Thursday, 18 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1283

Folha de S. Paulo

O PAPEL DO JORNALISMO
Folha de S. Paulo

Cartas-bomba

‘Em troca de mensagens, Steven Johnson defende a web como espaço de ampliação da cidadania, enquanto Paul Starr diz que mídia impressa é central para o combate à corrupção e para a sobrevivência da democracia

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ECOSSISTEMA

6 de abril de 2009

Prezado Paul,

Comecemos pelos pontos sobre os quais provavelmente concordamos. Em primeiro lugar, os jornais historicamente forneceram e fornecem bens cívicos e públicos essenciais para uma cultura democrática saudável.

Em segundo, eles se encontram em situação financeira difícil, em razão de transformações de longo prazo operadas em grande medida pela internet, também em razão da crise econômica -que esperamos ser de curto prazo- e, no caso de alguns jornais, por decisões financeiras insensatas de seus proprietários.

Sejam quais forem as causas subjacentes, porém, acho que você e eu concordamos que, dentro de cinco ou dez anos, o setor dos jornais -e, portanto, seu produto editorial- terá aparência fundamentalmente diferente da atual.

A dúvida é se vai ou não emergir um novo modelo que forneça os bens públicos antes garantidos pelos jornais por meio de seus monopólios locais que geravam alta margem de lucro (pelo menos nos EUA).

Acho que existem boas razões para pensar que o sistema de notícias que está se desenvolvendo on-line será melhor que o modelo dos jornais com o qual convivemos nos últimos cem anos.

Uma maneira de enxergar essa transformação é pensar na mídia como um ecossistema.

Na maneira como ela circula a informação, a mídia de hoje é, de fato, muito mais próxima de um ecossistema do que era o velho modelo industrial e centralizado da mídia de massas.

O novo mundo é mais diversificado e interligado. É um sistema no qual as informações fluem com mais liberdade. Essa complexidade o torna interessante, mas dificulta as previsões de como será sua aparência em cinco ou dez anos.

Ecossistemas

Em vez de começar pelo futuro, proponho que olhemos para o passado.

Quando os ecologistas pesquisam os ecossistemas naturais, procuram as florestas mais antigas, onde a natureza teve mais tempo para evoluir.

Para estudar as florestas tropicais, não analisam um campo desmatado dois anos antes.

Por analogia, devemos examinar as partes do noticiário on-line que passaram por uma evolução mais longa.

Uma dessas áreas é a reportagem sobre a própria tecnologia. Esta vem crescendo e se diversificando há décadas, fazendo dela uma floresta antiga de notícias on-line.

Tomemos a política como outro exemplo. A primeira eleição presidencial que acompanhei de maneira obsessiva foi em 1992. Todo os dias o ‘New York Times’ publicava um punhado de matérias sobre escalas nas campanhas, debates ou pesquisas de opinião.

Todas as noites eu assistia a programas da TV a cabo para ouvir o que os palpiteiros tinham a dizer sobre os acontecimentos do dia. Lia ‘Newsweek’, ‘Time’ e ‘New Republic’ e vasculhava a ‘New Yorker’ em busca de seus ocasionais artigos políticos.

É verdade que tudo isso estava longe de constituir um deserto de noticiário. Mas compare-se o que havia então com as informações disponíveis na eleição de 2008.

Tudo que existia em 1992 ainda estava presente, mas fazia parte de uma nova e vasta floresta de notícias, dados, opiniões, sátira -e, o que possivelmente seja mais importante, experiências diretas.

Sites como Talking Points Memo e Politico faziam reportagem direta. Blogs como o Daily Kos traziam relatos aprofundados sobre corridas individuais, algo que o ‘New York Times’ jamais teria tinta suficiente para cobrir.

Blogueiros como Andrew Sullivan reagiam a cada nova virada no ciclo noticiário, e novos analistas como Nate Silver, no Fivethirtyeight.com, faziam análises de pesquisas que superavam de longe qualquer coisa oferecida pela CNN.

Pense no discurso de Barack Obama sobre a questão racial, possivelmente um dos acontecimentos-chave da campanha. Oito milhões de pessoas o acompanharam no YouTube.

Teriam as redes de TV transmitido esse discurso na íntegra em 1992? Com certeza, não. Ele teria sido reduzido a um minuto no noticiário noturno. A CNN talvez o tivesse transmitido ao vivo, para 500 mil pessoas. A Fox News e a MSNBC nem sequer existiam.

Para mim, não há dúvida de que o ecossistema do noticiário político em 2008 foi muito, muito superior ao de 1992.

Algumas pessoas argumentam que essa nova diversidade é parasítica: os blogueiros são interessantes, é claro, mas, se as organizações noticiosas tradicionais perdessem peso, os blogueiros não teriam mais sobre o que escrever.

Amadurecimento

Isso talvez fosse verdade no início desta década, mas não é mais. Imagine quantos barris de tinta foram comprados para imprimir comentários em jornais sobre a gafe de Obama em relação a ‘pessoas que se apegam a suas armas e à religião’.

Mas essa frase não foi reportada originalmente pelo ‘New York Times’ ou o ‘Wall Street Journal’, e sim pelo Huffington Post. Não é que os jornais irão desaparecer -é apenas que deixarão de ser a espécie dominante.

A cobertura política da campanha de 2008 foi fértil pelas mesmas razões por que a cobertura das notícias na web é fértil: porque a web já é uma mídia de crescimento antigo.

As primeiras ondas de blogs eram focadas na tecnologia; mais tarde, se voltaram à política. Agora, as coberturas de esportes, economia, cinema, livros, restaurantes e notícias locais -todas os temas padrões do velho formato dos jornais- estão proliferando on-line. Há mais perspectivas e mais profundidade.

E isso é apenas o crescimento mais recente. As notícias on-line estão apenas começando a amadurecer.

Cordialmente,

Steven

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RISCO DEMOCRÁTICO

10 de abril de 2009

Caro Steven,

Concordo que um novo modelo de noticiário e controvérsia pública está emergindo on-line e que sob alguns aspectos, especialmente a gama de opiniões que abrange, o ambiente on-line apresenta vantagens em relação ao mundo tradicional do jornalismo impresso.

Mas a realidade é que os recursos para fazer jornalismo nos EUA, especialmente nos níveis metropolitano e regional, estão desaparecendo mais rapidamente do que as novas mídias conseguem gerá-los.

Você emprega a metáfora de um ‘ecossistema’, e é um conceito reconfortante: à medida que morrem as formas de vida velhas, nascem outras novas.

Mas você está tomando algumas árvores por uma floresta.

Além disso, a própria metáfora orgânica induz ao engano. As mídias não se desenvolvem naturalmente. Elas se desenvolvem historicamente, e as forças que regem seu desenvolvimento são sobretudo políticas e econômicas.

A maioria das sociedades, mesmo aquelas que têm uma imprensa nacional livre, não possui a abundância de mídia metropolitana que historicamente caracteriza os EUA.

A imprensa no Reino Unido e na França, por exemplo, é muito mais concentrada no nível nacional.

Mas nos EUA, da fundação da República ao século 19, a política governamental subsidiou a ascensão de jornais locais.

Esses jornais, por sua vez, exerceram papel econômico importante como intermediários entre vendedores (anunciantes) e compradores. A partir desses lucros, os jornais puderam subsidiar a produção de notícias como bem público.

As pesquisas em ciências sociais mostram que, onde a mídia noticiosa é fraca, a corrupção está muito mais presente.

Sem uma imprensa independente capaz de cobrar responsabilidade dos governos locais e estaduais, o projeto básico de uma democracia federal fica comprometido.

A internet está enfraquecendo a capacidade da imprensa de subsidiar a produção de jornalismo de serviço público, e isso por uma razão, sobretudo.

Os jornais diários metropolitanos já não ocupam a posição estratégica de intermediários entre compradores e vendedores que ocupavam no passado.

Pois há maneiras alternativas, on-line, para os vendedores chegarem a seus mercados e para os consumidores encontrarem informações sobre produtos e vendas.

Nichos

A competição crescente para chamar a atenção dos leitores no ciberespaço também enfraquece a capacidade de a mídia noticiosa cobrar por seus conteúdos. A recessão atual e a administração insensata vêm agravando esses problemas.

Jornais na Europa e em outras regiões enfrentam as mesmas transformações estruturais graves.

Nos EUA, a cobertura jornalística dos governos estaduais vem caindo de maneira nítida.

Em meu próprio Estado, Nova Jersey, antigamente havia 50 repórteres que cobriam a política em tempo integral. Hoje. esse número caiu para 15. Muitas notícias nem sequer chegam a ser cobertas.

Contrariamente ao seu relato, o recuo dos jornais não vem sendo compensado por uma tendência de veículos on-line preencherem a brecha criada.

Existem na realidade três problemas separados aqui: 1) a produção de notícias feita com profissionalismo; 2) a produção de um público engajado; e 3) a produção de responsabilidade política efetiva.

Embora seja inquestionável que a internet oferece uma diversidade de opinião e acesso a novas fontes, ela não vem conservando o jornalismo profissional generalista em seus níveis anteriores.

Estão sendo servidos alguns públicos de nicho. No nível nacional, ao mesmo tempo em que o número de jornalistas da mídia generalista profissional vem diminuindo, muitos jornalistas têm encontrado trabalho em publicações de preço elevado que atendem a setores econômicos específicos.

Esportes e cruzadas

A filantropia poderá subsidiar a reportagem investigativa e remediar esse problema em parte. Mas o segundo problema -a criação de um público engajado- é ainda mais difícil.

Os jornais -antes lidos por metade das pessoas de uma cidade- ajudavam a criar um público urbano consciente.

Aqueles que compram um jornal podem interessar-se só por esportes ou palavras cruzadas, mas, mesmo assim, olharão a primeira página pelo menos de relance, com isso tomando conhecimento de algo sobre sua cidade e o mundo.

On-line, quem se interessa por esportes ou palavras cruzadas vai diretamente aos sites que os oferecem, evitando ser exposto a notícias e polêmicas sobre sua comunidade.

O que está em jogo aqui é o desenvolvimento maior de uma sociedade de informação estratificada. Isso guarda relação com o terceiro problema: a criação da responsabilidade política efetiva.

A capacidade da mídia noticiosa de servir como freio ao governo não depende só das leis que protegem a liberdade de expressão, mas também do poder econômico da imprensa.

Interesses poderosos podem intimidar organizações que sejam financeiramente fracas.

Seria insensato prever se a web será ou não capaz de sustentar o tipo de jornalismo para o público geral que os jornais têm produzido, historicamente. Mas seria ainda mais insensato ignorar as evidências do que está acontecendo hoje e confiar numa visão feliz de progresso inexorável proporcionada pela internet.

O perigo dessa indiferença alegre às realidades desagradáveis é que ela pode nos induzir à inação. Tanto a política governamental quanto a filantropia precisam ser incentivadas a apoiar o jornalismo independente de maneiras novas.

Paul Starr

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CADEIA DE INFORMAÇÃO

16 de abril de 2009

Caro Paul,

É verdade que sou otimista quanto às possibilidades de longo prazo do jornalismo, mas a última coisa que quero é incentivar a ‘inação’.

Você quer ação para preservar um modelo de jornalismo de jornais que nos serviu bem por um século. Eu acho que podemos construir algo melhor.

Você fala das forças de longo prazo que se alinharam contra os jornais. Elas são reais.

Mas você passa por cima de muitas das forças compensatórias -políticas, econômicas e tecnológicas- que beneficiam o jornalismo e também a cultura cívica que o cerca.

Hoje vemos novas e vastas eficiências na distribuição, graças à passagem da mídia impressa à digital. Existem oportunidades inusitadas de participação na criação, curadoria e discussão das notícias.

O acesso às informações governamentais também se tornou mais fácil.

Enquanto isso, novos sites -incluindo um que eu criei, Outside.in- permitem aos cidadãos tratar de questões ‘hiperlocais’ ao nível de quarteirões e bairros das cidades, coisas que os jornais de cidades jamais poderiam alcançar.

Tudo isso vem acompanhado da capacidade de agregar muitas vozes diferentes num único site, sem pagar pelos custos de criação desse conteúdo.

Mas falemos sobre o que está acontecendo agora mesmo em minha terra natal, o Brooklyn.

Fatos escusos

Você fala do declínio da cobertura jornalística do governo estadual em Nova Jersey. Nos últimos três anos, a questão cívica dominante no Brooklyn tem sido a polêmica em torno de um grande projeto de reurbanização, o Atlantic Yards.

No Outside.in, a página dedicada ao Atlantic Yards reúne notícias, reportagens, comentários e bate-papo. Nos últimos cinco dias saíram 30 artigos.

A edição impressa do ‘New York Times’ publicou só uma matéria, nos últimos 30 dias, mencionando o assunto.

Quão mais rica será a cobertura de uma questão pública importante como essa nos próximos cinco anos?

Grandes bloggers irão apresentar notícias pela primeira vez, comentar acontecimentos e até ganhar dinheiro.

Pessoas e sites com paixão por trazer fatos escusos à tona -como o corajoso blog Atlantic Yards Report- irão comparecer a todas as audiências públicas para formular perguntas difíceis e vão postar na internet transcrições das audiências, com comentários adicionais.

Amadores locais irão vasculhar documentos públicos em busca de detalhes reveladores, e pais presentes às audiências escreverão em blogs sobre o impacto em escolas específicas à sombra do projeto.

E sites irão financiar artigos investigativos sobre o histórico passado das empresas envolvidas na construção.

Se forem espertos, jornais como o ‘New York Times’ e o ‘New York Post’ vão aproveitar essa cobertura, compartilhá-la com seus leitores, usá-la para vender anúncios locais e às vezes colocar um de seus repórteres treinados para desenvolver artigos novos.

Estes últimos, por sua vez, acrescentarão valor enorme à cadeia de informação, e o ciclo inteiro recomeçará.

Menos jornalistas

Sim, é verdade que no final desse processo haverá menos jornalistas oficiais de jornais cobrindo acontecimentos como o Atlantic Yards. Mas haverá um declínio correspondente no engajamento cívico público? Não acredito.

Você fala sobre o velho sistema dos jornais aumentar o engajamento em parte porque as pessoas tropeçavam na primeira página a caminho das páginas de quadrinhos. Eu nem sequer aceito essa premissa.

Qual sociedade lhe parece incluir mais participação cívica?

Uma em que o noticiário é controlado por uma pequena minoria e onde as interações cívicas das pessoas acontecem como leitura feita a caminho da seção de esportes?

Ou uma em que milhares de pessoas comuns participam ativamente na criação do próprio noticiário?

Steven

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DETECTOR DE LIXO

17 de abril de 2009

Prezado Steven,

Que tal olharmos mais de perto o seu negócio, o Outside.in, e ver se funciona como substituto do jornalismo profissional.

Vejo que, quando você lançou o Outside.in, em outubro de 2006, empregou o mesmo exemplo do projeto Atlantic Yards. Dois anos e meio já se passaram, e tenho certeza de que você já deve ter outro. Mas qualquer pessoa que navegue por seu site verá que ele não faz reportagem investigativa.

Pelo que pude apreender, ele não faz nenhum trabalho de reportagem próprio. Ele agrega o que aparece em outros lugares.

Não parece haver nenhum critério de relevância ou importância. E, se o que aparece em outros lugares é lixo, o site ajuda a difundir esse lixo, pois, por sua própria natureza, um site de notícias automatizado não possui o que tem todo bom editor: um detector de lixo.

Você se refere a um blog chamado Atlantic Yards Report como uma das fontes chaves das notícias sobre o Brooklyn publicadas no Outside.in.

Chequei essa informação com o editor do Report, Norman Oder. Eis o que ele disse em resposta à pergunta de se o Outside.in faz qualquer trabalho de reportagem ou exerce qualquer seleção editorial:

‘O Outside.in não ‘cobre’ o Atlantic Yards e, a meu ver, não exerce virtualmente nenhum impacto sobre a discussão local. Ele apenas agrega uma multidão de cobertura noticiosa e de blogs, pegando carona especialmente no meu blog e no portal NoLandGrab.org.’

É claro que você não paga Oder ou qualquer outra pessoa pelo uso de seu trabalho. Isso pode ser um bom modelo econômico. Mas, se é um modelo para resolver os problemas do jornalismo, já é outra história.

Você diz que eu ‘quero agir para preservar um modelo de jornalismo impresso’.

Mas, como deixei claro num artigo recente, ‘Adeus à Era dos Jornais’ [publicado em 4/3 na ‘New Republic’], precisamos buscar novas formas de jornalismo adaptadas às exigências de um ambiente digital, aproveitando plenamente as vantagens deste.

O problema é que o tipo de inovação que você está promovendo não responde com eficácia ao problema triplo que mencionei: financiar o jornalismo de serviço público, engajar o público e gerar responsabilidade política.

Desinformação

Sites como o seu, que tiram notícias, comentários -e lucros- da web, dependem inteiramente de que outros paguem pelo trabalho original de reportagem. Alguns blogueiros podem dar furos ocasionais, mas fazer de conta que possuem a capacidade de um grande jornal metropolitano é enganoso.

Um site que tira notícias de outros lugares pode ampliar o público do material que coleta, mas, se engaja o público, isso acontece porque outros estão fazendo o trabalho..

Engajar o público requer que se identifiquem os acontecimentos e apontem seu sentido, e não apenas que se reproduzam informações (e desinformações) isoladas.

Enfim, criar responsabilidade política efetiva requer um poder compensatório da imprensa que um site que tira notícias de outras fontes não terá.

Para resolver esse problema serão necessários novos investimentos em jornalismo por parte de organizações sem fins lucrativos, novos modelos econômicos que financiem o jornalismo e novas políticas públicas que permitam a organizações noticiosas captar uma parte maior da receita do bem público que produzem.

E, já que estamos falando em receita, que tal pagar a Norman Oder e outros pelo trabalho que você vem divulgando como se fosse a contribuição de seu próprio site ao debate público?

Paul

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OLHOS NAS RUAS

17 de abril de 2009

Caro Paul

É claro que o Outside.in não faz um trabalho de reportagem original. Eu dei o exemplo do Atlantic Yards para mostrar o volume de informações já criadas sobre uma questão pública no Brooklyn. Eu não estava me atribuindo o crédito por esses conteúdos.

Questões locais

O que acho promissor nessa página, e em milhares de outras, é que informações estão sendo criadas e obtidas de uma gama diversificada de fontes, mas são espalhadas por centenas de sites diferentes.

Embora boa parte dessas informações diga respeito explicitamente a questões hiperlocais -questões imobiliárias, sobre escolas ou crimes-, frequentemente é difícil encontrar notícias geograficamente próximas ao leitor.

Ajudamos os jornais a se conectarem com os blogueiros e ajudamos estes a fazer seus artigos chegarem aos sites de ‘mídia antiga’.

Parte de nossas desavenças se deve ao fato de destacarmos tipos diferentes de engajamento cívico. Há questões maiores -se um governador recebe propina de uma construtora.

E há milhões de questões locais: uma proposta para fechar uma ciclovia ou um diretor de colégio que os pais dos alunos querem que seja substituído.

As primeiras vêm sendo cultivadas pelos jornais há cem anos, e as segundas têm sido insuficientemente atendidas.

É verdade que são necessárias habilidades jornalísticas tradicionais para as questões macro, mas, no nível hiperlocal, os verdadeiros especialistas são as pessoas na rua.

Inovações

Acho que nós dois concordamos que o futuro desse segundo tipo de noticiário é bom. A questão é se o primeiro poderá ser mantido no nível que aprendemos a esperar.

Acho que poderá, sim, mas concordo que isso vai exigir trabalho. Temos mais participação, uma distribuição mais barata e o fim dos monopólios sobre as informações locais.

Sim, podemos ter menos jornalistas investigativos completos, mas também teremos um aumento enorme nas pessoas que mantêm ‘seus olhos voltados às ruas’, nas palavras da socióloga urbana Jane Jacobs.

Com certeza deveríamos ser capazes de aproveitar esses ingredientes e moldar um sistema mais eficaz de limites ao poder institucional.

Mesmo com os jornais em crise, estamos assistindo a inovações sem precedentes e a novos e instigantes modelos de criação de notícias. Seu argumento descreve muito bem o que corremos o risco de perder com o fim do modelo de jornalismo impresso antigo.

Eu gostaria muito de ouvir o que você pensa que devemos criar para tomar o lugar dele.

Steven

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DIREITOS AUTORAIS

18 de abril de 2009

Caro Steven

Infelizmente, não consigo enxergar a contribuição positiva feita por sites que retiram materiais da internet, misturando releases para a imprensa e trabalhos genuínos de reportagem de maneira indiscriminada, sem aplicar nenhum critério de relevância ou confiabilidade.

Na melhor das hipóteses, isso é irrelevante para o problema de manter o jornalismo independente, o engajamento cívico e a responsabilidade política. Na pior, pelo fato de rasparem alguns dos lucros, os sites de notícias automatizados agravam os problemas financeiros da imprensa.

Até recentemente, eu não levava a sério a ideia de que os agregadores estariam violando direitos autorais.

Contudo, agora, vejo que os tribunais deveriam deixar claro que a agregação não paga, sistemática e concentrada do trabalho de outras pessoas -sem o acréscimo de valor editorial- não constitui ‘utilização justa’.

Uma decisão judicial obrigaria os agregadores a pagar seus próprios repórteres e editores, pagar por outros conteúdos ou então deixarem de operar. E esse seria um modo pelo qual seria possível canalizar os lucros da agregação de volta para o jornalismo.

Como já sugeri, organizações sem fins lucrativos e filantrópicas deverão exercer um novo papel de financiar trabalhos de jornalismo investigativo e outros. Enquanto isso, diversas políticas regulatórias poderiam fortalecer o jornalismo local.

Existem muitas experiências de jornalismo real on-line. Boa parte delas vem ganhando forma em redes colaborativas, não em organizações de jornalismo tradicionais.

Tudo isso atende às demandas peculiares do ambiente on-line, e doadores privados e instâncias públicas deveriam apoiar essas inovações on-line, em vez de manter os jornais em seus formatos tradicionais..

Esfera pública

O jornalismo independente e profissional poderá sobreviver e crescer se a política oficial e instituições sem fins lucrativos encontrarem maneiras criativos de apoiá-lo. Duvido, porém, que ele consiga florescer exclusivamente com as forças do mercado e as novas tecnologias, embora os jornalistas não possam ignorar nenhum desses fatores.

No entanto, mesmo se o jornalismo independente se adaptar com sucesso, o novo ambiente da mídia provavelmente levará a um abismo maior entre a minoria que se interessa intensamente pela vida pública e o número consideravelmente maior de pessoas que se afasta por completo da esfera pública, informando-se pouco sobre política e importando-se menos ainda com ela.

Esse é um problema antigo que retornou sob forma nova. O futuro da democracia depende de sermos capazes de descobrir uma maneira de fazer frente a ele.

Paul

A íntegra deste debate saiu na ‘Prospect’. Tradução de Clara Allain.’

 

Quem é Paul Starr

‘Professor de sociologia na Universidade Princeton (EUA), Paul Starr ganhou o Prêmio Pulitzer de não-ficção em 1984 por ‘The Social Transformation of American Medicine’ (A Transformação Social da Medicina Americana).

Em 1993, no governo Bill Clinton (1993-2001), foi consultor da Casa Branca para o sistema de saúde nacional.

É fundador e coeditor da revista ‘American Prospect’ e autor também de ‘Freedom’s Power’ (O Poder da Liberdade), sobre a evolução do liberalismo.’

 

Quem é Steven Johnson

‘Steven Johnson foi editor-chefe e cofundador de uma das primeiras revistas on-line, a ‘Feed Magazine’. Escreve sobre ciência e tecnologia e sobre novas mídias de massa.

É autor do recente ‘The Invention of the Air’ (A Invenção do Ar, ed. Riverhead), que sai no Brasil no segundo semestre, e ‘Cultura da Interface’ (ambos pela ed. Zahar).

Coordena, desde 2006, o site Outside.in (http://outside.in), que busca ‘construir a web geográfica, bairro por bairro’, nas palavras do próprio Johnson.’

 

CRISE
Folha de S. Paulo

‘Independent’ e ‘Boston Globe’ buscam se reerguer

‘A crise bate à porta de alguns dos mais prestigiosos jornais do mundo.

O mais novo dos jornais considerados sérios no Reino Unido -ao lado de diários como ‘The Guardian’ e ‘The Times’-, o ‘Independent’ está com um prejuízo acumulado que ultrapassa os US$ 14 milhões (R$ 30 milhões).

O Independent News & Group, que controla o jornal, tem uma dívida de US$ 1,8 bilhão (R$ 3,8 bilhões). Por isso, segundo informação divulgada pelo ‘The Times’, seu concorrente estaria à venda.

‘Globe’ respira

Já o grupo norte-americano The New York Times Company, que controla o jornal homônimo e o ‘Boston Globe’, também está em crise.

Teve lucro de US$ 27,5 milhões (R$ 58 milhões) no quarto trimestre de 2008, o que significa uma queda de 47,5% na comparação com o mesmo período de 2007.

Parte das suas ações (6,9%) foram adquiridas pelo bilionário mexicano Carlos Slim. Estima-se que o valor do negócio tenha sido de aproximadamente US$ 123 milhões (R$ 260 milhões). Slim se tornou o terceiro maior acionista do grupo controlado pela família Sulzberger.

Há um ano, ele também comprou participação de quase 1% no Independent News & Group.

O New York Times Company recebeu, recentemente, um investimento de US$ 250 milhões (R$ 528 milhões) do sócio mexicano.

Também foi fechado um acordo de leasing e venda de parte da sede do grupo para a empresa de investimento W.P. Carey por US$ 225 milhões (R$ 475 milhões).

A crise no grupo se reflete nos jornais que controla.

No ‘NYT’, ela culminou na queda de circulação e de receita com publicidade, além de demissão de funcionários. No ‘Boston Globe’, a crise veio com a ameaça de fechamento -afastada na semana passada, após acordo com o sindicato da categoria.’

 

TELEVISÃO
Daniel Castro

Próxima novela da Globo terá ‘jornalismo’ ao vivo

‘‘Viver a Vida’, próximo título das 21h da Globo, será a primeira novela com cenas ao vivo desde o advento do videotape.

A atriz Camila Morgado interpretará uma jornalista de TV que poderá entrar no ar em tempo real comentando uma notícia do dia sobre a crise econômica mundial, um dos temas da trama de Manoel Carlos.

As cenas reproduzirão formatos jornalísticos. O autor ainda não definiu se a personagem de Camila, Malu Trindade, trabalhará em uma emissora aberta ou em um canal pago.

‘Os boletins aparecerão sempre que houver notícia relevante. Nesse caso, poderão ser gravados no próprio dia ou até mesmo realizados ao vivo’, conta Manoel Carlos, autor que gosta de tratar de assuntos ‘quentes’. Ele vive dizendo que, se pudesse, escreveria o capítulo no dia de sua exibição.

Apesar de especializada em economia, Malu tratará também de outros assuntos, dependendo da conveniência do autor. Ou seja, se a novela estivesse no ar hoje, ela provavelmente falaria de gripe suína.

Os boletins ao vivo, diz o autor, vão depender ‘da evolução dos acontecimentos’. A narrativa de ‘Viver a Vida’, no ar a partir de setembro, começa em 2007. Na primeira semana, Malu aparecerá em boletins gravados com muita antecedência, falando dos primeiros sinais de crise e da própria crise, já em 2008. Uma semana depois, a novela entra em 2009.

‘A partir de então, estarei tratando de acontecimentos de acordo com o que estiver em pauta na TV’, diz o autor.

OLHA O CABELO DELA!

Deborah Falabella aparecerá assim, de dreadlocks, em ‘Som & Fúria’, minissérie de Fernando Meirelles que a Globo exibe em julho. Ela será uma atriz descolada que entrará para a fictícia companhia teatral da minissérie, especializada em encenar Shakspeare. Deborah viverá Sarah e interpretará Julieta numa montagem de ‘Romeu e Julieta’. Fará par com Leonardo Miggiorin, com quem se envolverá amorosamente nos bastidores. Numa cena, Sarah criticará a pobreza da produção.

MENINO OCUPADO

No ar em ‘Malhação’ e ensaiando para o musical ‘Hairspray’, Jonatas Faro, 21, vive contra o relógio. Quase não sobra tempo para se preparar para a ‘Dança dos Famosos’. ‘Não paro nunca, trabalho de domingo a domingo. Vivo na ponte aérea’, disse o ator em um rápido intervalo nos estúdios da Globo. Em ‘Hairspray’, será Link Larkin, personagem que no cinema pertenceu a Zac Efron. Jonatas começou na TV aos 10 anos, em ‘Chiquititas’ (SBT). Aos 15, voltou para a escola. Aos 17, foi morar nos EUA.

RISADA 1

Marcelo Adnet, ator de stand-up comedy que virou estrela da MTV com o programa diário ‘15 Minutos’, terá uma segunda atração na emissora. No próximo dia 23, estreia ‘Furfles’, semanal de meia hora.

RISADA 2

No novo programa, Adnet vai para as ruas de São Paulo, onde grava depoimentos e esquetes de humor. Dividirá o show com Dani Calabresa, Fábio Rabin e, eventualmente, com os VJs Bento Ribeiro e Luisa Micheletti.

BANCADA

Ao ser convidada pela Record, Ana Paula Padrão exigiu apresentar o ‘Jornal da Record’ sozinha. Mas a emissora não abriu mão de Celso Freitas no telejornal. Sem emprego no SBT, Ana Paula teve de aceitar.

CAMISINHA 1

Antes de tentar entregar preservativos ao presidente do Paraguai, Fernando Lugo, na última quinta, em Brasília, o ‘CQC’ Felipe Andreoli viajou até o Paraguai. O material vai ao ar amanhã.

CAMISINHA 2

No país vizinho, Andreoli conseguiu entrevistar Damiana Morán, que acusa Lugo de ser pai de seu filho, mas teve dois problemas: foi hostilizado numa escola e, com crise renal, teve de procurar um hospital.

FOCAS

A Rede TV! está recrutando jovens repórteres com vocação para o jornalismo investigativo. Reserva a eles câmeras digitais do tamanho de telefones celulares.’

 

Audrey Furlaneto

TVs criam eco-realities para fazer debate ‘verde’

‘A edição empilha cenas de geleiras derretendo, enchentes homéricas, tempestades cinematográficas. A voz de Zeca Camargo então surge com uma lista: ‘Aquecimento global, efeito estufa, colapso de energia’. Entra uma vinheta à moda ‘Big Brother Brasil’: o rosto de quatro participantes está estampado em close num labirinto por onde a câmera circula com movimentos ágeis.

E, assim, lá vem um novo reality show. Agora, em família e com causa. É ‘eco-reality’, versão jornalística do formato que o ‘Fantástico’ exibirá em episódios de 20 minutos, durante um mês. ‘Mudança Geral’ é um programa ‘eco’ -algo como o prefixo do momento.

É eco também o primeiro reality show da história da TV Cultura, o ‘EcoPrático’. Mas, enquanto a versão da Globo se dedica aos mesmos ‘participantes’ (uma família da zona sul de São Paulo, os Meneghini), este cuida de uma casa a cada episódio. E, exceto pelas vinhetas, pela participação do público e pelas câmeras do programa global, nem um nem outro tem a estrutura de um ‘BBB’: a casa monitorada é a de uma família ou pessoa comum, ainda sem a cultura eco.

A proposta é justamente a de fazer com que tenham hábitos mais sustentáveis, como separar o lixo para reciclagem, economizar água e luz -caso contrário, lembraria Zeca Camargo, ‘aquecimento global, efeito estufa…’-, melhorar a alimentação, entre outras, digamos, ecoquestões.

‘Sustentabilidade: agora todo mundo fala disso’, diz Anelis Assumpção, no início de cada episódio do ‘EcoPrático’. Nele, cada família é avaliada em dez ‘ecocritérios’ (energia, água, alimentação, resíduos, estrutura, ecossistema, bem-estar, consumo, transporte e atitude) e deve aplicar a si mesma uma ‘econota’ de zero a dez.

Há ainda o ‘ieco’, índice que sinaliza quão eco são as atitudes e rotinas de cada morador da casa, e uma ‘ecoterapia’ ao fim do episódio, para que o participante diga o que aprendeu -se é que aprendeu algo.

Por exemplo, Leonardo Musa teve sua casa visitada pelos apresentadores, Anelis e o jornalista Peri Pane, e dois consultores. Teve seus hábitos avaliados (pretendia se dar ‘econota’ zero, mas foi convencido de que merecia mais, um três), seu apartamento no Copan, no centro de SP, teve infiltrações e piso consertados, ganhou cortina no quarto (entra no ‘ecocritério’ bem-estar), teve paredes pintadas, entre outros ajustes.

Na hora da ‘ecoterapia’, disse não ter mudado em nada seus hábitos e que achou ‘legal’ a reciclagem feita no próprio prédio, mas que, não, nada disso iria ‘salvar o planeta’. Leve e divertida, a edição do ‘EcoPrático’ incluiu alarmes que soavam a cada frase ‘antieco’ do personagem.

Agenda positiva

Para chegar às dez casas da primeira temporada do ‘EcoPrático’, 80 foram avaliadas pela produção e pelos consultores (além da jornalista Maria Zulmira, a Zuzu, há o arquiteto ‘sustentável até o teto’ Francisco Lima). Há de residência em condomínio fechado no Morumbi à família de baixa renda em Embu das Artes ou a quitinete do Copan.

O que não varia, diz o criador do projeto, o publicitário Guto Carvalho, é trabalhar com ‘agenda positiva’. ‘Não somos ‘ecochatos’. Em vez de dizer que estão queimando as florestas, dizemos: ‘Olha como são bonitas as florestas’, afirma Carvalho. ‘Damos instrumentos para que as pessoas decupem sua vida em sistemas de relação. Falamos do ecossistema de casa, não da Amazônia.’

Já a série do ‘Fantástico’, chamada pela Globo de ‘reality reportagem’, vem na esteira de outra, de consultoria financeira, que atendeu a família Amorim. E tem um tom mais ‘ecochato’: além de exibir cenas de catástrofe, compara as questões da família Meneghini às médias brasileiras. Se cada um dos quatro moradores da casa produz 400 g de lixo por dia, por exemplo, surge a média paulistana em infográfico na tela: uma pessoa na capital gera, em média, de 700 g a 1 kg de lixo em um só dia.

‘Não vamos dizer: ‘Façam isso ou aquilo’. As metas vão ser decididas com base na análise dos especialistas [‘Mudança Geral’ tem cinco consultores]. Nesta semana, vão bem na água, por exemplo, e mal no lixo. O público poderá decidir qual é a área a que a família deve atacar primeiro’, explica Frederico Neves, diretor da série. Para ele, na moldura de um reality o debate eco fica mais próximo do público. ‘Se ficarmos só na base do discurso imperativo, as pessoas tendem a se cansar’, avalia.’

 

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Canais pagos têm mais espaço para ‘ecoquestões’

‘Com exceção do clássico programa ‘Repórter Eco’, da TV Cultura, o debate ecológico (fora das reportagens dos programas jornalísticos) é mais frequente na TV paga do que na aberta. O GNT, por exemplo, já exibiu ‘Um Mundo pra Chamar de Seu’. A cada episódio, um caso era avaliado, de viagens à vida em um condomínio fechado.

Atualmente, o canal exibe ‘Vivendo com Ed’ (sextas, às 10h30), com o ‘eco-crazed actor’ (ator maníaco por ambiente) Ed Begley Jr.., que dá dicas práticas para fazer da casa ‘um ambiente mais ecológico’ -ele, aliás, já foi de bicicleta à entrega do Oscar. Num dos episódios, por exemplo, Ed instala uma turbina de vento no telhado para melhorar a ventilação.

Há também na programação do canal a estreia, em junho, de uma série ‘verde’ de ficção, ‘Gente Lesa Gera Gente Lesa’. Trata-se da história de uma família que decide abrir uma consultoria de sustentabilidade para ter uma nova fonte de renda. O detalhe é que não sabem nada previamente sobre o assunto. Os personagens passam a descobrir quais problemas do cotidiano estão ligados à questão ambiental.

Já o canal Futura vai fazer um mês ‘verde’, em junho -a Fox teve sua semana ‘Terra’ em abril. O primeiro já exibiu, inclusive, um eco-reality, o ‘Trilheiros’. Moradores da Costa do Cacau, da Chapada Diamantina (ambos na Bahia), de cidades histórias de Minas e de Paraty foram selecionados para provas sobre, é claro, ambiente e história das cidades.

Em junho, o Futura terá ‘Tom da Caatinga’, que não chega a ser um reality, mas tem como proposta registrar a realidade de um bioma -no caso, a caatinga. A ideia é unir manifestações culturais típicas das regiões em que o bioma está presente e registrar a vida de seus moradores, a relação com o rio São Francisco, entre outros.

Já o Discovery chama de reality o ‘À Prova de Tudo’, que exibe no dia 30 de maio, do meio-dia à meia-noite. Nele, Bear Grylls, que ‘já desbravou pântanos do Everglades, as florestas da Costa Rica e os campos nevados da Islândia’, vai ao deserto do Saara, ao Canadá, a montanha da cordilheira dos Andes, à floresta amazônica na Venezuela e ao deserto de Gobi, na Mongólia. A proposta, neste caso, é ‘conhecer a natureza para preservar’.’

 

Bia Abramo

Novela como alegoria

‘EM ‘CAMINHO das Índias’, Glória Perez atingiu o estado da arte de sua teledramaturgia.

O mosaico de personagens popularescos, choque de culturas e ‘grandes temas’ aplicado ao fundo (falso, é claro) de grandes amores nos quais as mulheres sofrem muito e os homens são uns bananas premidos pelas circunstâncias, nunca esteve tão afinado.

É curioso como a televisão tem esse poder: de fazer bem, no sentido de benfeita, uma narrativa cheia de premissas, digamos, inadmissíveis.

Glória Perez faz novela assim: contando história nenhuma e inventando atmosferas, cenas, climas, modas, bordões, tipos e por aí vai. Se estivéssemos no campo da autoria de fato, essa poderia ser considerada uma marca crítica, uma maneira de negar a ‘grande narrativa’.

Mas, não, aqui se fala de telenovela e, portanto, trata-se de vencer a batalha para botar o telespectador durante meses a fio, no mesmo horário, em frente à televisão.

A receita de Glória Perez, apesar de mirabolante, é bastante simples.

Em primeiro lugar, cria-se uma maneira de assegurar que o Brasil é uma maravilha, pelo contraste com costumes rígidos de outras culturas, mesmo que para isso seja preciso forçar a barra.

A Índia dessa novela é visualmente estonteante e, ao mesmo tempo, um pesadelo com seus casamentos arranjados, sistema de castas e mulheres oprimidas. Quase que uma alegoria de escola de samba.

Depois, é preciso inventar personagens acometidos por algum mal complicado -já foram as drogas, a cleptomania e, agora, o foco é na esquizofrenia.

A mirada é extremamente didática -vale dizer, simplificadora- e sentimental, o que acaba por satisfazer aos gregos, aqueles convivem direta ou indiretamente com a questão e se sentem representados, e aos troianos, aqueles que não têm ideia e se julgam esclarecidos pela novela, num jogo de ganha-ganha..

Quem é, por exemplo, etrusco e não ‘compra’ a maneira de abordar por simplória, exagerada ou canhestra, que se lixe, não é mesmo?

Por fim, o nacional-popularesco, a ginga e a malemolência etc. A sorte é que, agora, a personagem de ninguém menos do que Dira Paes, que, além de encarnar como poucas a mulher fogosa, tem a inteligência de fazê-lo de forma irônica.

Com isso, a novela vai indo -se não de vento em popa porque não há mais isso-, pelo menos sem muitos sobressaltos até agora. Isso, é claro, se a gente admite as tais premissas.’

 

Bruna Bittencourt

Chef com ares de rapper volta ao GNT

‘A concorrência de Gerry Garvin não é pouca. Além de seu programa de culinária, ‘Cozinhar É Simples, com G. Garvin’, o GNT exibe ainda aulas gastronômicas com o pop Jamie Oliver, a matrona Nigella Lawson e o raivoso Gordon Ramsay.

Mas os trejeitos de Garvin na cozinha, que mais lembram um rapper do que um chef, acabam garantindo alguma atenção a ele, que estreia nova leva de programas a partir da próxima sexta, na TV paga.

‘Minha comida é bastante universal. Faço qualquer coisa, da culinária italiana a uma cozinha familiar, tradicional, do sul dos Estados Unidos’, contou por telefone à Folha.

Autor de três livros de receitas, dono de uma linha de temperos e de um restaurante, Garvin aprendeu a cozinhar com sua mãe e suas quatro irmãs -receitas familiares são frequentes no programa.

Estudou na França e na Alemanha, passou por cozinhas de restaurantes americanos -foi o segundo chef no Ritz-Carlton de Palm Springs (EUA), aos 23 anos-, até abrir seu bufê, com o qual preparou jantares para nomes como Bill Clinton.

Garvin está longe do estereótipo do chef: com uma informalidade incomum, pontua suas receitas com gírias e gestos exagerados. Entre frases como ‘entenda a comida’ e ‘coloque amor nesse prato’, Garvin prepara pratos com praticidade, como sugere o título do programa.

‘Eu tendo a não mostrar minha criatividade na TV como chef, porque sei que provavelmente alguém no Brasil não conseguirá fazer caranguejo com caviar russo. Por que eu faria coisas que as pessoas não podem fazer?’, diz.

E, se abdica de receitas complexas, não poupa seus espectadores de pratos calóricos. ‘Faço diversos pratos saudáveis, mas não sou nutricionista e não acho que os cozinheiros devem se responsabilizar pelo que as pessoas comem.’

Sobre a melhor dica que pode dar a chefs brasileiros, diz: ‘Tenha certeza de que você tem os melhores ingredientes’.

COZINHAR É SIMPLES, COM G. GARVIN

Quando: às sextas, às 18h

Onde: no GNT

Classificação: não informada’

 

LULA E DILMA
Ferreira Gullar

Se correr o bicho pega…

‘LULA É um homem esperto, de uma sagacidade política rara. Embora inculto, pouco afeito a leituras, se conseguiu chegar às alturas que chegou, foi graças à capacidade de compreender as situações que se criam e sacar de que modo agir em face delas.

Por isso mesmo, julga-se superdotado, merecedor de todas os elogios. Em função disso, opina sobre tudo e mal disfarça a vaidade pelo prestígio que conquistou. Sem exagero, pode-se dizer que Lula é ‘mega’, sugeriu que o Brasil começou de fato com ele e que, graças a seu governo, podem agora os brasileiros se orgulharem do Brasil. Não faz muito tempo, disse que nunca se sentira tão feliz, sem nenhuma razão para queixas. Claro, há pouco fora chamado de ‘o cara’ por Barack Obama e gozara da distinção de se sentar ao lado da rainha Elizabeth. Com razão, ria à toa.

Mas eis que uma notícia inesperada acabou-lhe com a alegria: Dilma Rousseff, sua candidata à sucessão, está com um câncer linfático. Uma bomba. De fato, essa má notícia vinha introduzir, no plano de construção da candidatura de Dilma, um fator inesperado, altamente entrópico, perturbador, com o qual Lula não contava não saber lidar. Nem ele nem ninguém.

Primeiro problema: manter em sigilo aquele fato ou divulgá-lo? Lula não demorou a perceber que o segredo seria inevitavelmente revelado e daria margem a especulações perigosas. Naturalmente, Dilma, como toda e qualquer pessoa, atingida por semelhante fatalidade, tende a mantê-la em segredo, e isso ela o fez, ocultando-a até dos filhos, da mãe e dos amigos mais chegados.

Lula, porém, percebendo a ameaça que aquilo significaria, determinou que ela o revelasse. Chamou seu ministro da Comunicação, para montar a entrevista em rede nacional de televisão, com a equipe de médicos do Hospital Sírio-Libanês, onde o tumor havia sido extirpado.

Aquela entrevista foi uma coisa patética, pelo menos para mim. Mal conseguia crer que ali estava uma senhora a revelar à nação que tinha um linfoma. Por sua livre e espontânea vontade, jamais o faria e, se o fez -aparentando naturalidade ao falar de tão grave doença- foi sem dúvida, porque o presidente da República o determinara.

Esse é o cara. Não apenas sagaz e autocentrado, mas também sempre pronto a impor sua vontade. Todos têm de se curvar a ele e submeter-se ao que entende por seu próprio projeto político. Pareceu-lhe óbvio que a doença deveria ser revelada ao país, mas logo se deu conta de que isso criara outros problemas, já que não é a mesma coisa votar numa pessoa saudável e votar em alguém que está com uma espada pendente sobre sua cabeça.

Ele levou Dilma para Manaus e, lá, afirmou que ela necessitava ser forte para enfrentar a nova situação, mas logo afirmou que ela não tinha nada, que estava curada. Em seguida declarou que era sua candidata e logo acrescentou que isso ainda devia passar pelo PT e a base aliada, como se de fato não estivesse há quase dois anos trabalhando por sua eleição sem pedir licença a ninguém. Parece que, no entanto, agora, com o inesperado linfoma, bateu-lhe a insegurança. Dará mesmo para sustentar essa candidatura nas novas condições?

Difícil resposta. Se a candidatura já era um problema, uma vez que, apesar do esforço de Lula para impô-la, não conseguiu conquistar a adesão da maioria dos eleitores, agora, a coisa torna-se bem mais difícil.

Embora desejemos que a ministra supere a doença, não é possível ignorar a possibilidade de que o linfoma volte a aparecer e essa possibilidade contamina-lhe a candidatura de uma insegurança que atinge tanto os eleitores quanto o PT e os partidos aliados do governo.

Pensemos no PMDB. Terá ele, agora, a certeza de que, apoiando a candidatura de Dilma, obterá no futuro as benesses do poder? Se já antes, parte dos peemedebistas se aproximava de José Serra, como reagirá, agora, o resto do partido? Por isso mesmo, Lula já chamou os dirigentes do PMDB e lhes disse que Dilma é a candidata e está curada..

Não há dúvida de que o dono do pedaço entrou numa entaladela, esforçando-se para mostrar-se seguro.

Logo ele. É que, a esta altura, não há alternativa: ou Dilma é a candidata ou Lula fica sem candidato para 2010. Chamou-me a atenção um pequeno fato ocorrido em Manaus: quando um repórter perguntava a Dilma sobre a doença, Lula os interrompeu: ‘Chega de falar de doença, isso dá doença’. Mas não foi ele mesmo quem a fez se declarar doente?

Pois é, se correr o bicho pega, se ficar o bicho come. O homem põe e o acaso dispõe. A vida é quântica.’

 

INFÂNCIA MODERNA
Emílio Odebrecht

Jovens e natureza

‘POR VOLTA DE de 1860, o engenheiro Emil Odebrecht, bisavô de meu pai, percorria Santa Catarina demarcando terras para os colonos alemães que chegavam à região.

Ele tinha um hábito: sempre que uma planta, pela beleza, raridade ou utilidade, lhe chamava a atenção, colhia mudas ou sementes e as plantava no terreno de sua casa, na então colônia Blumenau. Hoje, ali há um bonito parque.

Aquele parque me veio à lembrança ao pensar sobre como nossas crianças estão se afastando da natureza e sobre as perdas que isso lhes traz. No passado, através da vida ao ar livre, os jovens desenvolviam serenidade, paciência, capacidade de observação, tenacidade, saúde e vigor físico.

Hoje, meninas e meninos gastam horas a fio diante de TVs e telas de computador. Com isso, têm acesso a um mundo de conhecimento até pouco tempo inimaginável. Mas, me pergunto, quais características estarão desenvolvendo?

A tecnologia da informação é uma conquista da humanidade. Porém a maneira como alguns adolescentes dedicam sua existência aos videogames e à internet só pode lhes ser prejudicial.

Há estudos que demonstram que, com tal conduta, estão mais propensos à obesidade e ao tabagismo. Mas não é só. A personalidade também pode sofrer danos. Ansiedade, hiperatividade, perda de sensibilidade humana igualmente podem acometer os viciados no mundo virtual.

Recente pesquisa apontou que crianças brasileiras gastam perto de 20 horas mensais na internet. Meninos e meninas de 2 a 11 anos já representam quase 11% do total de usuários no país. Não me parece saudável. Por outro lado, bosques como o deixado por Emil Odebrecht são cada vez menos visitados pelos jovens, entretidos que estão com diversões eletrônicas.

Com equilíbrio, o mundo virtual e o mundo real vinculado à natureza podem ser complementares, prevenindo deformações.

Fato grave e pouco notado é que a falta de experiências ao ar livre por parte das crianças poderá fazer com que elas não cuidem do meio ambiente quando adultas. Por que defenderão algo que não conheceram bem? Conhecer a natureza não é tão difícil. Ela está nas montanhas e nas florestas, mas igualmente está em uma rua bem arborizada ou no pátio da escola.

Nós, adultos, somos culpados por esse distanciamento entre os jovens, as árvores, animais e rios, porque estamos permitindo e sendo coniventes.

O prazer de desfrutar a natureza pode ser aprendido, com efeitos diretos sobre o bem-estar físico e mental das novas gerações. Faz todo sentido, portanto, mudarmos de atitude.’

 

BOLSA
Folha de S. Paulo

Folha seleciona projetos de pesquisa sobre jornalismo

‘A Folha dá início hoje a um concurso para incentivar pesquisas sobre a história do jornalismo brasileiro. Chamado de Folha Memória, o programa selecionará três projetos de pesquisa e premiará seus autores com uma bolsa de R$ 2.300 mensais -mediante reembolso de despesas.

Nos seis meses em que receberão essa ajuda de custo, os candidatos selecionados deverão conduzir sua pesquisa com rigor acadêmico e transformá-la em um texto de interesse geral e caráter jornalístico. Eles serão orientados por um jornalista da Folha..

O melhor dos três trabalhos será publicado em livro editado pela Publifolha, e seu autor ganhará um laptop.

No concurso, que tem patrocínio da Pfizer, a história do jornalismo deve ser entendida em sentido amplo -ou seja, podem ser investigados fenômenos de qualquer época do jornalismo do país.

Os projetos também não precisam se restringir ao estudo de nenhum meio jornalístico específico -podem ser estudados veículos impressos, on-line etc.

Poderá inscrever seu projeto quem estiver concluindo ou tenha concluído graduação em qualquer universidade brasileira. Só será aceita a inscrição de um projeto por pessoa e as pesquisas devem ser individuais..

Inscrição e seleção

A inscrição deve ser feita no site http://folhamemoria.folha.com.br, até o dia 28 de junho. Ao se inscrever o candidato preenche uma ficha à qual anexará o projeto de pesquisa. No site está também regulamento detalhado do concurso.

A seleção passa por três fases. Na primeira, 30 projetos finalistas serão selecionados pela Folha e encaminhados para uma banca composta pela historiadora Isabel Lustosa, da Fundação Casa de Rui Barbosa, pela jornalista Renata Lo Prete, editora do Painel, e por Silvia Prevideli, consultora em Comunicação Corporativa da Pfizer. Essa banca escolherá os três contemplados com as bolsas, cujos nomes serão divulgados em 9 de agosto.

A partir do dia 10 de agosto, os três bolsistas devem começar a trabalhar na pesquisa, cujo resultado final deverá ser entregue seis meses mais tarde a uma outra banca.

Nessa etapa, os avaliadores serão Eleonora de Lucena, editora-executiva do jornal, Nicolau Sevcenko, professor de história da USP, e Cristiane Santos, gerente de Comunicação Corporativa da Pfizer. Eles vão escolher o trabalho vencedor, que será divulgado no mês de fevereiro de 2010.’

 

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O Estado de S. Paulo

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