Dirceu não inocenta necessariamente a mídia. Ou seja, deixe-se de lado a sua completa falta de autoridade moral para invectivar a mesma imprensa que em dias melhores para ele o reverenciava como o primeiro-ministro de Lula e corria sofregamente atrás de suas palavras. Examine-se como age a imprensa contrária à reeleição do presidente. Para começar, vai fundo na denúncia do alegado uso político dos gastos publicitários da Caixa Econômica de São Paulo, a Nossa Caixa, entre outras irregularidades, por interferência ou em sintonia com o Palácio dos Bandeirantes ocupado pelo tucano Geraldo Alckmin.


Tem mais. Além de noticiar, também com destaque, a movimentação eleitoral do ex-governador e seus arrufos com o PFL, expõe a ficha barrenta das firmas que doaram algo como R$ 600 mil à pré-candidatura do fluminense Anthony Garotinho, do PMDB, e o repasse de R$ 112 milhões do governo do Rio chefiado por sua mulher, Rosinha Matheus, a três doadores do marido. Ora, tudo que possa prejudicá-lo é boa notícia para Lula e má notícia para Alckmin. O presidente joga as fichas que tem e que não tem contra a candidatura Garotinho – ou a de qualquer outro peemedebista. Já o tucano precisa do PMDB na disputa para afastar o risco de que tudo termine no primeiro turno.


A imprensa, como se vê, não desce a parte alguma – a não ser aos meandros da corrupção. É isso que o ‘chefe do organograma delituoso’ Dirceu tem motivos de sobra para não suportar.’


MERCADO EDITORIAL / EUA
Katharine Q. Seelye


Nova onda de aquisições de jornais nos EUA


‘A cadeia de jornais MediaNews, controlada por William Singleton, anunciou planos de adquirir quatro jornais da Knight Ridder. Dois deles devem primeiro passar pelas mãos de uma outra cadeia, a Hearst Corp.


Os quatro jornais, que juntos serão vendidos por US$ 1 bilhão, estão entre as 12 publicações da Knight Ridder que a McClatchy Co. comprometeu-se a comprar no mês passado, mas não quer mais. A expectativa é que a aquisição ajude a consolidar a reputação de Singleton como um negociador que gosta de assumir riscos e deseja elevar sua imagem pública.


Com a transação, a MediaNews se tornará a quarta maior empresa jornalística dos Estados Unidos em circulação diária. São 53 diários que resultam numa circulação de 2,7 milhões de exemplares em dias de semana e de 3 milhões no domingo.


Singleton abriu um amplo espaço na indústria jornalística, tornando-se mais conhecido por seu empenho administrativo em reduzir custos do que por sua promoção do jornalismo. The Denver Post, seu principal veículo, está passando por um processo de redução de 25 cargos.


A McClatchy anunciou, na terça-feira, que numa só transação venderá para Singleton The San Jose Mercury News e The Contra Costa Times, ambos da Califórnia, além de uma parceira que inclui a Gannett Co., a maior cadeia de jornais do país, e o Stephens Group, com sede em Arkansas.


A McClatchy também disse que venderá The Pioneer Press, de Minnesota, e The Herald, da Califórnia, para a Hearst. Há um segundo acordo para repassar os jornais.


A Hearst comprometeu-se a transferir os dois jornais para a MediaNews em troca de uma participação acionária nos ativos da MediaNews que estão fora da área da Baía de São Francisco.


A Hearst é dona do The San Francisco Chronicle e poderá estar sujeita a uma análise cuidadosa para verificar se há violação das leis antitruste se adquirir quaisquer interesses adicionais em propriedades da área da Baía de São Francisco. A própria MediaNews poderá ser alvo de escrutínio, pois já possui numerosos jornais nessa região e está comprando mais dois.


CONCENTRAÇÃO


A concentração vem aumentando no setor jornalístico, permitindo que os donos de publicações semelhantes reduzam custos unindo operações, incluindo as redações. Na parceria da Califórnia, a MediaNews terá 54% do controle.’


TELEVISÃO
Keila Jimenez


Record adia planos por causa da Copa


‘A Record resolveu adiar boa parte de suas estréias agendadas para o primeiro semestre. Motivo: Copa do Mundo. Não, a rede não vai dividir com a Globo os direitos da transmissão do mundial, mas não quer arriscar estrear atrações numa temporada em que todos só estarão de olho na seleção.


Na lista dos programas que ficaram para o segundo semestre está a nova sitcom de Tom Cavalcante – uma espécie de Família Trapo – e um novo reality show, Troca de Famílias. Com formato comprado da Fox, Troca de Famílias, mais conhecido na TV paga como Troca de Esposas, promove a troca de matriarcas entre famílias completamente diferentes.


A Record pretende ainda apostar em uma novela na faixa das 18 h, com temática infanto-juvenil, e uma nova atração aos domingos, no lugar do Domingo da Gente, que deve deixar a grade.


A agenda de planejamentos não será muito diferente nas outras emissoras. Afinal, é camicase lançar qualquer programa, por melhor que seja, para competir com audiências que beiram os 80% de share (audiência entre o total de TVs ligadas no horário), fatia que uma partida da seleção alcança.’


Cristina Padiglione


Mineira, Cemil desconfia de homônimo


‘Os dirigentes de uma empresa chamada Cemil (Cooperativa Central Mineira de Laticínios Ltda.), de Patos de Minas, estão de olho em seu homônimo mais famoso, aquele interpretado por Leopoldo Pacheco na novela Belíssima, da Globo.


Pois o staff da Cemil chegou a pensar em contratar o ator para um comercial, mas, mineiro que é, desconfia que ele possa dar uma guinada e virar do mal. Bem fazem os mineiros. É pouco provável que o autor Silvio de Abreu faça de Cemil um vilão, mas em novela, sabe como é, tudo é possível.’


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