Monday, 18 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1279

Falta melhor apuração em São Paulo

Como já era prometido desde o final de 2007, o ano letivo em São Paulo começa com muitas novidades na rede estadual. Entretanto, os jornais ainda não deram conta de acompanhar e noticiar suas propostas e possíveis conseqüências. O pacote de mudanças é anunciado aos poucos pela Secretaria Estadual de Educação e implementado por meio de decretos, o que dificulta o trabalho dos jornalistas e o acompanhamento das políticas por parte dos cidadãos.

No dia 11 de fevereiro, o Estado de S. Paulo informou, em uma pequena matéria, mudanças na carreira dos servidores do Quadro de Apoio Escolar, por meio de um decreto do governador. A medida foi considerada importante pela Secretaria de Educação, mas não fica claro como está sendo pensada no conjunto de mudanças propostas e que impacto se espera que tenha na qualidade da educação.

Dois dias depois, a Folha de S.Paulo anunciou, com destaque, que já haviam sido definidos os critérios para a concessão de bônus a professores, diretores e funcionários de escolas estaduais cujos alunos melhorassem o desempenho em avaliações. ‘Esse indicador de desempenho dos alunos será aliado às taxas de repetência e evasão das escolas, para definição do bônus. Juntos, representarão 70% da avaliação das unidades. Nos demais 30%, serão considerados as ausências dos servidores e indicadores de gestão.’ Mesmo sem ter explicado em detalhes como funcionará esse pagamento, o jornal, em editorial, elogiou a iniciativa.

‘Experiências e pesquisas’

A entrega de apostilas aos professores com o objetivo de uniformizar as aulas é o assunto da matéria do Estado de S. Paulo no dia 18 de fevereiro. O uso do ‘jornal do aluno’ e a ‘revista do professor’ até o final de março – em aulas de reforço de português e matemática na rede estadual – é mais uma proposta da Secretaria Estadual de Educação. O assunto passa quase em brancas nuvens nos outros jornais.

Na mesma semana, a revista Veja entrevista Maria Helena Guimarães de Castro, secretária estadual de Educação de São Paulo, e a premiação de professores segundo o ‘mérito’ é o tema principal. Mais uma vez, faltam informações sobre como funcionará na prática esse sistema e sobram críticas a professores – divididos entre ‘talentosos e esforçados’ e ‘massa de profissionais numa zona de mediocridade’ – e a universidades públicas de Pedagogia, ‘que num mundo ideal deveriam ser fechadas’. A secretária desqualificou as críticas à premiação de professores e justificou a adoção das medidas citando ‘experiências internacionais’ e pesquisas já feitas. Entretanto, nenhuma reportagem ou editorial investigou essas experiências e pesquisas e se, de fato, podem ser aplicadas à realidade educacional brasileira.

Show de repetência

O plano da SEE tem ainda inúmeras outras ações que não foram divulgadas pela imprensa. Ensino médio e profissionalização de jovens, por exemplo, são temas que poderiam gerar pautas importantes. Também a mídia não explorou as críticas da SEE ao papel das universidades na formação inicial dos professores e desenvolvimento de pesquisas que contribuam para a melhoria da qualidade do ensino básico. Faltou o posicionamento das universidades sobre seu papel frente à educação básica e também ficamos sem saber se existem mecanismos de interlocução entre SEE e universidades na formulação de políticas públicas.

Tendo em vista a capacidade indutora do estado de São Paulo nas políticas educacionais, fica a recomendação de que este plano seja pauta de reportagens e artigos de opinião, envolvendo diferentes atores, com posturas diferenciadas.

Ao mesmo tempo em que a Secretaria estadual tornava públicas as mudanças para 2008, os jornais paulistas denunciavam problemas em escolas das redes municipal e estadual. Agora SP (10/02), em editorial, afirmou que ‘prefeitura e governo estadual dão um show de repetência’ porque todos os anos as escolas estão descuidadas e os alunos começam o ano letivo sem uniforme.

Como buscar o caminho

O Jornal da Tarde e o Estado de S. Paulo lembraram que, apesar das promessas, ainda havia salas de aula improvisadas, feitas de lata ou de madeira, nas redes municipal e estadual. O assunto continuou na pauta por vários dias, o que permitiu ouvir a opinião de especialistas técnicos e educacionais sobre os efeitos da situação no desempenho dos alunos e descobrir que 39 escolas estaduais receberam apenas ‘cimento e tinta para esconder’ que são feitas de lata. O Diário de S. Paulo (12 e 13/02) noticiou com destaque o atraso no funcionamento de novos CEUs (Centros de Ensino Unificado) e a decepção de alunos da rede municipal que não puderam iniciar o ano letivo. Na semana seguinte, foi a vez de denunciar que as bibliotecas estavam fechadas por falta de funcionários.

Algumas dessas reportagens recorreram a comentários e análises de fontes no sistema de justiça. Entretanto, essa ainda não é a regra geral e os textos poderiam informar melhor a população sobre como buscar esse caminho no caso de falta de vagas, de transporte escolar, de bibliotecas e outras violações do direito à educação.

A lógica do mercado

Em Santa Catarina, A Notícia (08/02) anunciou a contratação de 500 professores, auxiliares administrativos e cozinheiras em substituição aos trabalhadores temporários pela prefeitura de Joinville. No entanto, a matéria não explica se haverá uma redução no número de funcionários nas escolas ou se continuarão a existir trabalhadores temporários, que somavam 600 pessoas.

A contratação de professores também é tema de reportagens no Correio Braziliense (9/02 e 10/02). Mas lá, o governo do Distrito Federal abriu vagas para professores temporários. O jornal preferiu destacar que a decisão representará economia de R$ 84 milhões ao ano – já que o pagamento será feito por hora/aula, e não com base no salário dos professores efetivos – a investigar efeitos da incorporação de 3 mil professores com regras de contratação e salários distintos aos do quadro efetivo. Também nada se falou sobre os efeitos da precarização da função docente sobre a qualidade da educação – prevaleceu a lógica da economia, portanto, do mercado.

A Tribuna do Brasil (15/02) constatou que, apesar da contratação anunciada, algumas escolas iniciaram o ano letivo sem o corpo docente completo. O Jornal do Brasil (09/02) não citou a contratação de professores temporários, e sim, a discussão do governo com o Ministério Público sobre a substituição de merendeiras por empresas terceirizadas.

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Da equipe do Ação Educativa