Friday, 26 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Quatro anos em 11 minutos e o medo da danadinha

Onze minutos com candidatos que almejam o cargo de chefe do Executivo é irrisório. Limitar a tão pouco tempo a discussão de idéias que podem representar avanços ou retrocessos socioeconômicos para o Brasil nos próximos quatro anos e que teria, por razão fundamental, orientar o eleitor a uma escolha pelas propostas apresentadas, é reduzir a prestação de serviço do jornalismo a sua sociedade. Agilidade é primordial em televisão, isso é fato. Mas, convenhamos, dimensionar debates presidenciais à velocidade da luz não informa – desorganiza e desacredita esse trampolim para reflexões críticas. Típico sintoma desses tempos de entretenimento informacional que, enquanto arte industrializada, segundo o jornalista Eugênio Bucci, ‘precisa contar com o convencimento racional do público em suas utilidades intrínsecas’.

Em quase um quarto de hora é praticamente impossível até resumir-se a trajetória política que ajudou a nortear a plataforma ideológica de campanha e de governo dos candidatos. Cada pergunta feita para provocar e expor determinado político a uma polêmica gerava a tão esperada réplica. Em algumas situações, na tentativa prévia de defender seu próprio desempenho, atropelava-se a finalização da sabatina e a dicotomia clássica entre questionamento e resposta quase transformava a bancada de um dos mais assistidos telejornais do país em típico telebarraco. Afinal de contas, ninguém quer passar a imagem de despreparo e derrota a mais de 20 milhões de pessoas em apenas 660 segundos.

Se ainda fossem disponibilizados os outros 49 minutos que formariam o tempo regulamentar de cada edição diária do JN saberíamos com mais riqueza de detalhes o porquê da obsessão de Cristovam Buarque em se montar uma Lei de Responsabilidade Educacional, pela qual a gerência de escolas e faculdades compartilharia dos mesmos rigores com que o Banco Central tem com as instituições financeiras ou se realmente Geraldo Alckmin pretende privatizar o sistema carcerário como andou se especulando.

Porém, em 11 minutos, também se pode detectar com mais facilidade a falta de direcionamento ético com que se pauta uma entrevista e, que nesse caso, significou institucionalizar a paranóia e o interrogatório inquisidor. Tentaram transformar uma senadora de Alagoas, ex-professora com base educacional católica, numa atualização, em calça jeans e blusinha de algodão, daquele horrível monstro vermelho da revolução bolchevique chamado socialismo. Tentar enfiar goela abaixo do eleitor noções sintéticas de Estado totalitário, expropriação da propriedade privada e suposto desrespeito a premissas constitucionais, num suposto apoio a invasões de prédios públicos, pareceu estratégia discursiva de rejeição prévia de uma inimiga em potencial que quer o poder. Nem o líder do PCC (Partido Comunista Carcerário?), Marcola, seria tão pressionado contra a parede.

Os psicanalistas explicam

Mas o que tanto alvoroçou o casal-telejornal William Bonner e Fátima Bernardes na entrevista com a candidata do Psol, Heloísa Helena? Não foi nem o fato de tentarem expor a cartilha marxista ao ridículo como um pão embolorado de difícil digestão nesses tempos neoliberais globalizantes. Talvez tenha surtido mais efeito como elemento surpresa a quebra de protocolo, os sorrisos, as respostas danadinhas e as simpáticas lições de paciência ao explicar ao casal de apresentadores que o moderno marxismo de resultados não come mais criancinhas. Heloísa até pediu desculpas ao ofender aspones petistas com termo pejorativo criado pelas elites para as classes trabalhadoras humildes (chamou o ministro Tarso Genro de ‘empregadinho’ de Lula, esquecendo-se de que os meios de produção brasileiros são formados por empregados).

Estariam as Organizações Globo preocupadas com uma guinada à esquerda populista-revolucionária da América Latina, vide os presidentes Hugo Chávez (Venezuela) e Evo Morales (Bolívia) ou com o crescimento das pesquisas de intenção de voto que já apontam HH para um hipotético segundo turno com Lula? Bem, de fato ela ainda carrega o estigma de opção do eleitorado para o chamado voto de protesto, alternativa ao governo atual, mas sem possibilidades reais de vitória.

William Bonner e Fátima Bernades estão longe de serem jornalistas políticos, pois evidenciaram a indecisão quanto a ser Luiz Inácio Lula da Silva presidente ou candidato. O casal ofereceu pouca conexão entre atributos da vida pública e individual do candidato/presidente em temas espinhosos dos últimos seis meses. A pressa, como inimiga da perfeição, sinalizou-se nas declarações de Lula, de que precisaria muito mais do que 11 minutos para explicar ao eleitorado o que ele queria dizer com ‘combater a ética’. Os psicanalistas não chamam isso de ato falho à toa, presidente.

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Jornalista