Saturday, 20 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Por que tanto receio da programação local?

Tenho acompanhado, de perto, todas as iniciativas que dizem respeito à regionalização e produção independente nas programações de emissoras de televisão. De um lado, procuradores da República, produtoras independentes e o Conselho de Comunicação Social, que tem função prevista na Carta Magna, lutando pela democratização dos meios de comunicação e, em especial, pela ampliação da produção regional e independente. De outro, os radiodifusores, que atuam no campo privado e comercial, que têm feito o possível para que o Art. 221 da Constituição Federal não seja regulamentado.

O resultado é que o assunto está em discussão, há mais de dez anos, no Congresso Nacional sem que uma posição mais forte e definitiva seja tomada.

Tenho interesse no assunto, pois estou em uma verdadeira ‘batalha’ para que a emissora pública de Montenegro, no Rio Grande do Sul, tenha uma postura plural e ofereça à comunidade um tempo maior de produção própria, pois, como diz Celso Três, Procurador da República, a programação nacional e internacional tem a sua importância, porém o cidadão só tem as suas expectativas atendidas com a programação da sua cidade ou região.

Sugiro que os interessados no assunto dêem uma olhada no Parecer Nº 01, 2004 CCS, do Conselho de Comunicação Social, de 2004, que apontou, com modificações, a aprovação do PL 59/2003, que trata da regionalização do conteúdo nas emissoras de TV e, também, da participação das produtoras independentes nas programações dos canais de TV.

O material é fruto de um longo e criterioso trabalho, que têm depoimentos de especialistas na área, como o professor Gabriel Priolli, e até uma citação do ex-presidente Médici, que vale a pena reproduzir aqui e que dá a exata noção da importância que se tem dado aos assuntos nativos: ‘Os noticiários que acompanho regularmente, no fim da noite, são verdadeiros tranqüilizantes para mim. Vejo tanta notícia desagradável sobre a Irlanda, o Vietnã, os índios americanos, e no que respeita ao Brasil está tudo em paz’ (Emílio Garrastazu Médici – Presidente do Brasil – Folha de S.Paulo – 22/3/73).

Assim, gostaria de levar a público o trabalho realizado pelo Conselho de Comunicação Social, na aprovação do PL 59/2003. O problema é que o texto ainda não foi regulamentado. Apesar do percentual referido na Constituição ainda ter sido regulamentado, há outras duas normas, na lei, e que devem ser seguidas pelas emissoras e ambas estão explícitas no Decreto 52.795/63, o Regulamento de Serviços de Radiodifusão. O primeiro trata da exigência da produção de, no mínimo, 5% de serviços noticiosos, percentual esse que a Casa Civil anda exigindo comprovação das emissoras para que suas concessões sejam renovadas e, também, a exigência de cumprimento de 2/3 de produção de trabalho regular. Caso a emissora não cumpra esse percentual, o canal poderá ser compartilhado por outra entidade, para que os 2/3 sejam cumpridos. Fica claro que os autores desse artigo, o 54 do regulamento, tinham a intenção de criar um artifício capaz de evitar apenas as retransmissões do sinal das redes nacionais, como acontece, hoje, em muitas emissoras espalhadas pelo país.

Na experiência da emissora pública de Montenegro, por exemplo, entre 2001 e 2003 foi realizado levantamento de audiência e a programação local era a que aparecia com altíssimos índices de audiência. Já os programas nacionais… Isto comprova que a programação nacional tem grande penetração em municípios que apresentam características de metrópole. Nas cidades de porte médio ou pequeno, onde quase todos se conhecem, um fato ocorrido na Europa ou até no Norte do país não apresenta o mesmo grau do interesse, por exemplo, daquele que retrata o dia a dia da aldeia.

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Jornalista e fundador da TV Cultura de Montenegro, RS