Friday, 26 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Movimento Negro entrega documento à Globo

Aproveitando o artigo ‘Racismo no horário nobre’, do colega Paulo Rafael [veja remissão abaixo], gostaria de encaminhar o texto a seguir, de autoria do Fórum Permanente de Mulheres Negras Cristãs do Estado do Rio de Janeiro, que se insere na luta do Movimento Negro pela igualdade racial no Brasil. Outras ações semelhantes virão, acionando outros veículos de comunicação.

O Fórum Permanente de Mulheres Negras Cristãs do Estado do Rio de Janeiro (FPMNC-RJ) é uma organização do movimento social que tem por missão apoiar mulheres a assumirem seus direitos e seus novos papéis sociais. Nosso trabalho consiste no combate sistemático ao racismo e ao sexismo.

O FPMNC-RJ esteve reunido em 1º de abril de 2004 na sede da Central Globo de Produção (Projac, Jacarepaguá, Zona Oeste do Rio) com o diretor da Central Globo de Comunicação, Luis Erlanger, que nos convidou para conversar a respeito de nossas críticas à telenovela Da cor do pecado. A importância desta visita está no começo de um diálogo direto com o interlocutor responsável, na Rede Globo de Televisão, pelo relacionamento com a sociedade civil, sendo ela representada por grupos ou indivíduos.

O documento, com as reflexões que se seguem, foi entregue em mãos ao Sr. Erlanger:

** produção de material didático com linguagem inclusiva, resgatando de modo positivo as imagens femininas, assim como a comunidade negra (pretos + pardos, seguindo o critério oficial do IBGE);

** coibir em toda manifestação literária (incluindo a teledramaturgia) o uso de termos lingüísticos ou gravuras que insinuem, estimulem ou reforcem estereótipos negativos em relação à mulher, à comunidade negra e a outras minorias;

** reconhecimento de que a escravidão promoveu desvantagens sociais e históricas à comunidade negra e que também contribuíram para a exclusão social (e suas seqüelas) e as disparidades econômicas que reforçam o racismo;

** denunciar e conter ações que promovam, sob qualquer pretexto, a desigualdade, a discriminação de mulheres negras e outras minorias;

** combater a demonização das culturas negras por meio de eventos;

** promoção de políticas de reparações e ações afirmativas visando a comunidade negra no Brasil.

Acrescentamos sugestões a respeito da citada telenovela, bem como considerações gerais relacionadas à produção e aos produtores de entretenimento e jornalismo da Rede Globo:

** capacitação dos profissionais das Organizações Globo que lidam com obras de ficção e material jornalístico, adequando esta prática ao que propõe o Plano de Ação Durban (3ª Conferência contra o Racismo, realizada na África do Sul em 2001) [ver abaixo];

** maior compreensão sobre as culturas negras a partir de seu referencial histórico até os dias atuais, atentando para a não-folclorização destas mesmas culturas;

** maior valorização (mormente em quantidade de pessoas e na qualidade do personagem da obra de ficção) do artista e do técnico afro-brasileiro no mercado de trabalho, especialmente o representado pela mídia eletrônica;

** substituir na abertura da telenovela Da cor do pecado o uso da versão cantada, ficando apenas a melodia, devido ao reforço de caráter discriminatório que a letra desta obra traz;

** a personagem Bárbara deve sofrer o quanto antes possível, do ponto de vista legal, as conseqüências pelas ofensas verbais de teor racista praticadas contra a personagem Preta, lembrando que a prática de racismo é crime no Brasil desde que foi sancionada a chamada Lei Caó (Lei 7.716, federal, de 5 de janeiro de 1989);

** produção de um Globo Repórter sobre reparações e ações afirmativas, observando que estas não se referem exclusivamente a cotas, mas a um conjunto de medidas e ações que visam promover a chamada ‘discriminação positiva’ para a comunidade negra e seus descendentes em todas as áreas sociais no Brasil.

Também destacamos no documento nossos parceiros e suas mensagens de apoio à iniciativa do Fórum.

Fazemos justiça ao posicionamento respeitoso do Sr. Luis Erlanger, que se colocou ao dispor do Fórum e de seus parceiros para continuar este processo de diálogo. O ponto mais destacado por ele diz respeito ao investimento (o maior entre as TVs no Brasil) da empresa na produção cultural brasileira.

Este fato reforça o nosso posicionamento em procurarmos intervir positivamente na melhoria da qualidade do que nos é apresentado, considerando as nossas posições enquanto movimento social (negro e feminista), pela Globo e pelas demais empresas de comunicação do país.

Além do FPMNC-RJ, estiveram presentes representantes das seguintes instituições: Ação Social da Igreja Metodista, Fórum de Mulheres do Município de São João de Meriti, Pastoral de Combate ao Racismo da Igreja Metodista e Instituto de Advocacia Racial e Ambiental (IARA). São parceiros do FPMNC-RJ: Fórum de Mulheres Negras Cristãs de São Paulo, Missões Quilombo, Pastoral Escolar e Universitária da Rede Metodista de Educação IPA (RS), Colégio Americano em Porto Alegre e Colégio União em Uruguaiana, Cenacora (SP), Ministério de Combate ao Preconceito Racial da Igreja Metodista (SP).

Jornalista, assessor do Fórum Permanente de Mulheres Negras Cristãs RJ (mulheresnegrascristas@bol.com.br), Rio de Janeiro

Plano Durban (parte ligada à comunicação)

4. Informação, comunicação e a mídia, incluindo novas tecnologias

140. Acolhe a contribuição positiva feita pelas novas tecnologias de informação e comunicação, incluindo a internet, no combate ao racismo através de uma comunicação rápida e de grande alcance.

141. Chama a atenção para o potencial de se aumentar o uso de novas tecnologias de informação e comunicação, incluindo a internet, para criar redes educacionais e de sensibilização contra o racismo, a discriminação racial, a xenofobia e a intolerância correlata, tanto dentro quanto fora da escola, bem como o potencial da internet em promover o respeito universal pelos direitos humanos e também o respeito pelo valor da diversidade cultural;

142. Enfatiza a importância de se reconhecer o valor da diversidade cultural e de se adotarem medidas concretas para incentivar o acesso das comunidades marginalizadas à mídia tradicional e alternativa e à apresentação de programas que reflitam suas culturas e linguagens;

143. Expressa preocupação com a progressão material do racismo, a discriminação racial, a xenofobia e a intolerância correlata incluindo suas formas e manifestações contemporâneas, tais como o uso de novas informações e tecnologias de comunicação, incluindo a internet, para disseminar idéias de superioridade racial;

144. Insta os Estados e incentiva o setor privado a promoverem o desenvolvimento através da mídia, incluindo a mídia impressa e eletrônica, a internet e a propaganda, levando-se em conta a sua independência, e através de suas associações e organizações pertinentes em níveis nacionais, regionais e internacionais, de um código de conduta ética voluntário e de medidas de auto-regulação, de políticas e de práticas que visem a:

a) Combater o racismo, a discriminação racial, a xenofobia e a intolerância correlata; b) Promover a representação justa, equilibrada e eqüitativa da diversidade de suas sociedades, bem como assegurar que esta diversidade seja refletida entre sua equipe de pessoal; c) Combater a proliferação de idéias de superioridade racial, justificação de ódio racial e de qualquer tipo de discriminação; d) Promover o respeito, a tolerância e o entendimento entre todos os indivíduos, povos, nações e civilizações através, por exemplo, da assistência em campanhas de sensibilização da opinião pública; e) Evitar todo tipo de estereótipos e, particularmente, o da promoção de imagens falsas dos migrantes, incluindo trabalhadores migrantes e refugiados com o intuito de prevenir a difusão de sentimentos de xenofobia entre o público e para incentivar o retrato objetivo e equilibrado de pessoas, dos eventos e da história;

145. Insta os Estados a implementarem sanções legais, de acordo com o direito internacional relativo aos direitos humanos pertinente, contra o incitamento ao ódio racial através de novas informações e tecnologias de comunicação, incluindo a internet, e ainda insta os Estados a aplicarem todos os principais instrumentos de direitos humanos dos quais eles sejam partícipes, em particular a Convenção Internacional pela Eliminação de todas as Formas de Discriminação Racial, na luta contra o racismo na internet;

146. Insta os Estados a incentivarem os meios de comunicação para evitarem os estereótipos baseados em racismo, discriminação racial, xenofobia e a intolerância correlata;

147. Solicita os Estados a considerarem o que se segue, levando em conta as normas internacionais e regionais existentes relativas à liberdade de expressão, quando adotarem medidas para garantir o direito à liberdade de opinião e expressão:

a) Incentivar os provedores de serviços de internet a estabelecerem e disseminarem códigos de conduta voluntários e específicos e medidas de auto-regulação contra a disseminação de mensagens racistas e de mensagens que resultem de discriminação racial, xenofobia ou qualquer outra forma de intolerância e discriminação; para este fim os provedores de internet são incentivados a estabelecerem grupos mediadores em níveis nacionais e internacionais, envolvendo as instituições pertinentes da sociedade civil; b) Adotar e aplicar, com maior abrangência possível, legislação adequada para se ajuizar os responsáveis pelo incitamento ao ódio racial ou à violência através das novas formas de informação e tecnologias de comunicação, incluindo a internet; c) Enfrentar o problema da disseminação de material racista através das novas formas de informação e tecnologias de comunicação, incluindo a internet, inter alia, através da oferta de cursos de capacitação para autoridades e servidores em cargos de cumprimento da lei; d) Denunciar e ativamente desencorajar a transmissão de mensagens racistas e xenófobas através de todas os meios de comunicação, inclusive das novas formas de informação e tecnologias de comunicação, tais como a internet; e) Considerar a possibilidade de uma resposta internacional pronta e coordenada para o fenômeno crescente da disseminação de mensagens de ódio e de material racista através das novas formas de informação e tecnologias de comunicação, incluindo a internet; e, neste contexto, fortalecer a cooperação internacional; f) Incentivar o acesso e o uso da internet por todas as pessoas como um fórum internacional e imparcial, estando cientes de que existem disparidades no uso e no acesso à internet; g) Examinar formas nas quais a contribuição positiva feita pelas novas formas de informação e tecnologias de comunicação, tais como a internet, possam ser realçadas pela reprodução de boas práticas no combate ao racismo, discriminação racial, xenofobia e a intolerância correlata; h) Incentivar a representação da diversidade da sociedade entre o pessoal das organizações de mídia e das novas formas de informação e tecnologias de comunicação, tais como a Internet, através da promoção adequada da representação de diferentes segmentos dentro das sociedades em todos os níveis de sua estrutura organizacional