Thursday, 18 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Mídia israelense deve erradicar autocensura

É a voz de Israel hoje, mas nos leva de volta ao passado; estão de volta à era Ben-Gurion, quando a Autoridade Radiodifusora de Israel se abrigava sob as asas do gabinete do primeiro-ministro. Este mês, foi a vez da divulgação do livro B’Kol Ram (Em voz alta), do jornalista Elimelech Ram, que confessa: “A censura nos calou. Esse foi o ambiente imposto por Ben-Gurion. Nós acatávamos o que o governo dissesse. Levou tempo para que percebêssemos que alguma coisa ali não era muito salutar e que a aliança tinha que ser rompida”. O que, naquela época, foi compreendido, hoje não é.

Eu estava lá, nesses anos – era um novato na companhia de guerreiros experientes e seus filhotes. Lembro-me dos telefonemas de assessores e consultores. Cada um de nós desenvolveu seu próprio método para evitá-los. No meu caso, inventei o telefone avariado – Alô, o que é que há com essa porcaria de telefone? Alô, não escuto nada. E quando a linha fosse consertada, o programa já estava no ar e era muito tarde para censurá-lo.

Eu era um jovem sem experiência, mas nunca trabalhei com pessoas dignas de tanta inteligência e integridade, recusando-se a acompanhara voz da maioria. Embora a lei tivesse subjugado o rádio ao governo – vivíamos ainda sem televisão –, todos sabíamos que mudanças viriam logo. E nós não esperamos que esse dia chegasse; ajudamos a concretizá-lo. Em 1965, o primeiro-ministro Levi Eshkol resgatou o rádio da escravidão para a liberdade e foi aplaudido de pé por aquela turma de subversivos – Haggai Pinsker, Yoram Ronen, Yirmiyahu Yovel, Micha Shagrir, Yigal Lossin e Yaron London.

Lacaios profissionais

Onde estarão eles e onde estarão Amir Gilat, Yoni Ben-Menachem e Mickey Miro? Onde está Eshkol e onde está o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu? Todo o Estado recém-criado é um Estado mobilizado. Não há necessidade de mobilizá-lo, pois o faz por sua livre vontade, por um sentido de missão: juntemo-nos para ajudar a nação. Mas os anos passam, a sociedade amadurece e então passa a caminhar por conta própria. Em meados da década de 1960, com apenas 15 anos de independência, tínhamos consciência de nós próprios e atravessávamos as ruas sem escolta.

É essa a diferença entre aqueles tempos e os atuais – e vive la différence… Queríamos nos livrar de nossos grilhões, enquanto nossos sucessores querem ficar a eles amarrados. Queríamos fazer a emissão e eles querem servir, querem renovar a aliança que nós decidimos romper. Basta verificar os novos gerentes para saber do que são feitos: há subserviência e não há resistência, há missionários e não há missão, há pagamento e nada em troca – são lacaios profissionais. É agradável e gratificante ficar à entrada da sala de conferências nas manhãs de domingo e receber um tapinha nas costas do primeiro-ministro; não há dúvida, idiota, ele gosta de você.

O medo que paralisa e silencia

Sempre lutamos por uma difusora pública, mesmo durante os piores períodos, quando eram enviados “comissários” para supervisionar a correção política, para domar a megera. Chegará o dia em que essa função será preenchida, dizíamos a nós próprios. Acreditávamos que seria um erro colocar nossa confusão nas mãos daqueles conciliadores dos canais comerciais. Mas agora, que Netanyahu está tentando controlar a autoridade difusora e o ministro da Defesa, Ehud Barak, está reeducando a rádio do exército, começamos a nos arrepender. Afinal, não é nosso desejo ter um enorme e dispendioso megafone projetado para lavar nossos cérebros. Quando se trata de boicotar uma coisa banal, enfrentamos e vamos à luta, mas quando somos envenenados por sofisticados mecanismos patrocinados pelo governo, um boicote é inconcebível.

E talvez haja outra maneira de por fim ao expurgo (quem será o próximo demitido?): eliminar a autocensura enquanto ela não cresce e expulsar do estúdio o medo que nos paralisa e silencia. O pessoal lá de cima tem que saber que o funcionário da difusora que foi demitido não será substituído tão cedo, que os colaboradores não terão colaboradores e o microfone da Voz do Dono permanecerá desligado e abandonado. Isso seria esperar muito dos colegas?

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[Yossi Sarid é jornalista do Haaretz]