Friday, 26 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Obama perde força e imprensa está anêmica

Não vou escrever sobre o estado da saúde nos EUA e as crescentes dificuldades para o presidente Obama impor sua agenda nesta questão, tendo como pano de fundo a morte do senador Ted Kennedy, um cruzado por reformas no setor. São temas cruciais e extenuantes, mas vou falar sobre o estado de saúde da imprensa cobrindo o debate sobre a saúde. Nas últimas semanas, tivemos mais uma prova de sua anemia e estou sendo específico sobre a imprensa mais tradicional. Ironicamente, os jornalistas da grande imprensa (marco zero da crise da mídia) entraram com vigor na cobertura e o fracasso para impactar apenas comprovou a fraqueza.


Os jornalões, revistas, os sites de publicações e as televisões pelo menos tiveram a coragem de não se protegerem com o escudo-desculpa da objetividade formal, que obriga a dar o mesmo peso às palavras de antagonistas. Quando a tropa de choque do movimento conservador foi à carga inventando histórias sobre os planos do governo Obama a imprensa contraatacou mostrando que as denúncias e argumentos eram baseados em mentiras e má-fé.


A ex-governadora do Alasca e ex-candidata a vice-presidente Sarah Palin foi desmascarada com sua lenga-lenga de que o governo Obama planeja cortar os custos de saúde com uma espécie de esquadrão da morte para eliminar as pessoas mais idosas. Não foram apenas os veículos e jornalistas suspeitos (mais liberais) que reagiram. Colunistas conservadores, como David Brooks, do New York Times, enfatizaram que as acusações eram doidas e mentirosas.


Qual é a origem da insanidade informativa e política? De fato, havia um projeto já arquivado na reforma da saúde e que inclusive fora arquitetado por congressistas republicanos para que houvesse aconselhamento sobre decisões de morte voluntária em situações médicas extremas. Mas com oportunismo político, Sarah Palin e mais gente nas hostes conservadores inventaram esta história de que Obama e os democratas estavam promovendo a eutanásia para conter custos e também para dar mais poder ao Estado bicho-papão para decidir quem deve viver ou morrer.


Prova de impotência


É verdade que alguns jornalistas, em particular na rede Fox, preferiram o papel de agentes das distorções ou se evadiram com semânticas. Bill O´Reilly, por exemplo, optou por acusar os liberais de manipularem as palavras de Sarah Palin, pois ela nunca usou a expressão ‘eutanásia’ nas suas denúncias. O estrago foi feito e, como lamentou a respeitável publicação conservadora National Review, um clima de histeria tomou conta das reuniões públicas convocadas por congressistas para discutir a reforma da saúde.


A imprensa tradicional investiu não apenas para denunciar as barbaridades retóricas, mas para explicar as complexidades do cenário de saúde nos EUA. A blitz informativa, no entanto, não foi um antídoto contra as mentiras e hipérboles. O próprio governo Obama não ajudou a elucidar as coisas com suas ambiguidades, vacilos e perda de controle do encaminhamento das propostas (que ficaram a cargo da desacreditada maioria democrata no Congresso).


No final das contas, em uma pesquisa da rede de televisão NBC, na semana passada, 45% das pessoas disseram que havia algo sinistro nos planos do governo. A cifra era de 75% entre os espectadores da Fox News. Esta aí uma desoladora prova da impotência da imprensa tradicional. Jornalistas não têm mais credibilidade ou prestígio do que políticos. 

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Jornalista