Thursday, 25 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Barbosa: Justiça no Brasil é mais rigorosa com pobres e negros

O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Joaquim Barbosa, criticou o excesso de recursos judiciais no Brasil, o tratamento privilegiado que a Justiça dá aos políticos e as chances desiguais que poderosos têm em um processo, em comparação com pobres e negros. Para Barbosa, o Judiciário brasileiro condena muito os desvalidos, mas deixa impunes os mais abastados. Os comentários foram feitos em um debate ocorrido durante um congresso da Unesco sobre liberdade de imprensa em San José, capital da Costa Rica.

– O Brasil, como a maior parte da América Latina, tem problemas culturais para resolver que impactam no Judiciário. Por exemplo, a concepção equivocada de igualdade. As pessoas são tratadas de forma diferente de acordo com seu status, sua cor de pele e o dinheiro que têm. Isso tem um papel enorme no sistema judicial e, especialmente, na impunidade – declarou Barbosa.

Crítica a conversas entre juízes e advogados

Ele também criticou a falta de transparência no processo judicial. Segundo Barbosa, é comum que políticos e advogados influentes conversem reservadamente com os juízes:

– Um dos principais problemas no Brasil é a falta de transparência no processo judicial, algo antiético e forte que existe em todo o sistema. Uma pessoa poderosa pode contratar um advogado poderoso, com conexões no Judiciário. Ele pode ter contatos com juízes sem nenhum controle do Ministério Público ou da sociedade. Depois, vêm as decisões surpreendentes: uma pessoa acusada de cometer crime é deixada em liberdade. E não por argumentos legais, mas por essa falta de transparência das comunicações.

O presidente do STF elogiou decisão recente da Argentina que proíbe contato privado de advogados com juízes sem presença de outras partes interessadas no processo. No STF, Barbosa é o ministro que menos recebe advogados – e, frequentemente, é criticado por isso. Para o ministro, esse tipo de audiência só deveria ser possível quando todas as partes envolvidas na causa estão presentes:

– No Brasil, esse tipo de comportamento é malvisto. Essa é uma boa explicação para a impunidade de alguns tipos de criminalidade, porque o Brasil é um país que pune muito os pobres, os negros e pessoas sem conexões.

Barbosa também atacou o foro privilegiado:

– Há uma razão para a impunidade no nosso país. Se um prefeito é acusado de um crime, ele será julgado por um juiz comum. O caso dele será decidido por um tribunal de apelação. Se o acusado é membro do Congresso, o caso será decidido pela Suprema Corte, que tem 60 mil casos aguardando julgamento, casos que afetam a sociedade, e não tem tempo algum para decidir processos criminais.

Para ele, o excesso de recursos também estimula a impunidade no Brasil:

– Um caso envolvendo duas ou três pessoas não é concluído no Brasil em menos de cinco, sete, às vezes dez anos, dependendo do status social da pessoa.

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Carolina Brígido, enviada especial do Globo a San José (Costa Rica)