Friday, 26 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

O perigo do plim-plim

O fato ocorrido recentemente com relação à TV digital no México, onde a Televisa virou a grande mãe midiática do país [ver ‘A crônica do monopólio anunciado‘], cria grande preocupação quanto ao Brasil e à América Latina, já que esta espera que o país escolha seu modelo de TV digital para que possa adotá-lo. Este medo, que aqui partilho com todos, faz pensar que esse grande marketing de reportagens-reality-show, produzido especialmente pela Globo pode, alem de passar por cima das leis e da ética profissional, nos levar a um Ensaio sobre a cegueira, que nem José Saramago poderia imaginar.

A escolha do modelo digital que mudará a concepção da TV no país deve ser muito bem estudada e analisada, pois, ao contrário de seu objetivo primeiro, que é a democratização e a ampliação de canais de qualidade para a população, poderemos assistir a um neomonopólio das empresas que já o detêm. Este debate tão importante para a sociedade está sendo desviado de sua importância e camuflado entre os últimos furos de reportagens.

Antidemocrático e antitudo

Estamos vivenciando um aumento, ainda que pequeno, da opinião crítica em relação à mídia nacional, no qual graves problemas atuais e antigos erros são apresentados, bem como a falência de um modelo global que perde pontos no ibope para outras emissoras, de conteúdo tão duvidoso quanto. Meu temor está justamente neste aspecto, pois sendo este o momento em que a reflexão crítica sobre as grandes empresas midiáticas nacionais deveria acontecer, percebo um revés.

Com essa grande oferta de ‘furos jornalísticos’ apresentada pela Globo ou mesmo a Veja, o público e o leitor se deixam levar pelo imediatismo do impacto social da notícia, como no caso do ‘circo Richthofen’, em que a falsa ética moralista destas empresas promove um julgamento pela nação, ainda que para isso seja preciso passar por cima das leis que estabelecem sigilo e privacidade – não sendo ilegal, é claro, a violação destes quando de uma autorização judicial, o que não foi o caso.

O circo armado neste picadeiro já mostrou – e ainda está cheio de shows a serem apresentados – a nova cara ‘ética’ da grande imprensa, no qual passado é passado – temos que pensar apenas no ‘daqui pra frente’, não importando os antigos erros. Sendo a Globo portadora da maior parte deles – não que ela seja a melhor, e sim a mais eficiente –, temos que tomar cuidado para que uma emissora que cresceu apoiando a ditadura, massificando a cultura, apoiando ideologias contrárias à situação nacional, derrubando e elegendo presidentes, construindo uma imagem nacional falaciosa, entre outras tantas coisas, possa agora simplesmente maquiar suas verdadeira intenções para, de fato, conseguir manipular a escolha do modelo digital no Brasil.

E suas ambições podem se concretizar, já que as pretensões globais de conquistar a avaliação positiva do país ganha força entre as gentes. Especialmente seu jornalismo em primeira mão tenta mudar a imagem negativa de que goza entre os que ainda têm um pouco de espírito crítico. Pode assim ser a mais ‘imparcial’ possível quando usar de sua influência para a escolha do melhor modelo digital – europeu, americano, japonês ou nacional, desenvolvido pela PUC-RS. Se, como aconteceu no México, no caso da Televisa, cuja lei digital já é conhecida com Lei Televisa, a Globo conseguir suas pretensões, vamos continuar numa nova ditadura por décadas. E o monopólio a serviço dos interesses de uma empresa mais forte do que já é. Isso é antinacional, antidemocrático e antitudo que ajudaria a melhorar o futuro democrático do Brasil.

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Estudante, São Paulo