Thursday, 25 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Uma pauta à procura de repórter

Uma pequena nota no noticiário policial dos jornais paulistas poderia inspirar uma pauta interessante para a investigação jornalística.


Informam as edições de sexta-feira (2/7) da Folha de S.Paulo e do Estado de S.Paulo que um motoboy preso na madrugada de quinta-feira teria confessado a participação no assalto à joalheria Tiffany, ocorrido no dia 16 de maio.


Há uma pequena mas significativa diferença entre as duas reportagens, ambas baseadas em relatos da polícia: o Estadão afirma que o suspeito foi o mentor do roubo, enquanto a Folha diz que ele apenas participou.


A pauta em questão não se refere especificamente ao assalto a uma joalheria instalada num shopping center de luxo, mas ao perfil de um grande número de assaltantes que aparecem recentemente nos jornais paulistas.


Dívidas antigas


Uma rápida olhada nos arquivos eletrônicos autoriza a desconfiar – e a desconfiança é a matéria-prima da investigação jornalística – que vem aumentando muito em São Paulo a reincidência em crimes de roubo. Claramente, muitos dos detidos em assaltos e roubos são recém-saídos da prisão, ou detentos que se beneficiavam do sistema de progressão da pena, com liberdade condicional.


Os repórteres mais experientes sabem que há bem pouco tempo era incomum que presos recentemente libertados voltassem ao crime tão imediatamente. O que está para ser investigado é a hipótese de que o crime organizado – que nos presídios paulistas atende pela sigla PCC – esteja forçando alguns detentos a voltarem à delinquência para pagarem dívidas à organização.


Segundo o Estadão, o suspeito de assalto à Tiffany é membro da organização criminosa.


Assunto negligenciado


O sistema penitenciário paulista facilita a concentração do poder do crime organizado, que coordena e financia facilidades para os presos na dura vida da cadeia. Grande parte dos sentenciados vive em prisões distantes de suas cidades de origem. Até mesmo visitas íntimas e viagens de familiares são financiadas pelo PCC.


No final da pena ou na hora de receber o benefício da liberdade condicional, o preso recebe a conta. Então, tem que cometer um assalto para pagar a dívida. Ou arranjar alguém que faça isso por ele.


Essa hipótese ajudaria a explicar o grande número de reincidências imediatas em roubos e crimes correlatos. A grande curiosidade é: por que a imprensa paulista ainda não se interessou pelo assunto?