Thursday, 25 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Sonho de Ícaro

Esta semana que passou foi um pouco atípica, para não se dizer estranha, na TV brasileira. Os mais impensáveis exitosos produtos televisivos em questão ibope foram a milésima versão de Bety, la Fea, original colombiana de Fernando Gaitán. Esta que já teve desde versão gringa a mexicana. Na terça-feira (4/8) estreou a versão em parceria com a Televisa (mexicana) na Rede Record. Os índices ficaram abaixo do sonhado pela emissora, embora sendo coerente e justo se deva reconhecer que não é simples estrear em mesmo horário que o grande sucesso global e sem sal do momento, Caminho da Índias.

O que se deve entender é que o público brasileiro é muito conservador e prestigia a Rede Globo por osmose. Nada além da Vênus platinada tem o tal selo de qualidade Globo. Embora não veja um produto de qualidade na Rede Globo há mais de duas décadas, exceto por Os Normais. A pasteurização do público mesclada a uma acomodação fenomenal, quase um status quo sócio cultural, faz com que se comprem produtos de terceira linha como de primeira se na poderosa estão sendo vinculados. E o contrário também sucede, ou seja, se está fora da Rede Globo, o bom lhe parecerá feio. Aí entra o problema para Bela, a feia, nome da versão recém-lançada pela emissora da Barra Funda. Adjunto a isto também se deve ver o fiasco que foi a última temporada da saga dos mutantes, que chegou a beirar 6 pontos pífios em suas ‘emoções finais’.

Volúpia e sede de êxito

Mesmo com todo esse histórico sociopático, coisa rara está a passar na mente do povo brasileiro este semana. Por incrível que pareça, a Rede Globo perdeu novamente para o programa religioso da Record. Na última segunda (03/08), o programa Fala que Eu te Escuto marcou uma média de 6 pontos. No mesmo horário, a Globo, que exibiu o Programa do Jô, também marcou a mesma média. Enquanto a Globo exibia uma entrevista com a cantora Elba Ramalho, a Record pegou carona em Bela, a Feia. Esse outro fenômeno mundial que é a nova aposta da emissora e ainda mais em horário nobre que, de acordo com dados preliminares obtidos pelo portal O Planeta TV!, a estréia da novela adaptada por Gisele Joras, no horário das 20h30 às 21h39, marcou uma média de 10 pontos com pico de 13.

O X da questão vem em que TV é hábito e, como sempre, em desesperação as emissoras brasileiras e suas grades voadoras são o maior inimigo da perfeição, digo, da audiência. Este sonho de Ícaro que todas almejam e poucas alcançam. E seguindo essa tradição, após o término do reality A Fazenda, a pobre feia vai mudar de horário.

A competitividade na TV brasileira é algo que hora e meia ressurge como um novo ou velho Davi contra o grande Golias midiático global. Todavia, acabam naufragando em sua própria volúpia e sede de êxito. A Record hoje se estabilizou em um patamar de boas médias com picos de liderança, mas que não passam muito disso, ao contrário de tempos atrás, quando chegava a ter vários programas como líder absoluta de determinados horários.

Uma triste realidade

É eminente que ou a Rede Record terá de voltar a estabilizar sua grade para cativar um público para chamar de seu. Mesmo com produtos como este ‘sucesso mundial’ ou internacional, como queiram, existem outras coisas que fazem o êxito de um produto midiático. Do contrário o que pode ocorrer é um desperdício de dinheiro e nada fluir em resultados. Hoje se pensar que a emissora investe 200mil reais por capítulo de novela é um grande feito e a qualidade hoje de seus produtos são incontestáveis. Mas o erro é velho e conhecido. Em tempos áureos, o SBT também tinha seus pontos de liderança e se perdeu. Hoje o canal paulista é 3° na média mês do PNT e está sofrendo e investindo muito para tentar voltar ao status anterior de segunda rede do país.

Sem embargo, vemos que de um lado a Rede Globo caiu em Ibope bem como em qualidade. De outro, a guerra Record x SBT, essa que parece não ter fim. É como um cego em tiroteio que não sabe de onde vem a bala e menos ainda onde está o inimigo. A Globo segue tentando manter o ranço de seu exitoso histórico de glórias mil, enquanto os nanicos se escalpelam e sonham em um dia ser líder. Essa é a triste realidade da TV aberta brasileira, infelizmente.

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Ator, diretor teatral, cantor, escritor e jornalista