Saturday, 20 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Revista requentou matéria sobre delegado

O jornalista Fernando Rodrigues publicou em seu blog uma nota, reproduzida abaixo, em que revela uma fraude da revista Veja. Segundo ele, a reportagem do semanário da Editora Abril intitulada ‘Ele é um canhão à solta’, publicada na edição desta semana (2.104, com data de capa de 18/3/2009), se baseia em um depoimento do delegado da Polícia Federal Protógenes Queiroz de setembro do ano passado, e que foi objeto de reportagem da Folha de S.Paulo no dia 1° de outubro de 2008. Em outras palavras, Veja teria requentado notícia velha para manter os holofotes sobre Protógenes.


A reportagem, assinada por Expedito Filho, repete a mesma fórmula analisada aqui na semana passada. Está lá, logo no início do segundo parágrafo:




‘O depoimento de Protógenes Queiroz à Procuradoria-Geral da República, ao qual VEJA teve acesso, traz uma segunda revelação incômoda. O delegado afirma que a atuação dos mais de oitenta espiões da Abin no caso era do conhecimento do juiz federal Fausto de Sanctis e do procurador da República Rodrigo de Grandis.’


Ora, se Veja ‘teve acesso’ ao depoimento de Protógenes, de duas uma: ou a revista não acompanha o que aparece nos demais veículos de comunicação sobre o caso, já que pelo menos a Folha ‘teve acesso’ ao mesmíssimo depoimento cinco meses antes, ou o tal ‘acesso’ foi, digamos assim, diferenciado. Neste caso, alguma novidade deveria ter sido incluída na reportagem do semanário da Abril, mas o leitor que tiver a paciência de chegar ao final da matéria não encontrará nada diferente do que já foi publicado na Folha.


Gato por lebre


A rigor, não há nada de reprovável no fato de a revista ter ‘suitado’, como se diz no jargão da profissão, o episódio envolvendo o delegado Protógenes. Na semana anterior, Veja havia dado capa para o caso e era natural que a revista apresentasse uma nova reportagem para manter o assunto em evidência. Havia um gancho ‘natural’ – a prorrogação da CPI dos Grampos – que a revista até cita, meio en passant, nesta semana:




‘Prorrogada por mais sessenta dias, a CPI dos Grampos é o foro próprio para que essas perguntas sejam feitas e respondidas. A comissão quase encerrou seus trabalhos de maneira melancólica há duas semanas. Isso só não ocorreu porque veio à luz parte do conteúdo dos arquivos de computador de Protógenes Queiroz apreendidos pela corregedoria da Polícia Federal. Publicado por VEJA, o material demonstrou que a equipe do delegado espionou ministros do governo, entre eles a poderosa Dilma Rousseff e Mangabeira Unger, senadores, juízes, jornalistas e advogados’, escreve Expedito Filho.


Nenhum problema, portanto, se a revista tivesse montado a matéria a partir deste gancho. Coisa muito feia, porém, é usar informações que já foram publicadas em outros veículos e apresentá-las como fruto de apuração exclusiva, um furo de reportagem. Não era o caso e Veja passou mais um recibo de que sua pauta passa por evidentes critérios políticos. Para manter Protógenes nas cordas, por exemplo, a revista faz qualquer coisa, inclusive vender gato por lebre. O que no fundo só ajuda o delegado a rebater as acusações que lhe são imputadas com a alegação de que Veja não é um veículo informativo, mas um panfleto ideológico.


A seguir, a nota do blog de Fernando Rodrigues sobre o caso.




Protógenes e a recorrente versão sobre quem mandou


A propósito da reportagem de Veja deste fim de semana (aqui, para assinantes). A revista publicou:




‘O delegado Protógenes Queiroz disse ao Ministério Público que a Operação Satiagraha foi uma missão ‘determinada pela Presidência da República’ e que o juiz e o procurador do caso sabiam da participação da ABIN.


Trata-se de referência a um depoimento do delegado da PF em setembro do ano passado ao Ministério Público Federal.


Em sua edição de 1º de outubro de 2008, há pouco mais de cinco meses, a primeira página da Folha de S.Paulo (aqui, para assinantes) trazia uma chamada para uma reportagem cujo teor era o seguinte:




Planalto mandou investigar Dantas, afirma Protógenes


Delegado afastado da Operação Satiagraha depôs ao Ministério Público Federal


Segundo ele, determinação da Presidência teria sido dada a Paulo Lacerda; o ex-diretor-geral da PF nega ter recebido tal ordem


Alan Gripp, da sucursal de Brasília


A investigação que culminou na Operação Satiagraha foi aberta por determinação da Presidência da República ao então diretor-geral da Polícia Federal, Paulo Lacerda, afirmou o delegado Protógenes Queiroz, responsável pelo inquérito, em depoimento ao Ministério Público Federal.


 De acordo com Protógenes, que chefiou os trabalhos até julho deste ano, quando foi afastado por suspeitas de irregularidades na condução do caso, o ponto de partida da investigação foram informes repassados ao Planalto pela Abin (Agência Brasileira de Inteligência). Protógenes não revelou o nome de quem teria dado a ordem.

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Jornalista, autor do blog Entrelinhas – Mídia e Política