Thursday, 18 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1283

Medo de perder do governo pode ter sido uma boa para o Brasil

Minimizar os riscos. Esta é uma das poucas conclusões possíveis diante da decisão do governo federal de pedir a retirada do projeto que trata do Marco Civil da Internet da pauta da Câmara dos Deputados, acatada na tarde desta quarta-feira (12) pelo presidente da Casa, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN). Passados quase sete anos da formulação da proposta, não será nesta semana que o funcionamento da rede será regulamentado. Não parece uma má ideia, diante do fato de uma questão de cunho técnico estar sendo um dos alvos de disputa política na crise entre PT e PMDB. A neutralidade da rede poderia ser comprometida.

O pedido para a retirada do projeto partiu dos ministros da Justiça, José Eduardo Cardozo, e da Casa Civil, Aloísio Mercadante. A promessa de ambos – representando a presidente Dilma Rousseff no encontro com Alves – é de que eles precisam de mais tempo (uma semana, de acordo com o presidente da Câmara) para negociar a aprovação da proposta. A posição foi decidida principalmente em razão da tensa disputa entre petistas e peemedebistas, que se arrasta há semanas.

O líder do PMDB na Câmara, Eduardo Cunha (RJ), principal liderança do chamado “blocão” – formado por seis legendas da base aliada (PMDB, PP, Pros, PR, PTB, PSC) e por uma da oposição, Solidariedade (SDD) –, já avisava, na noite de terça-feira (11), que os peemedebistas gostariam de votar o Marco Civil da Internet, mas para “para derrotar” o projeto. Sem clima político e correndo o risco de mais uma derrota entre uma série que acompanha o governo na Câmara nesta semana, o governo federal preferiu não arriscar e pediu a retirada a Alves, que é quem dá a última palavra sobre a pauta.

A versão do Marco Civil que seria votada pela Câmara foi apresentada pelo deputado federal Alessandro Molon (PT-RJ), relator do projeto. O parlamentar tentou passar a ideia, em entrevista ao Brasil Post, que a polêmica em torno do tema não era de ordem política. “Esse é um projeto que divide o Congresso entre os que estão do lado dos internautas e aqueles que olham o problema pela ótica dos investimentos do setor, pelos que atuam empresarialmente no setor de internet”.

Interesses próprios

A importância do Marco Civil da Internet para o País não é nem um pouco desprezível, tanto que é chamado informalmente de “Constituição” da internet brasileira. Desse projeto sairá a forma com que os serviços na rede serão utilizados, tão logo a matéria seja votada no Congresso Nacional e sancionada pela Presidência, seja lá quando for. A meta dele, como garante o seu relator, é manter a neutralidade da internet, para que continuemos acessando qualquer tipo conteúdo online com a mesma velocidade e pelo mesmo preço. Contudo, em um ambiente conturbado politicamente, um tema de tamanha complexidade técnica não deveria ser votado sob um regime de urgência constitucional, como é o caso.

Para os trabalhos dos deputados, a retirada do projeto pelo governo federal significa um a menos a contribuir para o trancamento dos trabalhos de votação no Plenário, que não podem prosseguir enquanto proposições em caráter de urgência constitucional com prazos vencidos sejam votadas. A votação do Marco Civil era apenas a primeira da fila. Em declarações reproduzidas pelo Uol, o presidente da Câmara garante que o Marco Civil voltará para a pauta dentro de uma semana, salvo algum novo pedido do governo federal, que pode ainda retirar a urgência do projeto se quiser, possivelmente colocando uma pá de cal sobre o tema, pelo menos antes das eleições de outubro.

Para os brasileiros, o debate sobre o futuro da internet no País continua sem uma definição, em meio aos muitos interesses que envolvem o projeto. Como já havia alertado, em entrevista ao Brasil Post, o advogado e professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), Ronaldo Lemos. “Chegou a hora de o Congresso mostrar a cara e fazer o seu trabalho, assumir o risco político, seja ele qual for”, disse.
Parece que o governo e os deputados pensam diferente, ao priorizar os próprios interesses políticos ante a uma importante demanda da sociedade brasileira. Todavia, se for para mexer mal e “colocando a carroça na frente dos bois”, como diria o ditado popular, melhor manter tudo como está.

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Thiago de Araújo, do Brasil Post