Friday, 29 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

Neutralidade polêmica

O evento NETmundial reuniu representantes de mais de 90 países, na semana passada em São Paulo, para discutir o futuro da internet. Mas o debate sobre a neutralidade da rede – conceito pelo qual todo conteúdo deve receber tratamento igualitário dos provedores – ficou para uma próxima. Ele aparece no relatório final do encontro sob a rubrica “pontos para discussões posteriores”.

Mas, afinal, para que serve isso? A neutralidade de rede impede que o provedor dê tratamento especial a determinado serviço. Por exemplo, ele não pode lançar o próprio serviço de vídeo sob demanda e deteriorar a qualidade dos concorrentes. Uma empresa de celular não pode bloquear o aplicativo de mensagens para beneficiar o próprio serviço de mensagens de texto. Também não pode cobrar de uma empresa de internet para melhorar a qualidade do sinal da empresa na rede.

De modo geral, é assim que funciona. Mas, nos detalhes, a neutralidade varia muito de país para país. O Brasil incluiu a defesa da neutralidade no Marco Civil da Internet, lei aprovada na semana passada pelo Senado e sancionada pela presidente Dilma Rousseff durante o evento NETmundial, e a delegação brasileira defendeu a inclusão do conceito no documento final.

Outros países, como os Estados Unidos, foram contra. A neutralidade de rede passa por uma revisão nos EUA, e o regulamento em estudo, que deve ser divulgado para consulta pública no dia 15 de maio, pode, na prática, matar esse conceito por lá.

Processo de regulamentação

Em janeiro, a Justiça derrubou o regulamento anterior, dizendo que a internet não é considerada um serviço público nos EUA e, por isso, a Federal Communications Commission (FCC), regulador das comunicações no país, não poderia impor esse tipo de regra.

Na semana passada, a FCC anunciou um novo regulamento, que segue as linhas gerais da decisão judicial. Pelas novas regras, os provedores poderão cobrar das empresas de conteúdo para oferecer vias rápidas em suas redes, desde que haja transparência (com divulgação dos benefícios oferecidos) e os acordos sejam feitos de “maneira razoável comercialmente”. O bloqueio de conteúdos não será permitido.

A FCC garante que essas condições são suficientes para permitir a competição, mas, antes mesmo de ser divulgada em sua totalidade, a proposta já vem recebendo críticas. A principal preocupação é que grandes atores como YouTube e Netflix consigam pagar essas taxas, mas empresas menores, que estão surgindo agora, fiquem de fora, o que as impediria de atrair usuários.

No Brasil, a princípio, o Marco Civil impede esse tipo de acordo. Mas a lei aprovada na semana passada [retrasada] ainda precisa ser regulamentada, e as regras que estão sendo propostas nos EUA mostram que alguns detalhes podem mudar todo o cenário.

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Renato Cruz é colunista do Estado de S.Paulo