Thursday, 25 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Paus-d´arco perdendo as flores

Dia 7 de agosto, página A2. Sob o título ‘Paus-d´arco em flor’, o jornal Folha de S.Paulo publica o que deveria ser apenas mais um artigo do combalido, mas ainda presidente do Senado, José Sarney. Mas, ao contrário do que parece, não se trata apenas de uma amena homenagem aos lindos paus-d´arco que, nessa época do ano, estão floridos e deixam Brasília ainda mais bonita. É, na verdade, um artigo que custei a digerir, e apenas agora me convenci de que não é piada. Temos mesmo um José Sarney denunciando que ‘o conflito político passou da guerra de classes para a guerra da mídia’.

Sarney mostra-se indignado com ‘o poder econômico (que) sempre acompanha a força de controle da opinião pública’. Com as novas técnicas de manipulação, postas em prática por meio da comunicação em tempo real. E com todo o conjunto de elementos que vem transferindo a luta política da sociedade e das instituições tradicionais para a mídia. Sarney em papel de vítima da mídia, pasmem!

Mas… não foi justamente o controle exercido pela família Sarney sobre as comunicações do Maranhão que possibilitou o seu domínio político do estado – domínio este que já dura mais de 40 anos? Não foi a força do seu aparato comunicacional sobre a opinião pública que possibilitou a manutenção do clã Sarney durante tanto tempo no poder? E essa opinião pública não foi construída com base em muita influência política e em muito poder econômico?

Ventos da mudança

Sim, justamente. A família Sarney é dona do maior império de comunicação do Maranhão. Império que inclui a Rede Mirante de Televisão, composta por uma geradora afiliada da Globo em São Luís e por retransmissoras que chegam a 151 municípios maranhenses; inclui as rádios Mirante FM e AM, líderes de audiência no estado; e também o jornal O Estado do Maranhão, que detém 67% do mercado local de jornais.

Mas Sarney, quem diria, foi picado pela mosca azul da euforia tecnológica. Para ele, na guerra da mídia, o importante não são rádios, TVs ou jornais, e sim o ‘mais ativo e o mais importante meio: a internet’. Segundo Sarney, ‘é aí que reside o verdadeiro embate numa luta de versões, ataques, defesas, notícias e contra-notícias, que são digeridas a todo momento’. E conclui: ‘São tantas as verdades que ao final não se sabe qual é a verdade.’

Se a preocupação de Sarney é com a internet e com o poder revolucionário do #forasarney no Twitter, ele pode ficar tranquilo. Porque o Maranhão é a unidade da federação com os piores índices de acesso à internet – lá, a exclusão digital é superior a 80%. No Maranhão, ao contrário do que a euforia tecnológica de Sarney pretende nos fazer crer, a opinião pública continua e ainda continuará sendo dominada pelas suas rádios, pelas suas TVs e pelos seus jornais.

Enquanto discutimos essas coisas, as flores dos paus-d´arco em Brasília começam a cair. Estariam sendo derrubadas pelos ventos da mudança que chegam ao Planalto Central?

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Jornalista, mestre em Comunicação pela Universidade de Brasília e consultor legislativo da Câmara dos Deputados; editor do blog Museu da Propaganda