Thursday, 28 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

Em defesa da consciência crítica

As manifestações realizadas em junho de 2013 demonstraram que os jovens brasileiros estão longe de serem considerados apáticos, contradizendo a opinião conservadora veiculada pela mídia. A mobilização da sociedade em torno dos problemas enfrentados por todos os brasileiros, que continuou acontecendo após aquelas manifestações, comprovou que a juventude possui real interesse pelo sistema político dominante.

A participação de jovens em associações ou em outros movimentos coletivos suscita uma avaliação mais apurada sobre os caminhos trilhados por eles para a formação de opinião própria sobre política, considerando a influência exercida pelas diferentes mídias ao abordarem as principais propostas e controvérsias da atualidade.

Durante as manifestações, cujo estopim foram a mobilidade urbana e os gastos de recursos públicos efetuados para realização da Copa 2014, a população cobrou dos governantes mudanças de rumos das políticas públicas e exigiu mais saúde, mais educação, o fim da corrupção, o fortalecimento do Ministério Público, ampliação da transparência e do controle social, e democratização das relações entre Estado e sociedade. Ao mesmo tempo ecoaram vozes que cobravam a saída de chefes do poder executivo de vários partidos, julgados pelo calor das ruas como principais responsáveis pelas mazelas do Estado brasileiro.

Os jovens participam. Mas são politizados?

Como entender

Indo além de um debate sobre a orientação política, a questão agora colocada consiste principalmente em procurar entender quais são as modalidades de acesso à informação de todos os jovens brasileiros e como isso contribui para a formação da opinião dos manifestantes e coletivos mobilizados.

Pouco antes de ocorrerem as manifestações, a Secretaria Nacional de Juventude realizou umapesquisasobre os jovens e a participação política. Apurou-se que 46% dos 3.000 jovens de 15 a 29 anos entrevistados já participaram em associações, entidades ou grupos, mas que só 9% consideram-se politicamente participantes. Apesar de 54% dos entrevistados considerem que a política é muito importante, 57% acham que não devem se envolver com política ou se interessar por ela. Essa relação ambígua tem origem na grande desconfiança expressa pelos jovens quanto à política tradicional: os partidos políticos não inspiram credibilidade e a corrupção, com a qual o sistema político está entrelaçado, reduz a legitimidade da democracia representativa. A falta de credibilidade fez com que as manifestações ocorridas reivindicassem para si a característica de apartidárias, mesmo que não apolíticas.

Podemos considerar positivo o fato de que os jovens são capazes de criar novas formas de reunião e de mobilização fora dos canais tradicionais, hoje em dia esgotados. Entretanto, se faz necessário apurar qual é a base informativa que forma a conscientização política e que respalda as reivindicações cidadãs. Numa outra pesquisa, realizada em 2009 pelos institutos Polis e Ibase, foi avaliada a relação de 8.000 jovens brasileiros com a informação. Foi apurado que 85,8% consideravam-se informados sobre os acontecimentos mundiais, sendo a televisão a fonte de informação da maioria. Quando questionados sobre esses presumidos conhecimentos, apenas 30,4% sabiam qual era o significado da sigla ONU (Organizações das Nações Unidas) e 3% conseguiam explicar o que é uma política de quotas.

A falta de acesso à informação qualificada aparenta ser um dos principais problemas da formação à cidadania dos jovens brasileiros.

Em qual medida a informação transforma-se em saber, responsável pela construção da consciência crítica? E como essa conscientização permite que os jovens participem de forma cidadã perante os acontecimentos políticos que os afetam?

O Brasil vive uma grande expectativa para 2014, que se configura como um dos períodos marcante para a história recente: espera-se a retomada das manifestações promovidas pela efervescente mobilização da sociedade que “perdeu a paciência”; é certo o destaque que o país receberá da imprensa mundial em função da realização da Copa do Mundo, em junho, e de suas consequências; e haverá eleições gerais em outubro, quando serão escolhidos o presidente, governadores, senadores, deputados federais e estaduais – escolhas que serão influenciadas pelos eventos precedentes e pelo foco da mídia na cobertura dos fatos.

Os resultados de 2014 podem ser transformadores para a sociedade brasileira. Porém, o fator preponderante está na maneira como os cidadãos vão entender esses acontecimentos e traduzi-los em opinião política.

Fonte principal

Ciente da importância do momento atual, a ONG francesa Internet Sem Fronteiras, que defende desde 2007 a liberdade de expressão online e o desenvolvimento das mídias livres na internet, elaborou seu primeiro projeto no Brasil, em parceria com o Observatório da Imprensa. Trata-se de um projeto de jornalismo cidadão a ser realizado com um grupo de jovens da região metropolitana de Belo Horizonte, que consiste no acompanhamento do panorama político no período de maio a novembro 2014, e que possa contribuir com a construção de uma consciência política crítica e apurada entre os participantes.

O projeto prevê ainda a criação de uma plataforma infográfica de dados em livre acesso sobre a participação política dos jovens e o funcionamento do sistema político brasileiro. A infografia é uma ferramenta potente para apresentar os dados de maneira clara e simplificada, mesmo quando se trata de assuntos complexos. Os dados serão levantados junto ao IBGE e a outros centros de pesquisa, como também junto às ONGs como a Transparência Brasil e similares.

Ao possibilitar uma análise crítica da atualidade política brasileira, incentivando a produção de artigos sobre como esses acontecimentos afetam suas realidades, a plataforma a ser construída tem o intuito de estimular a consciência política dos jovens, valendo-se de ferramentas e espaços bem conhecidos e explorados por eles (internet, redes sociais etc.).

A pesquisa citada sobre os jovens e a informação, promovida pelos institutos Polis e Ibase, mostra que os jovens que sabem explicar os conceitos veiculados pela mídia não foram esclarecidos assistindo televisão. A principal fonte de informação para o esclarecimento foi a internet. Os movimentos sociais de junho de 2013 demonstraram a importância das redes sociais na organização da mobilização e no fortalecimento do sentimento de cidadania. Esse é o caminho que a Internet Sem Fronteiras se propõe de seguir, ampliando o acesso e amplificando a informação livre e crítica, fundamento básico para a formação do cidadão consciente e moralmente ativo.

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Florence Poznanski, diretora do setor Brasil da ONG francesa Internet Sans Frontières. cientista politica. pode por meu email para contato também : florence@internetsansfrontieres.org

Nemer Sanches de Souza: contador especialista em Controladoria e Finanças, Especialista em Educação Fiscal e Cidadania, em BH.