Friday, 29 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

Veja

MAINARDI vs. LULA
Diogo Mainardi

Rumo ao chavismo

‘Acusei Lula de reintroduzir a censura prévia no Brasil. Eu sei que ninguém mais se incomoda com ele. Eu sei que o antilulismo ficou datado. Mas Lula tem um plano de longo prazo. O risco é termos de aturar o lulismo para sempre.

A censura prévia está sendo reintroduzida por meio da Portaria 264. O artigo 4° determina que os programas de TV, antes de ir ao ar, devem ser vistoriados e autorizados pelo Ministério da Justiça. Mas há algo ainda pior do que isso. Algo que espantosamente parece ter passado despercebido. O artigo 5° da mesma portaria estabelece as bases para a censura dos programas jornalísticos. Trata-se do maior atentado de Lula à liberdade de informação. Se no futuro ele quiser censurar o Jornal Nacional ou o Fantástico, a Portaria 264 lhe dará o instrumento legal.

É melhor ir aos poucos, de frase em frase, para que o AI-5 lulista fique bem caracterizado. O artigo 5° estipula que os programas jornalísticos estão isentos da classificação indicativa. As emissoras de TV não terão de pedir autorização prévia do governo para transmitir seus noticiários, contrariamente ao que acontecerá com os programas de entretenimento. Até aí tudo certo. O autoritarismo do governo só se manifesta mais adiante, no parágrafo 2°, que diz: ‘A não atribuição de classificação indicativa aos programas de que trata este artigo’ – e, repito, o artigo 5° inclui os programas jornalísticos – ‘não isenta o responsável pelos abusos cometidos, cabendo ao Departamento de Justiça e Classificação encaminhar seu parecer aos órgãos competentes’.

O significado desse parágrafo é claro: os telejornais estão livres da classificação indicativa, mas terão de se submeter às mesmas regras censórias dos demais programas. Como nos tempos da ditadura militar, o noticiário será fiscalizado e eventualmente punido pelo governo. Quando se trata de Lula, eu sempre penso o pior. Se os telejornais sofrerem as mesmas restrições dos outros programas, como manda o artigo 5° da Portaria 264, a criminalidade, que todas as pesquisas apontam como o maior problema do país, será devidamente acobertada. Em caso de tiroteio numa favela, o Jornal Nacional só poderá mostrar aquilo que uma criança de 6 anos está apta a ver. Lula quer que a TV apresente uma realidade edulcorada, em que a violência não apareça em toda a sua brutalidade. O ideal lulista é um noticiário infantilizado, para menores de idade. Não podendo impedir o derramamento de sangue causado pelos criminosos, Lula impedirá que a TV mostre todo esse sangue.

O diretor do Departamento de Justiça e Classificação, José Eduardo Romão, é o grande defensor da Portaria 264. Na semana passada, irritado com as emissoras de TV, ele ameaçou ‘mudar o nível’ do ataque do governo. Declarou numa entrevista que, a partir de agora, ‘passará a discutir a questão das concessões de rádio e televisão’. As emissoras, segundo ele, falam ‘como se fossem indivíduos privados titulares de direitos à liberdade de expressão, mas não o são. São titulares de concessões dadas pelo estado brasileiro’. Isso mesmo: o Ministério da Justiça lulista está dizendo que a liberdade de expressão não se aplica às TVs. É um passo seguro rumo ao chavismo.’

TELEVISÃO
Marcelo Marthe

Insomnia é um pesadelo

‘Exibidos respectivamente pela RedeTV! e pela Gazeta, os programas Insomnia e Intrusos representam uma nova forma de caça-níquel na televisão. Diante de um cenário colorido, apresentadores com ares juvenis lançam charadas ao espectador. Por exemplo: quantas vezes a palavra ‘ovelha’ aparece dentro de um círculo. Enquanto os rapazes em cena fazem micagens e suas colegas dão gritinhos estridentes (até recentemente, a ex-apresentadora infantil Jackeline Petkovic fazia parte do primeiro programa), o público é incentivado a ligar para um número de telefone e tomar parte num certo ‘concurso cultural’. Quem acumula mais pontos na gincana ganha o direito de entrar no ar para responder à tal charada – e concorrer a um prêmio que vai de 1.500 a 4.000 reais em barras de ouro. Seria apenas uma bobagem, não fosse um detalhe: toda vez que disca o número do programa, o espectador paga a tarifa salgada de uma ligação interurbana para celular (no caso, para Curitiba). E nem é preciso dizer que se faz de tudo para esticar as chamadas ao máximo. Depois de gastar uns dois minutos respondendo a um cadastro, a pessoa se submete a um sem-número de perguntas boçais. Coisas do tipo: ‘Qual é a cor da grama: rosa, verde ou roxa?’. Como se fosse gozação, uma voz feminina de vez em quando entra na linha para comunicar: ‘Parabéns, você está indo bem. Continue assim’.

Insomnia (transmitido nas madrugadas de segunda a sábado e nas tardes de domingo) e Intrusos (que passa nas noites do fim de semana) são tão parecidos porque vêm da mesma fonte, a Cellcast, representante no Brasil de uma produtora inglesa especializada em atrações interativas de TV. A Cellcast compra horários nas emissoras para exibir esses programas – calcula-se que desembolse cerca de 300 000 reais por mês só pelo espaço na RedeTV!. Apesar de a audiência média não chegar a 1 ponto no ibope, é um negócio lucrativo. Primeiro deles a estrear por aqui, há sete meses, o Insomnia chega a proporcionar a cada mês 1 milhão de minutos em ligações e receita superior a 1 milhão de reais. Boa parte desse dinheiro vai para a operadora de telefonia que, segundo a Cellcast, patrocina o programa, a Brasil Telecom. Além de faturar com as ligações, ela tem ali uma vitrine para divulgar seu prefixo em estados que estão fora de sua cobertura. A Cellcast, claro, também embolsa um belo quinhão.

Ao se auto-intitular ‘concursos culturais’, esses programas conseguiram contornar inicialmente a fiscalização por que passam outras atrações que distribuem prêmios. Mas eles já entraram na mira dos órgãos de defesa do consumidor. Suspeita-se que, apesar de não cobrarem taxas adicionais nas chamadas, esses serviços não diferem em essência do velho 0900 – os telessexos e afins que proliferavam anos atrás e sumiram ao ser enquadrados numa legislação que só permite que se disque para eles com autorização prévia do titular da linha de telefone. ‘Temos indícios de que esses serviços são abusivos’, diz Selma do Amaral, do Procon de São Paulo, que vem investigando esses programas devido às reclamações de consumidores que se surpreenderam com a facada em suas contas no fim do mês.’

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Clique nos links abaixo para acessar os textos do final de semana selecionados para a seção Entre Aspas.

Folha de S. Paulo – 1

Folha de S. Paulo – 2

O Estado de S. Paulo – 1

O Estado de S. Paulo – 2

Agência Carta Maior

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