Tuesday, 19 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1279

Sarkozy quer salvar a mídia impressa

Acabou a era do Estado omisso: ou os governos assumem os vácuos produzidos pela crise ou mergulhamos no caos. O problema está sendo claramente colocado por Barack Obama: a injeção de 850 bilhões de dólares só se fará se aumentarem os controles sobre o sistema financeiro americano. Simplificando: ou dá ou desce.


O problema não é ideológico, Adam Smith nada tem a ver com isso. Nem Marx. O dilema é concreto, objetivo: as bolhas são filhas da desregulamentação, a exuberância foi uma mentira coletiva que ninguém teve a coragem de desmascarar porque todos os atores (argh!) estavam tirando vantagens.


Qualquer terapia para reanimar a economia mundial deve passar obrigatoriamente por um tremendo choque regulatório. O Sr. Mercado não tem credibilidade para salvar o mundo da débâcle iminente. Se tivesse alguma competência teria salvado a si mesmo.


Em poucas palavras


O presidente francês Nicolas Sarkozy é um pragmático, com algo de bonapartista – no físico e na personalidade voluntarista. Ao contrário dos conterrâneos enrolados na retórica e imersos na ideologia, preferiu agir.


Em outubro do ano passado [ver ‘Um plano para salvar a mídia impressa francesa‘] convocou os ‘Estados Gerais da Imprensa Escrita’, uma iniciativa razoavelmente pluralista com 140 participantes incluindo jornalistas profissionais, representantes da mídia nacional, regional e hebdomadária, acadêmicos e funcionários do governo, e deu-lhes um prazo de três meses para produzir um documento coerente.


A moçada reuniu-se 72 vezes e na sexta-feira (23/1) o presidente francês apresentou o Livro Verde, conjunto de medidas para reverter a queda livre da mídia impressa francesa, avaliado em 600 milhões de euros num setor que emprega 100 mil trabalhadores [ver aqui].


O Sr. Mercado (ou melhor, Monsieur Le Marché) teria condições de preparar uma resposta tão rápida para um problema tão premente? Não. Em primeiro lugar porque os mercados não têm e não devem ter poder. Para não contaminá-lo com seus interesses. Só o Estado democrático, devidamente constituído, equilibrado e fiscalizado, pode encarregar-se de uma operação de salvamento deste porte e natureza, que envolve ideais e valores muito caros à civilização francesa.


Questão ainda mais contundente e grave: o mercado estaria efetivamente interessado em salvar a mídia impressa? A indústria jornalística – como a de salsichas ou a de biscoitos – não está minimamente sintonizada no atendimento ao interesse público, nem nos interesses permanentes da sociedade. A decadência da mídia impressa não sensibilizou a indústria jornalística – ao primeiro sinal de perigo, pulou do barco. Não tem amor ao seu negócio, o core business, ligada tão-somente ao business.


Jornal impresso deixou de agradar aos jovens? Nenhum problema: basta oferecer às novas gerações notícias de algumas palavras através dos smart-phones e estamos conversados. Só um governo ou um governante ficaria preocupado com a incapacidade dos cérebros juvenis entenderem um pensamento mais elaborado.


Mais cautela


A indústria e o mercado não são abstrações, compõem-se de empresas e empresários. No caso da imprensa, essas empresas são veículos jornalísticos que gozam de privilégios constitucionais e, em contrapartida, deveriam preocupar-se com sua função social. O mercado nunca foi doutrinado para ajustar-se às políticas públicas.


Além do mais é preciso reconhecer que a imprensa francesa é hoje uma sombra do que foi há 20 ou 30 anos. Os seus ícones estão visivelmente deteriorados. O Monde [Le Monde], o Libé [Liberation], o Figaro e o Obs (semanário Nouvel Observateur] – para citar os mais conhecidos – perderam sua vitalidade, seu cartesianismo não consegue funcionar em situações de emergência.


Compare-se o comportamento do Monde com o do El País no tocante à acessibilidade digital. Esquecido da tradição universalista da cultura francesa, o Monde impõe barreiras ao internauta, o acesso ao seu site é parcial. Já o diário espanhol (na realidade um diário global em língua espanhola) oferece acesso livre. Isso faz a diferença – no plano simbólico como no prático.


Resultado: em meio à decadência generalizada da mídia impressa, o EP é uma estrela em ascensão, vende em média 431.034 exemplares diários. Apesar da queda de 1% na circulação em 2008, aumentou a sua diferença sobre o principal concorrente, El Mundo, em 107 mil exemplares (El País, 24/1, pág. 36)


Os editores espanhóis (agrupados em torno da AEDE – Asociación de Editores de Diarios Españoles) também reivindicam do governo Zapatero um programa de apoio à mídia impressa (a reivindicação não é inusitada na União Européia). Sarkozy ofereceu aos veículos franceses um aumento substancial na propaganda do governo; os espanhóis, mais cautelosos, querem diminuição dos impostos e programas de fomento à leitura.


Controlar apetites


O Sr. Mercado está perdendo todas as batalhas, em todos os quadrantes. Ele não dá conta das grandes transformações, nem tem condições de enfrentar as grandes emergências.


No início do governo Lula, seu então ministro da Casa Civil, José Dirceu, tentou instituir uma linha de crédito especial no BNDES para atender as empresas jornalísticas, Não deu certo, felizmente. [Ver, sobre o assunto, matérias publicadas em 2003 neste Observatório: ‘Lula faz gols, mídia engole frangos‘, ‘Mídia apela para o BNDES‘, ‘O que fazer para sair do buraco‘, ‘Os perigos da Midiabrás‘, ‘Privilégios e riscos da ajuda estatal‘, ‘O BNDES e a crise da mídia‘, ‘A singeleza de um furo‘, ‘Os perigos da intimidade com o poder‘, ‘Governo bate e Geni não reclama‘.]


O caso brasileiro é completamente diferente do francês. E muito pior. Aqui são raras, raríssimas, as empresas que se dedicam exclusivamente ao jornalismo impresso (Folha de S.Paulo e Estado de S.Paulo fazem parte dessas raridades). A maioria, sobretudo no âmbito regional, é mista, apoiada na mídia eletrônica, por sua vez dependente das concessões doadas a esquemas políticos favoráveis aos governos. Então, como impedir que um programa de incentivos à mídia impressa seja canibalizado pelas subsidiárias na área de radiodifusão?


Como adotar o esquema Sarkozy de salvamento da mídia impressa se aqui os meios de comunicação são altamente concentrados e altamente oligopolistas? Para serem ajudados – como vai acontecer na França – nossos jornais e revistas precisarão controlar seu apetite.


Controlar apetites significa regular. E o Sr. Mercado detesta este verbo, prefere imolar-se.


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ESTADOS GERAIS DA IMPRENSA
Perguntas e respostas




O grupo de discussão convocado pelo governo francês em outubro de 2008 dividiu seu trabalho em quatro temas: ‘Funções do jornalismo’, ‘Processo industrial’, ‘Imprensa e internet’ e ‘Imprensa e sociedade’. A seguir, as perguntas mais freqüentes sobre a convocatória, publicadas no site oficial da iniciativa e traduzidas por Jô Amado.


1. Como foram constituídos os grupos de trabalho? Dá a impressão de que os critérios foram arbitrários.


Os grupos de trabalho foram constituídos pelos presidentes de cada uma das mesas (temas), tentando conciliar a maior representatividade possível do conjunto de protagonistas do mundo da imprensa (diretores, jornalistas, gráficos, distribuidores, leitores, administradores, especialistas…) com a possibilidade de mudanças concretas e de um trabalho realmente em conjunto.


Cada presidente de mesa-tema teve ampla liberdade para a composição de seu grupo. Bruno Frappat, por exemplo, optou por constituir um grupo mais fechado, de modo a permitir aprofundar as discussões, e dará voz aos principais protagonistas envolvidos por seu tema. Arnaud de Puyfontaine e François Dufour, por seu lado, optaram por constituir grupos bastante grandes, que em seguida foram divididos em sub-temas de trabalho.


O total de participantes dos grupos de trabalho é de 140 pessoas. Todas as profissões do mundo da imprensa estão representadas (jornalistas, diretores, gráficos, operários, distribuidores…), assim como todos os tipos de imprensa (diários, revistas, jornais nacionais e regionais, jornais pagos e gratuitos, imprensa genérica e temática, jornais impressos e digitais…) e a maioria dos meios de comunicação mais conhecidos (Le Monde, Le Figaro, L´Humanité, Libération, Les Echos, La Tribune, 20 minutes, Métro, Le Parisien-Aujourd´hui en France, Rue 89, Ouest-France, La Montagne, La Voix du Nord, La Dépêche du Midi, Sud-Ouest, Valeurs Actuelles, L´Express, Paris-Match, Elle etc.).


Deve se destacar que a todas as organizações profissionais que pediram para participar do seminário foi proposta a participação em grupos de trabalho ou o direito a serem ouvidas.


2. Gostaria de participar do seminário. Como se participa dos debates?


Os grupos já foram constituídos e não seria razoável aumentar o número de participantes. Entretanto, é possível contribuir de uma forma direta pelo site, enviando uma ou mais contribuições. Também estão previstos depoimentos reservados aos profissionais, seja por ocasião de eventos especiais filmados a partir do Senado – como foi o caso no dia 20 de outubro –, ou por ocasião das sessões de trabalho das mesas-tema, de debates e propostas, ou de seus sub-grupos de trabalho.


3. Por que os jornalistas foram excluídos dos debates?


Os jornalistas não foram excluídos de maneira alguma. Inúmeros jornalistas e ex-jornalistas estão participando, assim como dois sindicatos que representam os jornalistas (o SNJ e a CFDT).


O que é verdade, por outro lado, é que o Fórum das Empresas de Jornalistas declinou do convite que lhe foi feito. Dois membros de sua diretoria foram convidados a participar das mesas-tema 3 e 4 e já haviam concordado – o presidente da Sociedade dos Redatores do Monde foi convidado a participar da mesa-tema presidida por Frappat. Porém, por motivos que desconhecemos, o Fórum das Empresas de Jornalistas preferiu não participar.


Convém esclarecer que, excetuando algumas questões de ordem jurídica, como os direitos autorais e o estatuto dos jornalistas, a maioria das questões envolvendo jornalistas e jornalismo, principalmente aquelas que dizem respeito à deontologia, à confiança do público na mídia e nos jornalistas, ao futuro das funções do jornalismo, não são atribuições do Estado, e sim, da profissão propriamente dita e de suas relações com os diretores. Foi devido a uma solicitação feita pela profissão que se decidiu que o seminário dedicaria parte de seus trabalhos a questões relativas às funções do jornalismo e à sua deontologia. Ao ser solicitado a participar como mediador do debate, o Estado aceitou, mas de forma alguma se impôs.


4. Os leitores parecem não ter participado do processo. Como se justifica essa opção?


É evidente que os leitores são fundamentais e os trabalhos da mesa-tema presidida por François Dufour lhes são em grande parte dedicados – através de questões de conteúdo, de co9nfiança e de juventude. A dificuldade está em encontrar pessoas suscetíveis de representar os leitores e de falar em seu nome.


As associações de leitores são, naturalmente, interlocutores óbvios. É por isso que o presidente da Associação de Leitores do Monde faz parte dos membros do grupo de trabalho presidido por François Dufour. Também será proposto à presidente da Associação de Leitores do Libération que dê um depoimento ao grupo presidido por Bruno Frappat.


A representação ainda é parcial. Decidiu-se, portanto, completá-la incluindo nos trabalhos do seminário representantes de mediadores e sociólogos da mídia. Além disso, cada publicação foi convidada a criar, em sua página da internet, um fórum destinado a coletar observações de seus leitores, as quais passarão a fazer parte integrante dos trabalhos do seminário. A imprensa diária regional, por seu lado, criou um fórum que permite ao conjunto dos leitores de jornais diários regionais fazer valer sua opinião. Finalmente, foi também proposto às associações de consumidores e de famílias que dessem seus depoimentos.


5. Para que servem as contribuições feitas online no site? Quem nos garante que elas serão levadas em conta?


As contribuições feitas online no site são transmitidas à atenção do público como participações das mesas-tema que alimentam os trabalhos do seminário. Fornecem uma variedade de esclarecimentos que, em seguida, são discutidos nas sessões de trabalho e, às vezes, resultam em depoimentos complementares.


6. Qual é a programação das reuniões?


O ritmo de reunião dos grupos é, normalmente, semanal. A íntegra da programação está disponível aqui.


7. Por que alguns participantes, ou observadores, criticam a opacidade, a falta de representatividade e até a legitimidade do seminário?


Trata-se de três questões diferentes. Quanto à opacidade, é uma crítica absolutamente carente de fundamento, embora sempre seja possível melhorar as coisas, o que nos vimos esforçando por fazer. Com mais de 140 participantes, representando todos os setores e profissões da mídia, com as contribuições escritas tornadas públicas, os depoimentos filmados e um relatório analítico dos trabalhos de cada mesa-tema colocado na internet de um dia para o outro, é difícil falar de um processo opaco.


Em se tratando de representatividade, o seminário consiste num processo de consulta que reúne, vale repetir, a imensa maioria dos profissionais. Não se trata, nem se poderia tratar, de um processo de representação, nem de decisão. Uma vez concluída a consulta, o debate democrático e o processo de decisão se darão de acordo com as regras de nossa democracia. As conclusões do seminário serão divulgadas ao público e submetidas a debate e, em seguida, o governo apresentará suas propostas. Se a totalidade ou uma parte das decisões tomadas dependerem da legislação, o debate democrático será levado ao Parlamento, nas condições previstas pela Constituição.


No que se refere à legitimidade do seminário, é responsabilidade do Estado, evidentemente, garantir que as regras legislativas, regulamentares e financeiras (ajudas públicas à imprensa) que regem o setor da imprensa sejam adaptadas às dificuldades e desafios desse setor. O Estado está em seu papel ao questionar a pertinência da Lei Bichet sobre a distribuição, a eficácia e disposição de ajudas à imprensa, sobre a oportunidade, ou não, de modificar as regras que dizem respeito à concentração na mídia… regras que independem de sua competência. Para tanto, organiza uma consulta aos profissionais e ao público que consiste neste seminário ‘Etats généraux de la presse écrite’.


8. O que nos leva a crer que o governo já não tenha decidido tudo por antecipação?


Há trinta anos que se conhecem os problemas do jornalismo impresso. Dezenas de relatórios foram escritos sobre o assunto – muitos deles, por sinal, acessíveis no site do seminário. Assim sendo, não foi difícil ao governo elaborar uma lista dos principais temas que o seminário deveria abordar. Além do mais, se tudo tivesse sido decidido por antecipação, o governo não teria organizado o seminário, um processo ambicioso, público e exigente. A própria existência do seminário é prova de que nada foi decidido até agora. Além disso, inúmeras questões e propostas surgiram por ocasião da preparação de abertura do seminário, incentivando o governo em sua decisão levar adiante este processo de consulta da maneira mais ampla e aberta possível.


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DEU NO JORNAL
França lança plano de 600 mi para resgatar imprensa


Cíntia Cardoso # reproduzido do Folha de S.Paulo, 24/1/2009


Depois dos bancos e do setor automotivo, foi a vez de a mídia francesa receber ajuda do governo. O presidente Nicolas Sarkozy anunciou ontem um plano para ‘salvar’ jornais e sites de notícias no país.


Ao todo, o pacote vai custar 600 milhões distribuídos por três anos, sem incluir os recursos para a modernização do parque gráfico francês.


As medidas fazem parte dos ‘Estados Gerais da Imprensa’ iniciativa lançada por Sarkozy em outubro passado para avaliar a situação da imprensa francesa e propor recursos para a sua modernização. O diagnóstico apontou três problemas-chave: queda da receita com publicidade, diminuição dos leitores e alto custo de produção. Na França, o preço médio do jornal é de 1,26 euro, contra 0,80 na Alemanha.


Para atacar a primeira questão, Sarkozy propôs um aumento dos gastos com informes publicitários do governo. O Estado ‘vai dobrar, a partir deste ano, as despesas com a comunicação institucional’ na imprensa escrita e eletrônica, afirmou ontem no Palácio do Eliseu. Assim, serão injetados 20 milhões a mais neste ano.


Aos críticos que veem na iniciativa uma ameaça à liberdade de imprensa, Sarkozy disse: ‘Espero que ninguém veja um atentado à independência’.


Ainda no pacote, o presidente francês disse que cortará as despesas postais da imprensa, o que representará uma economia de 24 milhões para o setor. A ajuda aos jornaleiros totaliza 60 milhões, e o estímulo para expandir a entrega em domicílio, 70 milhões.
Para deter o desaparecimento gradual de leitores, o presidente propôs a assinatura gratuita de um jornal por um ano para os jovens de 18 anos. O governo arcará com os custos de distribuição, e a publicação escolhida pelo leitor ofereceria os exemplares gratuitamente.


Internet


Para a internet, Sarkozy anunciou a adaptação à era digital dos direitos autorais dos jornalistas e acrescentou que o Estado criará um estatuto do editor da imprensa digital para desenvolver jornais na rede.


Na avaliação de Dominique Candille, do Sindicato Nacional dos Jornalistas, ‘não é chocante ajudar a imprensa, mas essa é só parte da resposta’. ‘Já as ajudas diretas e indiretas, como a exoneração dos encargos sociais nos incomodam.’


Os sindicatos também afirmam que querem observar como serão alocados os recursos. Nos últimos anos, por causa de dificuldades financeiras, os principais jornais franceses passaram para o controle total ou parcial de grandes grupos industriais que, a princípio, não eram da área de comunicação.


Para Sarkozy, as medidas são a resposta necessária para um setor em dificuldades e que enfrenta um cenário econômico mundial ‘deteriorado’. Na França, as greves de jornais têm sido recorrentes. Em 2007, só o diário Le Monde fez três para protestar contra as más condições de trabalho.


Vários sindicatos convocaram para a próxima quinta uma greve geral de jornalistas contra os programas de demissão voluntária e cortes de pessoal.


Enquanto o presidente Sarkozy anuncia ajuda para a imprensa escrita e eletrônica, o governo segue com um programa de redução de custos nas televisões e rádios estatais. Os sindicalistas estimam que 900 trabalhadores estejam ameaçados no grupo estatal France Télévisions. Na Radio France Internationale, 206 postos de trabalho serão suprimidos.


Para o SNJ, é justamente na questão da situação profissional dos jornalistas que o pacote foi tímido. O setor emprega 100 mil profissionais mas, segundo dados do SNJ, um quinto dos jornalistas não tem vínculo empregatício com as empresas.


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França dará 600 milhões a empresas de mídia


Andrei Netto # reproduzido do Estado de S.Paulo, 24/1/2009


Empresas de mídias impressa e online receberão nos próximos três anos um aporte financeiro de mais de 600 milhões do governo da França. A medida foi anunciada ontem, no Palácio do Eliseu, em Paris, pelo presidente Nicolas Sarkozy. O plano de socorro atende à solicitação dos empresários do setor, que enfrentam uma crise prolongada, endividamento e redução da circulação paga.


O projeto foi elaborado a partir do ‘Estado Geral’ – um fórum organizado pelo governo para discutir propostas. A reforma era uma reivindicação da Imprensa Diária Nacional, a reunião de 17 dos maiores veículos de mídia impressa do país. Este grupo, formado entre outros pelos jornais Le Monde, Libération e Le Figaro, cristaliza a crise do setor, que enfrenta déficits crônicos e contração das vendas de 1% ao ano.


Desde o lançamento do Estado Geral da Imprensa, em outubro, reuniões vinham sendo realizadas pelo país para debater o impacto das novas tecnologias sobre a circulação de jornais e para analisar os custos industriais como impressão, transporte e distribuição.


O plano de incentivo prevê o investimento de 200 milhões por ano no próximo triênio. Entre as medidas de urgência, estão o adiamento das novas tarifas de envio de jornais pelos correios – o maior distribuidor do país –, medida que terá um custo de 12 milhões, o aumento para 70 milhões ao ano do programa destinado a gerar vagas de jornaleiros para estudantes e desempregados, o aumento em 100% das despesas de publicidade do Estado e a exoneração de impostos sobre salários pagos por empresas do setor.


O governo também financiará um novo contrato social com trabalhadores das gráficas, reduzindo entre 30% e 40% o custo da impressão. Por fim, alterará a lei que restringe a 20% a participação de companhias de fora da União Europeia no capital das empresas de comunicação francesas. A ideia é estimular a concentração do setor em fortes grupos multimídia.


‘Não estarei entre aqueles que assistirão ao desaparecimento da imprensa. A uma crise estrutural, somam-se neste momento uma crise conjuntural e uma revolução tecnológica’, disse Sarkozy. ‘A imprensa pode inovar em conteúdo e o Estado pode ajudar a financiar essa inovação.’


As discussões em torno do plano geram controvérsia desde que o Fórum de Associações de Jornalistas, entidade que representa profissionais de 17 redações do país, abandonou as negociações por ‘falta de pluralidade’. Ontem, o tom foi menos crítico. Ao Estado, François Malye, presidente do fórum, disse que o projeto só não foi melhor porque reforçou o poder dos empresários em detrimento dos jornalistas. ‘O interesse dos editores foi vencedor.’


Malye lamentou que os grupos de comunicação tenham de pedir ajuda para reverter a crise. ‘É triste que estejamos em um país em que a imprensa não tem meios próprios de sobreviver’, criticou, descartando que as medidas representem perda da independência em relação ao governo.


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Sarkozy inyecta 600 millones para salvar a la prensa


A. Jiménez Barca # reproduzido do El País, 24/1/2009


El Estado francés inyectará 600 millones de euros en un plan trienal de ayuda ‘de urgencia’ a la prensa escrita, un sector que emplea a unas 100.000 personas y que atraviesa una crisis estructural de varios años. El presidente de la República, Nicolas Sarkozy, desgranó ayer una batería de medidas encaminadas, precisamente, a sacar a los periódicos y semanarios franceses de esta crisis. En primer lugar, el Gobierno francés se compromete a doblar la cuantía de la publicidad institucional que contrata en periódicos y semanarios. De esta manera, gastará al año, al menos, 20 millones en anuncios. ‘No creo que nadie vea en esto que se pierde independencia’, comentó Sarkozy.


El presidente también aseguró que los periódicos en Internet gozarán de las mismas ventajas fiscales que sus colegas de la prensa escrita en papel y que los editores de prensa online dispondrán de un estatuto oficial que les exigirá, a su vez, ‘su cuota de responsabilidad’.


Los derechos de autor también se adaptarán a los nuevos soportes tecnológicos. El plan que abandera Sarkozy plantea que los periodistas cobren por sus trabajos tantas veces como sean publicados. Esta práctica, implantada en algunas redacciones francesas, consiste en remunerar al autor de una pieza periodística en función de la explotación que se haga de ella.


Las propuestas que ayer fue anunciando Sarkozy responden al centenar de recomendaciones emanadas de un Libro blanco elaborado a lo largo de tres meses por 150 profesionales de sector de la prensa escrita, a instancias y bajo la supervisión del propio Gobierno francés.


Una de estas medidas recogidas en el Libro blanco tiene que ver con el fomento de la lectura en las nuevas generaciones. Sarkozy la hizo suya no sin antes lanzar un comentario: ‘El hábito de leer la prensa se adquiere de joven’. Después, anunció que el Estado va a sufragar lo que cueste poner en las manos de cada francés de menos de 18 años un periódico. Es decir, el Estado se encargará del transporte. Las empresas periodísticas, por su parte, regalan el ejemplar. Lo único que tiene que hacer el joven es darse por enterado, elegir el periódico más de su gusto, pedirlo, recibirlo y leerlo.


Por otra parte, la ayuda estatal para promover el reparto a domicilio aumentará en 62 millones de euros. Las empresas de este sector gozarán asimismo de determinadas exenciones fiscales. En cuanto a la impresión, el presidente francés adelantó que el Estado contribuirá a ‘las inversiones que se necesiten’ para abaratar los costes.


Sarkozy anunció también que las tasas postales para la prensa se congelan. El Estado compensará a la compañía nacional de correos, La Poste, por lo que dejará de recibir por esta medida.