Thursday, 25 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Mário Magalhães

‘Logo na abertura da conferência anual da ONO (iniciais em inglês da Organização dos Ombudsmans de Notícias), na segunda-feira, o ‘Editor dos Leitores’ do semanário inglês ‘The Observer’, Stephen Pritchard, fez uma breve observação: ‘Não há jornalismo em transição, mas em revolução’.

Pritchard se referia ao título do encontro, ‘Ombudsmans em um tempo de transição’. Se algum dos 45 representantes dos leitores (de 13 países) que compareceram aos três dias de debates na Universidade Harvard (Estados Unidos) esperava muitas certezas sobre o futuro do jornalismo, frustrou-se. Como em tantas revoluções, há mais perguntas que respostas.

Algumas previsões começam a virar realidade no exterior, em ritmo mais acelerado que no Brasil.

Alan Rusbridger, editor do jornal londrino ‘The Guardian’, bem-sucedida empreitada jornalística na internet, a partir de um diário convencional, falou do ‘fim das barreiras entre o impresso e o on-line’.

Richard Chacon, ex-ombudsman do ‘Boston Globe’, contou como os repórteres agora saem para as apurações com apetrechos de áudio e imagem a divulgar no sítio do jornal americano. Aqui o hábito é pouco disseminado.

Em sua derradeira coluna como ‘Editor Público’ (assim o ombudsman do ‘New York Times’ é chamado), Byron Calame escreveu que faz ‘notável progresso’ a ‘transição do centro de gravidade da Redação para a Web, crucial para o futuro do ‘Times´‘. Calame ponderou que a transição pode ser ‘um longo caminho’.

Futuro na internet

O aparente paradoxo da reunião, convocada para discutir a passagem do jornalismo ao mundo digital, é que as reportagens citadas como referência foram impressas, e não produzidas para a internet. A reportagem é gênero jornalístico nobre. É no papel e na TV que ela se concentra.

Eis uma preocupação de quem defende os leitores e espectadores -cujo interesse maior é receber informação de qualidade: o jornalismo na internet manterá os padrões de exigência do impresso?

Parece simples, mas não é. Nelson Castro, ombudsman do diário argentino ‘Perfil’, indagou por que jornais e revistas exigem a identificação dos remetentes de mensagens, e os sítios e blogs a dispensam.

Reproduzir a linguagem do papel na tela seria não somente improdutivo, mas um desperdício. Valores caros ao jornalismo devem, porém, prevalecer em todos os meios.

Um dos aspectos fundamentais do debate contemporâneo sobre o jornalismo impresso é a crise que o abate.

Quanto mais é conhecido, menos se confia nele. É o que diz pesquisa na Turquia, onde só 3% dos jornalistas acreditam no que a mídia diz. Nos EUA, fiascos castigaram sua imagem -nenhum superou as cascatas do repórter Jayson Blair, do ‘New York Times’, no começo da década.

‘Transparência’, ‘prestação de contas’, ‘credibilidade’, ‘justiça’ e ‘equilíbrio’ são princípios, procedimentos e objetivos a buscar no mundo inteiro. Foi o que se ouviu na conferência, na qual se acumularam relatos de como aqueles ideais são subvertidos.

O jornalismo on-line tem vantagens claras, além da conjugação de recursos próprios à TV, ao rádio e à imprensa. Rusbridger sublinhou que, como a internet permite o acesso a uma profusão de fontes, haverá -já há- ‘milhões de checadores de informações’.

Para o único brasileiro no evento, se sobressaiu a impressão de que, nos EUA e no Reino Unido, a transição para o jornalismo na rede é conduzida por profissionais do primeiro time, amparados em investimentos fartos.

No Brasil, os jornais destacam quadros talentosos e abnegados, mas que se ressentem de magras estruturas.

Esta timidez fermenta a decadência dos jornais, por mais tempo que os dedos se mantenham sujos de tinta. Mesmo que demore -a revolução depende da guinada publicitária para o novo meio-, o jornalismo vindouro estará hegemonicamente na internet, inclusive os jornais diários. Ainda que persistam, à procura de respostas, tantas perguntas sobre o futuro.’

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‘O ‘superleitor’ e as greves’, copyright Folha de S. Paulo, 27/05/07.

‘Talvez não exista prejuízo maior aos leitores da Folha do que a supressão, para a manifestação de instituições e personalidades, de um espaço que deveria ser seu. Na quinta, nenhum ‘leitor comum’ teve a assinatura estampada no ‘Painel do Leitor’.

Levantamento sobre a seção em 2007 mostra que, empatado com um secretário de Foz do Iguaçu (PR), o líder até agora, com sete mensagens, é o secretário estadual de Ensino Superior de São Paulo, José Aristodemo Pinotti.

Na crítica diária que escrevi no dia 15 (pode ser lida em www.folha.com.br/ombudsman), a nota mais importante se intitulava ‘O superleitor’. Tratava de mais uma carta.

Nela, o secretário esclarecia uma entrevista que saíra na edição da véspera. Em Cotidiano, uma reportagem também trazia declarações suas sobre a entrevista.

Em 14 de maio, o entrevistado Pinotti condenara os estudantes que haviam invadido a reitoria da Universidade de São Paulo.

Os comentários não levaram a Folha a ouvir o ‘outro lado’ dos atacados. Lamentei o procedimento.

No dia 18, nova mensagem apareceu no ‘Painel do Leitor’. Na terça, outra. Pinotti não é assíduo apenas como remetente. Com quatro artigos, é um dos vice-campeões da seção ‘Tendências/Debates’.

É legítima a reivindicação do secretário de ter suas mensagens publicadas. O erro é da Folha, que deveria assegurar o pronunciamento de Pinotti nas editorias dedicadas à cobertura dos assuntos sobre os quais ele opina. Sobre a mobilização nas universidades, em Cotidiano.

As cartas não precisam ser publicadas nesse formato, mas como afirmações entre aspas. Assim, o ‘Painel do Leitor’ seria poupado, para cumprir sua vocação.

A Folha se empenhou na semana passada em acompanhar os acontecimentos na USP, na Unicamp e na Unesp, aos quais erradamente deu pouco destaque no início.

Mesmo assim, o jornal ainda não logrou explicar os decretos do governo José Serra sobre as universidades paulistas. Não basta contemplar opiniões divergentes, é preciso esclarecer.

Editorial afirmou que ‘as autoridades estaduais não conseguiram justificar, ou ao menos tornar compreensíveis a série de decretos e determinações interpretados como atentatórios à autonomia’.

Por que a Folha não pode tornar os decretos ‘compreensíveis’, traduzindo aos leitores a terminologia legal?

Como passei quase toda a semana no exterior, não me sinto em condições de avaliar outros aspectos da cobertura.’