Tuesday, 19 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1279

O maridão na net e o futuro dos jornais

‘Você não vai comentar o fato de que o marido da Lina (ex-Receita) foi ministro da Integração Nacional durante um ano no governo FHC? Aguardo o seu comentário!’, escreveu a leitora Suely Gomes, em mensagem enviada ao Balaio na sexta-feira, 21, às 14:04.

Dezenas de outros leitores fizeram-me a mesma cobrança ou simplesmente resolveram contar eles próprios o que sabiam sobre Alexandre Firmino de Melo Filho, o marido de Lina Vieira, que teve papel de destaque no longo depoimento prestado semana passada pela ex-secretária da Receita Federal, no Senado, sobre um presumível encontro que teria mantido com a ministra Dilma Rousseff no final do ano passado.

Na internet é assim: o leitor cobra e pauta o blogueiro, com ponto de exclamação e tudo. Quando não é atendido, trata de contar a história que não encontrou na grande imprensa.

O leitor que se identifica como CB (por que não dar o nome completo? Não entendo isso…) escreveu às 16:01: ‘A sra. Lina Vieira, que acusa a ministra Dilma, é casada com Alexandre Firmino de Melo Filho, que foi ministro interino do Ministério da Integração Nacional de 20/08/1999 a 17/07/2000 no governo de FHC. Precisa dizer mais… Essa oposição não vale é nada. Querem o poder de qualquer jeito. Não é oposição séria. Seus políticos são bandalhos. Se entrarem no poder, nada vai mudar’.

‘Ireneth Maria Dias Weiler, a chefe de gabinete de Lina Vieira, aparece no TSE (Tribunal Superior Eleitoral) como doadora da campanha de Fernando Henrique Cardoso para presidente da República em 1998″, acrescenta o leitor Carlos, às 19:17.

Tratamento diverso

Só fui ler algo sobre o assunto na edição de sábado (22/8) da Folha (o depoimento foi dado na terça-feira, 18), uma nota de apenas sete linhas sob o título: ‘Passado: Marido de Lina foi ministro da Integração de Fernando Henrique’.

Muito mais informações sobre este personagem o leitor poderá encontrar aqui no Balaio nos comentários enviados neste domingo pelo leitor Simas Mayer e ao longo da semana por vários outros.

O papel do marido de Lina Vieira nesta história pode nos ajudar a entender melhor por que só agora, nove meses depois, ela deu entrevista à Folha para falar do tal encontro que teria havido, e que a ministra Dilma Rousseff nega, para tratar das investigações da Receita sobre a família Sarney.

Se não fossem as informações sobre as relações de Alexandre Firmino de Melo Filho com o consórcio PSDB-DEM, que começaram a pipocar na internet em diferentes sites e blogs, ninguém ficaria sabendo da sua existência.

Além das suas implicações políticas na disputa sucessória de 2010, o episódio Lina-Dilma revela a diferença de tratamento dado ao assunto na internet e na velha mídia.

Ponto central

A este respeito, vale a pena ler o interessante artigo publicado no Observatório da Imprensa pelo jornalista Sandro Vaia, que foi meu colega no Estadão, onde chegou depois a diretor de redação, quando começamos a trabalhar juntos na empresa como repórteres nos distantes anos 1960.

Sob o título ‘Os jornais e a cacofonia da internet‘, depois de afirmar logo na abertura que ‘é dado como certo que os jornais impressos vão morrer’, com o que nós dois não concordamos, Sandro Vaia escreve:

‘Um certo clima de euforia inconsequente toma conta de setores da blogosfera que imaginam que está em andamento o processo de tomada do poder pelos `democratizadores´ da informação em razão da constante perda de audiência por parte dos grandes jornais’.

Desconheço este clima de euforia, assim como o processo de tomada de poder pelas novas mídias, mas é certo que os grandes jornais estão perdendo circulação, não só no Brasil, mas no mundo inteiro.

Já escrevi aqui mesmo no Balaio que não acho a internet culpada pela ‘perda de audiência dos grandes jornais’, como disse Vaia. Para mim, o que está tirando público dos jornalões de papel não é a concorrência dos monitores, mas o conteúdo de baixa qualidade, a indiferenciação dos produtos do pensamento único, que não sabem mais como para atender a freguesia cada vez mais exigente e participativa.

No ponto central do seu artigo, Sandro Vaia faz uma série de perguntas que já embutem as respostas – do seu ponto de vista, claro, mas que não são as minhas:

‘A pergunta instigante é esta: que fariam os blogueiros comentadores sem ter o que comentar? Que condições tem a maioria – senão a totalidade – deles de apurar e publicar informações acabadas, completas, críveis, influentes? Qual é o nome de um site ou um blog que não esteja ligado a uma corporação jornalística estabelecida e que tenha originado uma só informação exclusiva e importante que tenha mexido com a ordem das coisas?’

Mudanças no mundo

Já que ele perguntou, respondo: tem, sim. Este Balaio aqui, por exemplo, um blog que não é ligado a nenhuma corporação jornalística estabelecida e tem publicado entrevistas, reportagens e informações exclusivas nestes 11 meses em que está no ar.

Mexer com a ordem das coisas não é meu objetivo, mas vou dar dois exemplos recentes de matérias publicadas aqui primeiro. Na semana passada, em entrevista exclusiva com Marina Silva, o Balaio antecipou sua decisão de trocar o PT pelo PV e as linhas centrais do discurso da sua provável candidatura à presidência da República.

Neste final de semana, a revista Veja publica entrevista com Carlos Augusto Montenegro, o homem do Ibope, falando sobre as dificuldades que Lula terá de eleger o sucessor, que, segundo ele, será José Serra, repetindo os mesmos argumentos da conversa que tivemos dois meses atrás contada aqui no Balaio.

Em menos de um ano, o único funcionário deste blog já rodou mais pelo país para fazer reportagens do que qualquer outro dos grandes jornais. Já foram publicadas entrevistas exclusivas com quatro presidenciáveis – Aécio, Ciro, Dilma e Marina. Neste blog os leitores também encontraram informações exclusivas sobre o dia a dia da luta do vice-presidente José Alencar contra o câncer.

Falo por mim, mas sei que tem muitos outros colegas na blogosfera fazendo o mesmo trabalho. De acordo com os números do Google, só o Balaio registra 43.500 links de blogs de todo o país. Se cada um deles tiver apenas cinco leitores, já dá a circulação diária do Estadão, por exemplo.

O mundo da informação mudou, caro Sandro Vaia, só os jornalões ainda não perceberam. Mas concordamos num ponto do que você escreveu ao final do artigo: ‘(…) para as sociedades abertas, pluralistas e democráticas, eles (os jornais) ainda são indispensáveis’. Cabe a quem os dirige descobrir o que fazer para que isso se torne realidade.

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Além dos leitores do Balaio, vários blogs trataram do papel do marido de Lina Vieira no bate-boca que a envolve com a ministra Dilma Roussef. O amigo Washington Araújo, do Rio, me chamou a atenção para o que escreveu José Sergio Rocha no blog ‘Quem é vivo sempre aparece‘. Este tipo de comentário você não vai ver em nenhum dos jornais ou agências citados pelo Sandro Vaia em seu artigo como fornecedores únicos de matéria prima para a blogosfera.

Jabuti não sobe em árvore. Se subiu, só se alguém botou.

Quem assistiu pelo menos parte do depoimento da ex-secretária da Receita Federal, Lina Vieira, na Comissão de Constituição e Justiça, com transmissão pela TV Senado e Globonews, vai lembrar que um cidadão constantemente sussurrava uns bizus no ouvido da moça. Isso é normal, coisa de assessor. Só que o cara não parava quieto.

Essa vontade de aparecer a qualquer custo tem seu preço. No meio de uma pergunta do Mercadante, o assessor lá estava cochichando nas orelhas da Lina. O bigodudo petista, que já estava meio enfurecido, deu-lhe um esporro, pois estava atrapalhando o trabalho da comissão.

Pois é, o cara chamou tanta atenção que foram descobrir quem era. Não era assessor coisa alguma. Era o marido da Lina.

Até aí, tudo bem. É que nem um velho anúncio do Gelol: não basta ser marido, tem que participar.

Ontem (22/8), lendo o blog Conversa Afiada, de Paulo Henrique Amorim, deparei-me com a seguinte informação: o marido da Lina, publicitário e marqueteiro no Rio Grande do Norte, chama-se Alexandre Firmino de Melo Filho e foi (pasmem) ministro interino da Integração Nacional durante quase um ano (entre agosto de 1999 e julho de 2000), no governo de Fernando Henrique Cardoso.

Ou seja, mais um episódio da novela ‘Como é sujo o jogo da política’. Foi, portanto, encenação pura aquele depoimento sobre um encontro que a depoente teria tido com Dilma Rousseff numa data que não soube precisar – nem hora, nem dia, nem semana e nem mesmo o mês em que aconteceu.

A ex-secretária da Receita parecia firme, sincera e convincente, apesar desses ‘detalhes’. Mas o maridão foi arroz de festa e estragou tudo.

Alguém leu essa notícia em qualquer grande jornal?

Agora, imagine o oposto. Vamos que outra senhora, dona Maria das Couves, ocupasse o mesmo cargo num futuro governo tucano.

Foi demitida por esse governo, tomou ódio de alguém desse mesmo governo e, quando surgiu a oportunidade, resolveu abrir a boca, sendo assessorada pelo marido que, antes daquele governo, foi ministro do PT.

Não seria desmascarado logo que entrasse na sala da comissão?

Tem gato na tuba desse depoimento. Na caixinha de música, o coral Garganta Profunda canta essa pérola do Braguinha.

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Jornalista