Thursday, 18 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1283

Manuel Pinto

‘Os títulos, sempre os títulos e o seu rigor. Parece ser um daqueles lugares que um provedor não pode deixar de visitar repetidas vezes. Desta vez, o motivo é uma matéria que vinha na edição do ‘Jornal de Notícias’ de 20 de Novembro, intitulada ‘Envolvidos negam ter pretendido afastar PGR’. É uma daquelas notícias desencadeadas por outra notícia, em jeito de repercussão e desenvolvimento, como se fosse a réplica de um pequeno sismo. De facto, no ‘Expresso’ da véspera, havia feito furor a revelação do alegado teor de escutas telefónicas realizadas no âmbito do caso ‘Portucale’, de acordo com as quais o primeiro-ministro José Sócrates teria proposto ao presidente da República a substituição do procurador-geral da República, Souto Moura.

Pode discutir-se acerca de como um jornal divulga conteúdos deste melindre, sujeitos a segredo de justiça, mas é indubitável que a matéria (que não cabe neste espaço escalpelizar) reveste interesse público. Uma notícia deste tipo torna-se ela própria matéria de notícia noutros meios de comunicação. Por boas e por más razões, isso acontece com alguma frequência ao fim de semana, com a saída do ‘Expresso’. Muitas vezes os restantes meios de comunicação social limitam-se a amplificar o que outro divulgou. Mas, tanto por iniciativa dos protagonistas dos factos divulgados como em resultado da iniciativa dos media, o caso pode rapidamente conhecer desenvolvimentos, através de comentários, revelações e, consequentemente, novas notícias.

Foi também isso que se passou, no caso destas escutas. Os media aproveitaram o facto de, em Évora, estar, nesse dia a decorrer a Cimeira Luso-Espanhola, e interrogaram José Sócrates sobre a matéria, na conferência de Imprensa convocada para apresentar os resultados. A Procuradoria-Geral da República, por sua vez, emitiu um comunicado a condenar a violação do segredo de justiça e a exigir do Governo ‘com a maior brevidade, reformas legislativas que ponham cobro a tal situação’. A agência Lusa distribuiu ainda, nesse mesmo dia, serviços com outros depoimentos sobre o caso divulgado pelo ‘Expresso’. Com base nestes desenvolvimentos é que o JN redigiu a sua peça.

O leitor Américo Sousa leu o título e leu o corpo do artigo e não se conformou com o que leu. No seu blogue ‘Retórica e Persuasão’ (www.retorica-pt.blogspot.com) escreveu, a 22 daquele mês, uma nota na qual considera que a peça do ‘Jornal de Notícias traz um ‘título enganoso’. Observa, em primeiro lugar, que, na notícia do ‘Expresso’, ‘os envolvidos foram todos nomeados e eram nada menos do que sete’, ao passo que o trabalho do JN ‘foi elaborado com base nas declarações de apenas quatro individualidades’, duas das quais ‘nada tiveram que ver com o assunto’.

De onde o primeiro reparo a este Jornal ‘Como pôde então o JN passar para grande título a afirmação de que ‘os envolvidos negam ter pretendido afastar PGR’ se dispunha apenas das declarações de dois deles?’

O leitor vai mais longe e faz notar que, das duas personalidades que se pronunciam e que a notícia do ‘Expresso’ efectivamente envolve no caso, apenas uma, José Sócrates, desmente a pretensão de afastar Souto Moura. Também por este lado o título deste Jornal não teria sido feliz.

A jornalista autora da peça esclareceu, num depoimento solicitado pelo provedor do leitor, que o texto da notícia do JN ‘não tem qualquer incorrecção, isto é, tudo o que é dito corresponde à verdade dos factos, sem abusos ou ilações falsas’. Já quanto ao título, reconhece, com humildade, que ele ‘não é feliz e não espelha a notícia’. ‘O correcto seria, de facto, afirmar que Sócrates negou ter proposto a substituição do PGR’, acrescenta.

Quando as deficiências são assim assumidas, de forma frontal e transparente, não resta senão esperar que o reconhecimento seja factor preventivo deste tipo de situações no futuro. Porque toda a gente erra, especialmente quando não dispõe do tempo necessário à reapreciação mais distanciada de um assunto.

Importa, entretanto, esclarecer um ponto que, sendo menor no contexto da crítica feita, não deixa de ser relevante. Ao contrário do que refere o leitor, o JN não coloca em título que ‘os envolvidos negam ter pretendido afastar PGR’, mas, antes e apenas, ‘envolvidos’. Ao subtrair o artigo definido, este Jornal – na linha, de resto, de uma técnica muito usual na titulação – indica que ‘há envolvidos que negam’. Não necessariamente ‘todos os envolvidos’, que o tal artigo introduzido pelo leitor implicaria.

O que é certo é que os títulos são o chamariz e a porta de acesso às notícias. Cabe-lhes um papel hoje em dia cada vez mais difícil (e nem por isso menos fundamental) levar-nos a ler, esperando que, ao entrar na matéria, não venhamos a descobrir que nos estão a dar gato por lebre. Daí que toda a atenção dos jornalistas e editores seja pouca. Daí que todas as observações e críticas dos leitores sejam imprescindíveis. É também com ela que se faz um bom jornal.

Caderno de reclamações

À caixa de correio do provedor do leitor chegam regularmente mensagens de diversa natureza. Umas criticam o que se publica (cf. a peça principal desta página); outras apontam erros de escrita, gralhas ou imprecisões; outras, ainda, manifestam discordância acerca das opiniões dos colunistas.

Gostaria de dar conta de várias das mensagens recebidas, sendo que em todas elas há reparos sobre situações e casos surgidos no JN. Daí que em todas elas pode o Jornal encontrar estímulo para fazer um trabalho de melhor qualidade.

Manuel Silva Lopes, do Porto, comenta a notícia da secção de Cultura do passado dia 12, intitulada ‘L miu purmeiro lhibro an Mirandés’ (o meu primeiro livro em mirandês), para informar ‘Eu sei que já lá vão uns anos, mas já foi publicado outro livro em mirandês e com abrangência nacional. Sugiro que, entre as obras teatrais de Alfredo Cortez, encontrem aquela que em mirandês foi escrita e publicada, a nível nacional, como todas mais de vinte obras que publicou. A Sociedade Portuguesa de Autores poderá dar uma ajuda nesse campo. Alfredo Cortez, para o efeito, residiu em Miranda o tempo que entendeu necessário para uma correcta apreensão do mirandês e sua cultura’.

Por sua vez, César Augusto Bastos Santos, de S. João da Madeira, escreve ao provedor, via correio electrónico, chamando a atenção para a informação da grelha das cotações diárias da Bolsa, que considera ser ‘um trabalho confrangedor’. ‘Erros sistemáticos e constantes, ininterruptamente, há meses. Aguardei meses para que algo fosse modificado, na esperança que alguém, um dia, pusesse cobro a tanto disparate. Em vão. Mesmo que a causa, eventualmente, possa ser, de algum modo, da responsabilidade da Bolsa na sua transmissão para o JN, não se concebe que não haja filtros na Redacção, que atente e rectifique tanto erro’.

Num registo bem humorado, Alfredo de Sousa Tomás, de Perafita (Matosinhos) enviou a seguinte ‘mail’ ‘Chamou a minha atenção o título de uma notícia na primeira página do JN de hoje, sobre a abertura de uma discoteca num kartódromo em Espinho. Para ler a notícia fui remetido para a página 60 do jornal. Como o JN de hoje só tem 56 páginas, concluo que faltam 4 páginas. Assim, considerando que paguei 70 cêntimos pelo que deveriam ser 60 páginas, dá 1,17 cêntimos por página. Como faltam 4 páginas, a 1,7 cêntimos cada, considero-me credor de 4,68 cêntimos. No entanto, se no jornal de amanhã não encontrar nenhuma gralha ou erro ortográfico, considerarei saldada a ‘dívida’.’