Friday, 29 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

Justiça bloqueia contas dos donos

Uma decisão judicial de 2003 levou o jornal , de Porto Alegre, a uma crise que parece interminável. O processo movido contra a publicação por Julieta Vargas Rigotto, inconformada com matéria que julgou ofensiva à memória do filho Lindomar, irmão do ex-governador Germano Rigotto, abre espaço para discutir o papel da Justiça no cerceamento à imprensa.


Em maio de 2001, o jornal publicou a reportagem ‘Caso Rigotto – um golpe de US$ 65 milhões e duas mortes não esclarecidas’, que tratava de irregularidades em contratos para a construção de subestações da Companhia Estadual de Energia Elétrica (CEEE) assinados em 1987, quando Lindomar trabalhava na estatal. A primeira morte era a de uma bailarina que caiu do apartamento de Lindomar, em 1998. A segunda era a do próprio Lindomar, alvejado por um tiro aos 47 anos enquanto perseguia assaltantes no litoral gaúcho, em 1999.


No caso da CEEE, Lindomar foi uma das 22 pessoas e 11 empresas denunciadas pelo Ministério Público Estadual (MPE/RS) por participação em fraude. O caso foi à Justiça, mas aguarda há 15 anos por julgamento. Em valor atualizado, as irregularidades na CEEE equivaleriam hoje a R$ 800 milhões.


Julieta moveu dois processos contra o jornal. No criminal, a publicação e o jornalista foram absolvidos. Já no cível, a absolvição de primeiro grau foi revertida no tribunal, que considerou não ter como afastar a responsabilidade da editora pelo artigo.


‘Legitimidade para defender a memória do filho’


A notícia dos processos levou a publicação a perder anúncios. Na execução, a Justiça autorizou a penhora dos bens da empresa em 2005, mas os credores não aceitaram o único bem da editora, um estoque de livros. Em agosto de 2009, quando o valor da indenização chegava a R$ 54 mil, um perito passou a controlar as contas da empresa para retirar 20% do faturamento. A Justiça suspendeu a cobrança diante das receitas irrisórias. Os advogados de Julieta propuseram acordo, que envolveria parcelamento do débito, retratação e retirada de circulação da edição.


Bones não aceitou: ‘Como posso pagar por ter feito matéria correta?’ Em junho deste ano, Bones e Kenny Braga, sócio minoritário do jornal, viram os saldos que tinham em conta bloqueados. Os advogados da empresa conseguiram impugnar a decisão.


O advogado Dickson Pereira, representante de Julieta Rigotto, diz que sua cliente ‘tem legitimidade para defender a memória do filho em razão de conteúdo injurioso, calunioso e difamatório da reportagem do jornal’. O ex-governador Germano Rigotto (PMDB) disse que, ao contrário do que a matéria afirmava, não indicou Lindomar para cargo na CEEE. E diz que o processo foi movido sem seu conhecimento.


 


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