Tuesday, 23 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Televisões, as teles e os limites do bizarro

Há um racha entre os operadores de TV por assinatura em função da entrada das teles neste mercado. De um lado estão a Net Serviços e a Sky+DirecTV, que se opõem firmemente à essa possibilidade. Elas são tacitamente apoiadas pela Associação Brasileira de TV Por Assinatura (ABTA), que representa todo o setor mas que tem sido acusada por algumas operadoras, em especial a TVA, de favorecimento ao primeiro grupo.


Do outro lado estão a própria TVA (que tem um acordo de venda de participação acionária à Telefônica, embora ainda em tramitação na Anatel) e operadoras menores porém atuantes, como a WayTV e a DTHi, além da NeoTV, que é uma associação de pequenas operadoras voltada para a negociação de programação. Quase todas essas operadoras já mantêm parcerias com as teles. A TVA acusa a Net de hipocrisia ao se colocar contra isso, já que entre seus controladores está a Telmex, uma das maiores operadoras de telefonia do continente.


A essa altura, esperar que as teles não entrem no negócio de TV por assinatura equivale a supor que o sol não vá raiar amanhã. Nos anos 1980, quase todos os radiodifusores garantiam que a TV por assinatura não iria vingar porque ninguém aceitaria pagar pela programação que já recebia de graça. O tempo mostrou que não estavam sendo muito perspicazes.


Imaginar que o modelo de televisão existente continue vigorando por muito tempo tem o peso de acreditar em duendes ou pirâmides de negócios. Hoje, quem quiser ver sete emissoras brasileiras de televisão aberta só tem que ligar seu aparelho; quem quiser ver 100 emissoras de 4 ou 5 países pode comprar um serviço de TV por assinatura a 120 reais por mês (dependendo do pacote); já quem quiser ver de graça 2.200 emissoras de 100 países (pelo menos dez dos quais o leitor mediano jamais ouviu falar) tem apenas que clicar aqui ou em dezenas de portais semelhantes – alguns dos quais, como o Terra TV, gerados do Brasil.


Desenho e empacotamento


Com um dispositivo portátil (um laptop, por exemplo) e qualquer mecanismo de comunicação wireless (uma rede WiFi ou similar), o cidadão tem tudo isso na cama. Se quiser continuar vendo a novela das 8, o problema é dele. Mas dessa obrigação, se tem computador e conexão para acessar agora o Observatório, ele já escapou.


A maneira de oferecer televisão está mudando de uma forma tão radical quanto foi a revolução dos mecanismos de distribuição de sinais (TV por assinatura) na década de 1980. Com ela, a maneira de compor televisão. A construção do conteúdo pelo usuário está no centro do que de melhor ocorre na internet nos últimos anos, como a Wikipedia. A organização desse conteúdo pelo usuário gerou a revolução do YouTube e sabe-se agora que isso é só o começo.


A Skype está avançando sobre isso na construção do Joost, um mecanismo que torna possível ter acesso a um volume quase infinito de conteúdo e atuar sobre grande parte dele. Qualquer mortal pode se habilitar a ser um dos testadores da versão Beta do Joost, simplesmente clicando aqui.


Até um poste sabe que as teles serão nos próximos dois anos players importantíssimos no negócio da distribuição (e produção) de sinais de televisão. O que muitos postes não sabem é se o máximo que o consumidor pode esperar é ver o People &Arts chegando por mais caminhos.


Muitos acham assim. Se estiverem segurando o timão, vão colocar a pique o negócio que um dia se chamou televisão. Mas se o controle cair em mãos dos que acreditam que novos mecanismos de distribuição (e também produção) impõem novas arquiteturas de desenho e empacotamento da programação, então as tecnologias emergentes poderão servir para se fazer uma televisão melhor, ou pelo menos mais contemporânea.


Produtos originais


É bom que se entenda, aliás, que ‘contemporâneo’ não é sinônimo de balançar a câmera ou parecer simpático à periferia. Contemporâneo é, acima de tudo, reconhecer o incontrolável avanço da pluralidade da criação e do consumo cultural. Um livro como A Cauda Longa, de Chris Anderson (Elsevier Editora, 2006) ajuda a entender isso. Deveria ser distribuído de graça, para quem soubesse ler, pelo universo da produção cultural, muito especialmente a televisão.


Anderson, editor-chefe da Wired Magazine, demonstra o inexorável crescimento dos mercados de nicho, em detrimento dos mega-hits. Os ‘sucessos’ contam hoje por 50% do mercado, mas já foram 90%. A outra metade é formada agora por um volume imenso de produtos (músicas, livros, programas de televisão) que atendem exatamente a quem deveriam atender: a pluralidade da sociedade manifesta por seus nichos, por suas tribos.


Imaginemos dezenas de milhões de brasileiros tão diferentes entre si que, caso se encontrassem, não conseguiriam trocar duas palavras. É bizarro imaginar que todas essas pessoas estejam consumindo o mesmo produto cultural ao mesmo tempo. O culto ao sucesso não é somente a elegia ao emburrecimento, é a busca pelo improvável e a esperança num processo permanente de lobotomização que degrada o ser humano.


O que a televisão que chega pela rede – pelas teles, pelo satélite, por toda parte – tem a oferecer não são inúmeras portas para os mesmos produtos: são inúmeras portas para produtos originais. Produtos que não são mais criados e muito menos ordenados como tem sido até agora, mas como os mecanismos contemporâneos estão possibilitando.


Dessa forma, a televisão se torna mais parecida com cada um de nós. Fala cada vez menos de cima para baixo como vem fazendo até agora. É obrigada a respeitar, para ser respeitada.


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A internet revolucionará a TV em 5 anos, diz Bill Gates


Ben Hirschler # copyright UOL/Reuters, 27/01/2007


DAVOS – A internet irá revolucionar a televisão em cinco anos por causa da explosão do conteúdo de vídeo online e da fusão dos computadores com os aparelhos de TV, disse o presidente da Microsoft, Bill Gates, no sábado(27/1).


‘Estou espantado ao ver que as pessoas não percebem que, daqui a cinco anos, todos vão rir do que temos na TV’, disse ele a líderes empresariais e políticos no Fórum Econômico Mundial em Davos, na Suíça.


A ascensão da internet de alta velocidade e a popularidade de sites de vídeo como o YouTube (da Google Inc.) já está causando um declínio mundial no número de horas gasto por jovens em frente à televisão.


E nos próximos anos, cada vez mais espectadores vão buscar a flexibilidade do vídeo online e abandonar a televisão convencional, com sua programação fixa e comerciais que interrompem os programas, disse Gates.


‘Algumas coisas, como as eleições e as Olimpíadas, realmente mostram como a TV é horrível. É preciso esperar o cara falar sobre o que nos interessa ou se perde o evento e se tem vontade de voltar para vê-lo’, disse ele. ‘A apresentação dessas coisas na internet é muito superior.’


Atualmente, assistir a vídeos em um computador é uma experiência separada daquela de assistir a programas de humor ou documentários na televisão. Mas a convergência está chegando, apresentando novos desafios para as empresas de TV e os anunciantes.


‘Como a TV está se adaptando para transmissão pela internet – e algumas grandes companhias de telefone estão criando a infra-estrutura para tanto – vamos ter esta experiência em conjunto’, disse Gates.


O co-fundador do YouTube, Chad Hurley, disse que o impacto na publicidade será profundo. O futuro promete mais comerciais direcionados, feitos especialmente para o perfil de cada espectador, segundo ele.


‘Nos próximos meses, vamos realizar experiências para ver como as pessoas interagem com esses comerciais, para criar um modelo eficaz que funcione para os anunciantes e os espectadores’, disse Hurley.


Os anunciantes já estão na corrida para adaptar suas estratégias ao poder crescente da web, e cada vez mais dinheiro da publicidade será transferido da televisão para a web.

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Jornalista