Thursday, 28 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1280

Os desafios da EBC

Um dos grandes desafios do sistema público de comunicação brasileiro, mais especificamente da Empresa Brasil de Comunicação (EBC) e seu braço televisivo, a TV Brasil, é fazer funcionar plenamente uma rede nacional de televisão composta pelas emissoras públicas que não reproduza o modelo consolidado pelos veículos comerciais. Esta foi, por exemplo, uma das preocupações apresentadas por José Roberto Garcez, diretor de Serviços da EBC, ainda no seminário realizado pela empresa no início de dezembro passado, em Brasília.


Na opinião de Garcez, não há serviço público sem que seja universal e, portanto, para atual gestão da EBC é um desafio em andamento ampliar o sinal de todos os veículos do sistema e assumir um prazo de sete anos para que todas as emissoras estaduais que desejem reproduzam a sua programação.


Por ser uma experiência ainda nova e que se pretende diferente das formações de redes nacionais mais conhecidas, ainda não se sabe como será o modelo da Rede Pública Nacional que está em gestação. No caso das redes nacionais comerciais, a composição da grade de programação por emissoras locais é limitada e geralmente determinada pelas chamadas cabeças de rede – no caso, a Globo, a Record, a Band e o SBT, dentre outras. Em muitas ocasiões cumpre-se apenas o mínimo de produção local determinada tão somente para o jornalismo, que é de 5% da grade de programação. 


Na rede pública o que se espera é que exista tanto mais autonomia das emissoras locais para a composição das suas grades, usando parte da programação da TV Brasil, por exemplo, como também se espera que mais programas produzidos pelas emissoras locais possam ser redistribuídos para outros estados e também serem exibidos em rede nacional. 


Para o diretor de Produção e Programação da Rede Minas, Luciano Alkmim, é importante que as emissoras locais continuem com autonomia para poder mudar os horários de exibição local, por exemplo. ‘As redes precisam desse tipo de autonomia e de flexibilidade com relação à grade nacional para poder atender melhor ao seu público. O modelo de grade de programação do Rio de Janeiro pode não dar certo em Minas Gerais e vice-versa.’


Experiências


Em setembro de 2009, a TV Brasil lançou a sua primeira grade de programação própria, com 32 novos programas, que representou renovação de 25% da sua então atual grade. Os programas também puderam ser exibidos pelas emissoras educativas e universitárias e a receptividade pode ser considerada positiva. Dentro dessa nova grade de programação nacional, experiências com programas produzidos por emissoras regionais já estão em andamento, como, por exemplo, o Catalendas, programa infantil produzido pela Fundação de Telecomunicações do Pará (Funtelpa), que administra a TV pública local.


O diretor da Rede Minas Luciano Alkmim avaliou também como positiva e estimulante a participação que existiu das emissoras estaduais na gestação da atual grade de programação da TV Brasil. ‘Essa grade passou por um processo de negociação de mais ou menos um ano e meio. Ela atende às manifestações das TVs regionais de faixas mais delineadas. Ela é fruto de uma negociação que é bacana pela abertura que a TV Brasil tem de dialogar com outras emissoras’, comemorou.


Avaliação semelhante foi feita por Jackson Nascimento, diretor de Programação da TV Cultura do Amazonas. De acordo com Nascimento, o maior apelo regional da nova programação aumentou a audiência no estado. ‘A TV Cultura do Amazonas passou a transmitir a TV Brasil desde que a TV Cultura de São Paulo começou a cobrar pela retransmissão dos seus programas e agora assinamos contrato de co-produção com a TV Brasil e vai retransmitir toda a nova programação e ainda vai produzir novos programas para entrar em rede nacional’, adiantou Nascimento.


Já o diretor de Programação da TV Cultura do Pará, Dimitri Maracajá, aponta que ainda há defasagem na regionalização da programação, mas que não se pode negar os avanços. ‘Eu acho que a com a nova programação a TV Brasil melhorou muito em quantidade e em qualidade. Na regionalização ainda existe uma defasagem, mas não se pode negar que houve melhora. Mas podemos melhorar mais.’


Contudo, mesmo algumas emissoras locais podendo reproduzir parte da programação da TV Brasil, ou em alguns casos a programação completa, ainda não se consolida a formação de uma rede. Não há critérios amplamente estabelecidos, tampouco um modelo de gestão que caracterize uma rede nacional, inclusive com submissão da gestão das emissoras públicas a conselhos curadores e gestões colegiadas, como já expressaram membros da EBC como sendo um dos importantes critérios a serem exigidos na ocasião da formação de uma rede pública.


O que existe até agora são acordos para legalizar essa reprodução e também para firmar parcerias que estão em andamento com as emissoras estaduais. Enquanto o modelo de rede ainda não fica pronto, parcerias pontuais vão sendo firmadas e dessa forma algumas emissoras estaduais, como a TV Universitária de Pernambuco estão recebendo incentivos para retomar parte das suas produções que tiveram que ser estagnadas por falta de financiamento.


O acordo firmado entre a TVU, gerida pela Universidade Federal de Pernambuco e que tem um orçamento limitado ao pagamento de pessoal, garantiu recursos para a compra de equipamentos, incluindo a mudança de potência do transmissor, e também deverá voltar a ser produzido o jornal local que saiu do ar por falta de verbas.


Jornalismo


A produção local de matérias jornalísticas pelas emissoras estaduais também está sendo valorizado nos programas de telejornalismo da TV Brasil. Isso pode justificar em partes o investimento da EBC em algumas emissoras locais que estão sem jornalismo nas suas produções.


Até mesmo o diretor de Programação da TV Cultura do Pará, Dimitri Maracajá, que acredita que ainda deve-se melhorar a regionalização da programação da TV Brasil com relação aos demais programas, considera que no jornalismo já vem se conseguindo regionalizar as matérias. ‘O jornalismo já consegue dar uma cara mais representativa para as regiões’, diz ele.


Operador de Rede Digital


Acredita-se que um aliado para resolver os problemas da criação da rede nacional de televisão pública será o processo de digitalização das comunicações e com ele a criação do Operador de Rede Pública Digital, que pretende cobrir a maioria do território brasileiro até 2017.


Está aberta desde o último dia 28 de dezembro uma consulta pública para analisar o edital de licitação de concorrência internacional, para exploração, mediante concessão administrativa, da Rede Nacional de Televisão Pública Digital (RNTPD) (ver ‘EBC lança consulta sobre edital‘).  Apesar de uma contratação mais técnica do que necessariamente sobre o conteúdo e a forma de gerenciamento da programação, a consulta abre caminho para a digitalização dos canais públicos no formato de operadores de rede e vislumbra também a universalização do serviço que faz parte da consolidação do sistema público de comunicação.