Thursday, 28 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

“Os Correios não podem ler as nossas cartas”

O deputado Alessandro Molon (PT/RJ), relator do Marco Civil da Internet, explicou nesta quarta, 17, pela manhã, os motivos pelos quais o projeto permite que os provedores de conteúdo guardem os registros de navegação dos usuários, o que não é permitido aos provedores de conexão, ou seja, as teles.

Representantes das operadoras vêm se queixando de um suposto tratamento não isonômico em relação aos provedores de conteúdo. O presidente da Oi, Francisco Valim, em entrevista à TELETIME de outubro, chegou a dizer que de acordo com o projeto “os provedores podem tudo e as teles, nada”.

Molon compara o serviço prestado pelas operadoras com o dos Correios. “É como se disséssemos que os Correios podem ler as nossas cartas”, afirma. Para os provedores de conteúdo a regra é diferente. Para eles é facultada a possibilidade de guardar “o registro de acesso a aplicações da Internet”. O deputado explica que, neste caso, faz parte do negócio dos provedores o acesso a essas informações.

Essas determinações estão contidas nos Artigos 12 e 13 da proposta de Marco Civil. A guarda dos registros de acesso a aplicações deve, entretanto, respeitar o disposto no Artigo 7º, que veda o fornecimento desses registros a terceiros sem o consentimento “livre, expresso e informado” do usuário. Além disso, os dados pessoais somente poderão ser utilizados para as finalidades que determinaram a sua coleta.

Neutralidade

Molon informou que o texto que deve ser votado nesta terça, 13, pelo Plenário da Câmara determina que a regulamentação das exceções à neutralidade de rede deverá ser feita por decreto presidencial, como estava previsto anteriormente, e não pelo Poder Executivo de maneira geral. O deputado não esconde que a mudança aconteceu devido ao que ele qualifica como uma “quebra do acordo” que teria sido feito com o Executivo. “O termo 'Poder Executivo' para mim diz respeito tão somente à administração direta. Isso foi debatido com o governo na terça (dia 6) e na quarta (dia 7), ao meio dia, o ministro (Paulo Bernardo, das Comunicações) manifestou o entendimento de que a regulamentação poderia ser feita pela Anatel”, disse Molon. Segundo o deputado, a Constituição Federal determina que o poder de regulamentar uma lei é do Poder Executivo; à Anatel cabe fiscalizá-la.

O objetivo do deputado é proibir que as teles possam fazer acordos com os provedores de conteúdo para que esses provedores tenham prioridade no tráfego em suas redes. “É fundamental que isso seja vedado por uma lei nacional. Queremos proibir que os provedores de conexão ofereçam aos provedores de conteúdo taxas especiais para que seu conteúdo trafegue de maneira diferente na rede”.

Direitos autorais

Outro ponto polêmico do projeto é a regra para a retirada de conteúdo. Segundo a redação proposta por Molon, os conteúdos sujeitos a direitos autorais devem ser retirados mediante simples notificação, ao contrário dos demais. Molon explica que o objetivo dessa proposta, colocada num Parágrafo 2o ao Artigo 15 de seu substitutivo, foi alinhavado com o Ministério da Cultura. “A ministra Marta (Suplicy, da Cultura) pediu que ficasse claro que esse debate fosse deixado para a reforma na Lei de Direitos Autorais”, diz ele.

Para Molon é necessário que o conteúdo de terceiros possa ser retirado apenas por ordem judicial para preservar a liberdade de expressão e evitar a censura. Para os conteúdos que infrinjam direitos autorais, ele diz que nada muda. Segundo ele, hoje não existe uma regra e os provedores normalmente adotam a prática do “notice and take down”, ou seja, quando notificados, retiram o conteúdo; mas, às vezes, segundo Molon, os provedores aguardam uma decisão judicial. Com a aprovação do Marco Civil, o conteúdo postado por terceiros só poderá ser retirado a partir de uma decisão judicial, com exceção do conteúdo que infrinja direitos autorais; nesse caso, permanece a regra do “notice and take down”.

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Acordo de líderes posterga votação do projeto que regula a Internet para a semana que vem

Não foi desta vez que a Câmara dos Deputados aprovou o Marco Civil da Internet. Um acordo dos líderes partidários com o presidente da Câmara, deputado Marco Maia (PT/RS), retirou a matéra da pauta de votações desta terça-feira, 13. Segundo Maia, o Marco Civil voltará à pauta do Plenário da Câmara na semana que vem, sem especificar o dia. “Alguns líderes ainda têm resistência ao tema neutralidade de rede”, explicou o relator do projeto, Alessandro Molon, a este noticiário. Ele não especificou quais líderes e nem quis dar uma previsão sobre a nova data de votação. Na próxima semana, as atividades em Brasília devem ser reduzidas por conta do dia da Consciência Negra, dia 20, ocasião celebrada com feriado em alguns estados (ainda que Brasília não tenha a data comemorativa)

Mais uma vez foi a discordância em relação ao texto que impossibilitou que o projeto fosse apreciado. O ponto ainda sem consenso é o artigo nono que trata da neutralidade de rede. O projeto foi pautado na reunião da última quarta, 7, mas a votação foi adiada para esta terça, 13. Na ocasião, atendendo a pedidos do governo, Molon retirou a menção ao CGI e inseriu a determinação de que regulamentação das excessões à neutralidade seria feita pelo Poder Executivo.

Declarações do ministro Paulo Bernardo, que entendeu que essa regulamentação poderia ser feita pela Anatel, fizeram o deputado voltar parte do texto original; saiu o CGI mas voltou a regulamentação por decreto presidencial.

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Abert aprova alteração realizada no Marco Civil

Se a mudança realizada pelo relator do Marco Civil, deputado Alessandro Molon (PT/RJ) no Artigo 15 do substitutivo que deve ser votado nesta terça, 13, não agradou a Associação Brasileria dos Provedores de Internet (Abranet), o mesmo não se pode dizer de outra importante associação, a Abert, das empresas de radiodifusão.

Molon acrescentou um Parágrafo 2º no Artigo 15 segundo o qual a retirada de conteúdo que infrinja Direitos Autorais deve ser realizada pelo provedor após notificação do dono desses direitos, sem a necessidade de ordem judicial.

Segundo a Abert, já vigora hoje o sistema conhecido por “notice and take down” no qual a responsabilidade do site é configurada somente após o recebimento de notificação informando da violação de direitos autorais. “Recebida a notificação, deve o site optar entre a retirada do conteúdo e a sua manutenção, somente respondendo pelos danos causados a terceiros neste último caso. Mesmo sem a previsão expressa de tal sistema em lei, foi desta forma que o mercado livremente se organizou – e hoje funciona –, sem interferência estatal de qualquer espécie”, diz a Abert.

Na redação anterior, na visão da associação, o provedor de conteúdo estava isento de responsabilidades mesmo depois de notificados da violação de direito autoral. “Previa o texto alterado que somente depois de receber ordem judicial determinando a retirada do conteúdo pirata o site de postagem responderia pelos prejuízos que causasse. Ao criador que teve a obra pirateada restaria a judicialização do conflito – solução incompatível com a celeridade do mundo virtual e antagônica à tendência mundial de busca de solução de conflitos sem o acionamento do Poder Judiciário, já sobrecarregado”.

A íntegra a carta da associação:

A Internet é uma extraordinária plataforma de distribuição de conteúdos. Sua livre exploração por todos os setores da economia é requisito essencial para que a rede continue a se desenvolver, criando novas oportunidades econômicas e disseminando conhecimento.

São indesejáveis quaisquer mecanismos que representem cerceamento da liberdade de expressão no mundo virtual, bastando que cada um seja responsável pelas consequências de seus atos.

Por isso, a Associação Brasileira das Emissoras de Rádio e Televisão – ABERT vem a público manifestar apoio à recente alteração de redação do projeto de lei conhecido como Marco Civil da Internet, relatado pelo deputado Alessandro Molon.

A redação anterior deste projeto isentava de responsabilidade os sites que permitem a hospedagem de conteúdo pirata, mesmo depois de notificados da violação de direito autoral em seu ambiente. Previa o texto alterado que somente depois de receber ordem judicial determinando a retirada do conteúdo pirata o site de postagem responderia pelos prejuízos que causasse.

Não é necessária análise mais profunda para perceber o absurdo da situação. Sites que lucram elevadas quantias com a postagem de conteúdo, notadamente por meio da veiculação de publicidade (estando alguns deles entre as maiores empresas do mundo), poderiam ignorar solenemente os apelos dos titulares das obras ilegalmente utilizadas, sem responder por isso, como se não lhes dissesse respeito.

Ao criador que teve a obra pirateada restaria a judicialização do conflito – solução incompatível com a celeridade do mundo virtual e antagônica à tendência mundial de busca de solução de conflitos sem o acionamento do Poder Judiciário, já sobrecarregado.

O novo texto em nada ameaça a liberdade de expressão na Internet, até porque mantém a legislação como sempre foi em relação aos direitos autorais.

E é inegável que vivemos em ambiente de absoluta liberdade na rede, no qual é adotado o sistema conhecido internacionalmente como Notice and Take Down, no qual a responsabilidade do site é configurada somente após o recebimento de notificação informando da violação de direitos autorais. Recebida a notificação, deve o site optar entre a retirada do conteúdo e a sua manutenção, somente respondendo pelos danos causados a terceiros neste último caso. Mesmo sem a previsão expressa de tal sistema em lei, foi desta forma que o mercado livremente se organizou – e hoje funciona –, sem interferência estatal de qualquer espécie.

Atualmente, quem tem uma obra utilizada ilegalmente na Internet pode notificar o site de postagem e, caso este não retire o conteúdo de seu ambiente, aí sim estará sujeito a ação judicial, não apenas para a retirada do conteúdo como também para a cobrança de indenização pelos prejuízos já causados pela postagem ilegal, desde a notificação ignorada. Tudo isso se modificaria caso não houvesse a benvinda alteração no texto do Marco Civil, o que representaria um retrocesso altamente nocivo.

A proteção dos direitos autorais é uma garantia de autores, artistas e criadores em geral, mas também de toda a sociedade, que demanda produção cultural de qualidade em grande escala. Não é demais lembrar que a atividade cultural é um dos mais ativos setores de nossa economia, gerando bilhões de reais e milhões de empregos, diretos e indiretos. Liberdade de expressão e direitos autorais convivem harmoniosamente em nossa sociedade desde a promulgação da Constituição de 1988. Não se espera nada de diferente na Internet.

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Em carta aberta, Abranet protesta contra alteração realizada “no apagar das luzes”

A Associação Brasileira de Internet (Abranet) protesta contra a nova redação dada ao Artigo 15 do Marco Civil da Internet. O relator, deputado Alessandro Molon (PT/RJ), incluiu um parágrafo 2º no referido artigo, segundo o qual os conteúdos que infrinjam Direitos de Autor ou conexos não precisam de decisão judicial para serem tirados do ar.

“As modificações no Artigo 15, sugeridas no apagar das luzes, minutos antes da votação do Projeto, impõem aos provedores a retirada de conteúdos após a mera notificação de um terceiro, sob pena de tornar-se responsável por um conteúdo que não produziu”, diz a associação.

Para a Abranet, essa alteração coloca em risco o direito constitucional de livre expressão dos usuários da Internet e “seguramente importará em casos de censura, sendo por essa razão absolutamente inconstitucional e atentatória à liberdade digital”.

A íntegra da carta da associação:

A Associação Brasileira de Internet – Abranet vem a público manifestar sua preocupação com as recentes propostas de alteração do Marco Civil da Internet, que distorcem o projeto inicial e, em última instância, colocam em risco direitos constitucionais de livre expressão dos usuários brasileiros de Internet.

A Abranet entende que a retirada ou alteração do artigo 15 desfigura de maneira indelével o Projeto de Lei do Marco Civil da Internet. Tal dispositivo trata da garantia de que o usuário da Internet não sofrerá remoção indiscriminada de conteúdos postados sem a apreciação pelo Poder Judiciário.

Hoje, provedores de internet são responsáveis pelo conteúdo original que produzem. No caso de conteúdos (textos, vídeos, fotos, etc) publicados por usuários comuns, cabe ao provedor receber eventuais notificações extrajudiciais e remover material nitidamente impróprio. Isso já acontece em casos de pedofilia ou conteúdos cuja propriedade de terceiros é claramente identificada.

Em caso de dúvida, os provedores aguardam e acatam decisão da Justiça. A Abranet entende que não compete ao provedor decidir sobre eventuais celeumas a respeito de todos os milhões de conteúdos veiculados em sua plataforma.

As modificações no artigo 15, sugeridas no apagar das luzes, minutos antes da votação do Projeto, impõem aos provedores a retirada de conteúdos após a mera notificação de um terceiro, sob pena de tornar-se responsável por um conteúdo que não produziu.

É evidente que, pelo temor de assumir ônus financeiro de terceiros, os provedores terão que remover conteúdos em número muito maior do que fazem hoje. E, ainda assim, passam a ser responsáveis por reclamações dos que tiverem seus conteúdos removidos.

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Entidades pedem a Molon que não ceda a lobby da indústria autoral e de telecom

Entidades que defendem a democratização da comunicação e órgãos de defesa do consumidor entregaram na segunda-feira (12/11) uma carta ao relator do Marco Civil da Internet, deputado Alessandro Molon (PT/RJ), em que pedem que ele não ceda aos lobbies da indústria para a alteração do projeto. As entidades se referem ao Artigo 15, que ganhou um parágrafo segundo isentando o conteúdo que infrinja direitos autorais de ordem judicial para ser retirado. E ao Artigo 9º, que trata da neutralidade de rede.

Para as entidades, mesmo sem haver comprovação de que determinado conteúdo (vídeo, foto, música etc.) viola os direitos autorais, uma carta de um suposto titular seria suficiente para que o provedor (site, rede social, portal) o retirasse do ar. Caberia depois ao usuário prejudicado buscar seus direitos na Justiça para reaver seu conteúdo suprimido. “É imprescindível suprimir esse novo parágrafo do Artigo 15. Se a premissa da remoção de conteúdo apenas com ordem judicial não valer para conteúdos de direitos autorais, a decisão vai acontecer em âmbito privado, nas relações entre os provedores e os titulares empresariais, a partir de notificações privadas. Em suma, estaria sendo institucionalizada uma injusta máquina de notificações e censura prévia, que aliás é inconstitucional, e se invalida a regra geral de retirada apenas com o devido processo legal”, afirma o advogado do Idec, Guilherme Varella.

Em relação à neutralidade de rede, as entidades pedem que Molon retorne o texto em que as exceções à neutralidades seriam regulamentadas por decreto, processo em que o CGI seria ouvido. “O instrumento cabível seria um decreto, ouvindo o CGI (Comitê Gestor da Internet), a entidade tecnicamente mais apta a detalhar esse princípio. E era o que previa o texto do Marco Civil até o último texto, do qual o CGI foi excluído, atendendo a um outro lobby das empresas de telecomunicações”, explica o advogado do Idec.

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[Helton Posseti, do Teletime]