Friday, 26 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Empresário de TV é preso e mídia silencia

Em 7 de maio de 2003 escrevi neste OI: ‘As autoridades públicas só exercem seu poder de fiscalização nos principais estados brasileiros. Imaginem se no Rio de Janeiro, em São Paulo ou Minas Gerais um só empresário fosse dono das emissoras SBT, Record e Bandeirantes. Com certeza o mundo viria abaixo. O Ministério das Comunicações e a Anatel coibiriam o abuso com todo o rigor.’ [ver remissão abaixo]. Era o que acontecia no Amapá, e em 2006 constatamos que pouca coisa mudou nesse Brasil remoto, muito pelo contrário, os absurdos se alastram. Agora, por aquelas bandas distantes, a moda é, em nome da lei eleitoral, censurar veículos de comunicação. Os exemplos mais recentes foram as decisões judiciais contra a Folha do Amapá e o Correio do Estado, de Mato Grosso do Sul.

Em ambos os casos, a justiça eleitoral atendeu a pedidos emanados de políticos, que tentam esconder do distinto público suas mazelas. Infelizmente, isso tudo continua a prosperar, e uma das causas é a falta de repercussão na chamada ‘grande imprensa’. Assim como em maio de 2003, quando denunciamos que três emissoras de televisão de Macapá eram de propriedade de um só empresário, os casos recentes de censura à imprensa no Norte e no Centro-Oeste do país também não mereceram o destaque devido na mídia nacional.

No dia 31/5, em Macapá, recebeu cobertura pífia da ‘grande imprensa’ a Operação Alecto, da Polícia Federal, que prendeu o delegado regional da Receita Federal Manoel Feitosa e o empresário de mídia José Alcolumbre, personagem do artigo citado acima:

Em Macapá, o empresário José Alcolumbre é o feliz proprietário da TV Marco Zero, que retransmite a Rede Record; da TV Amazônia, que transmite a programação do SBT; da TV Bandeirantes e, ainda, de outra emissora, que retransmite a Rede Mulher. Além disso, Alcolumbre tem 13 emissoras de rádio, a maioria comunitária, instaladas nos 12 municípios do Amapá. Graças a essa força, o empresário se dedica ao passatempo de eleger representantes no Legislativo do estado e exerce brutalmente o poder de excluir profissionais de imprensa do mercado, pois um único departamento de telejornalismo atende a todas as emissoras. Um verdadeiro samba do crioulo doido, pois uma mesma matéria, realizada por um mesmo repórter, vai ao ar em todas as emissoras abertas de televisão do grupo José Alcolumbre.

Dano ao erário

Ao contrário das espetaculosas operações da Polícia Federal nos grandes centros do país, que merecem cobertura total da ‘grande imprensa’, a Alecto foi quase omitida, inclusive pela Rede Globo, parceira de sempre das operações da PF. Por incrível que possa parecer, até a Divisão de Comunicação Social da PF precisou de 24 horas para inserir no site uma econômica nota sobre a operação Alecto, no dia 1º de junho:

MACAPÁ / AP – Policiais federais, sob a coordenação da Delegacia de Combate aos Crimes Fazendários, deflagraram, na manhã desta quarta-feira, 31, a operação Alecto.

Foram presas cinco pessoas, incluindo um delegado da Receita Federal, sob acusação de corrupção ativa e passiva e tráfico de influência e advocacia administrativa. Também foram cumpridos oito mandados de busca e apreensão. Participaram 42 policiais federais.

A investigação segue analisando a escrituração das empresas envolvidas e os sistemas operados pela Receita Federal. O objetivo é apurar a extensão do dano causado ao erário público, bem como outros delitos contra a ordem tributária. Por: Divisão de Comunicação Social, com informações da Superintendência da PF no Amapá.

Muito intrigante

Em 2003 encerrei o artigo com o seguinte parágrafo;

Este tipo de aberração que acontece no Amapá é fruto perverso da grande e perniciosa árvore das desigualdades regionais brasileiras. Desigualdades que só serão resolvidas quando nossas autoridades federais entenderem que o país é um só, do Oiapoque ao Chuí, guardadas as raízes culturais.

Agora, devemos estender o alerta à ‘grande imprensa’ que, em nome da economia de custos, reduziu drasticamente a sua cobertura nacional, com o fechamento de todas as sucursais que existiam até fins dos anos 80. O mais estranho é que as redes de televisão, principalmente a Rede Globo, com emissoras afiliadas em todos os quadrantes do país, continuem privilegiando o noticiário gerado nos grandes centros do país, em detrimento de uma cobertura nacional.

No caso específico da Operação Alecto, é muito intrigante a omissão da imprensa brasileira. Terá sido por corporativismo ou por solicitação de algum político? Pois para alguém ter três emissoras de televisão numa mesma cidade só com muito respaldo político, haja vista que as concessões são aprovadas pelo Congresso Nacional.

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Jornalista