Friday, 19 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

A unanimidade reacionária

Chama a atenção a resistência das empresas de mídia contra o decreto que institui o Programa Nacional de Direitos Humanos, anunciado em dezembro mas que só agora, passadas as festas de fim de ano, avaliado em detalhes pelos veículos jornalísticos. Nos detalhes que interessam aos seus pressupostos ideológicos, é claro.


Se o sábio jornalista e dramaturgo Nelson Rodrigues pregava que toda unanimidade é burra, no discurso praticamente unânime contra o decreto destaca-se a posição do Grupo Bandeirantes de rádio e televisão, que abriu suas baterias editoriais num autêntico fogo de barragem contra a iniciativa governamental, sem qualquer espaço para o contraditório.


De que tanto reclamam os veículos? Na sexta-feira (8/1), nota conjunta das três maiores entidades patronais da comunicação – Abert, Aner e ANJ – protestou contra a suposta ‘criação de uma comissão governamental que fará o acompanhamento da produção editorial das empresas de comunicação e estabelecerá um ranking dessas empresas, no que se refere ao tema dos direitos humanos’.


Razões de sobra


O diabo não é tão feio quanto parece. Os críticos da iniciativa se esquecem de informar que o texto é, por enquanto, apenas um indicativo cujo trâmite ainda prevê discussão e aprovação no âmbito do Congresso Nacional. E o que propõe o decreto? Propõe o seguinte: ‘Elaborar critérios de acompanhamento editorial a fim de criar um ranking nacional de veículos de comunicação comprometidos com os princípios de Direitos Humanos, assim como os que cometem violações’. E, mais adiante: ‘Recomenda-se (…) fomentar a criação (…) de Observatórios Sociais destinados a acompanhar a cobertura da mídia em Direitos Humanos’.


É o que fazem, em última análise, os monitoramentos que alimentam pesquisas realizadas por entidades como a Andi, o Intervozes e mesmo este Observatório, ou a campanha ‘Quem Financia a Baixaria é Contra a Cidadania’.


De mais a mais, o texto do decreto coloca em relevo as obrigações constitucionais dos veículos de radiodifusão – que não são, por óbvio, propriedade exclusiva de seus controladores, mas concessões públicas cujo usufruto exige contrapartidas previstas em lei.


Ocorre que o patronato da mídia não suporta ser fiscalizado e muito menos admite submeter-se a algum tipo de regulação, qualquer regulação. Vêm daí as razões do esperneio.