Thursday, 25 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Um dilema ético

No rastro do massacre de Newtown, você deve ter acompanhado, está um artigo que tem tido muita repercussão nas redes sociais e que ostenta o título “I’am Adam Lanza’s mother”. Nele, uma mãe devidamente identificada e nomeada relata de forma vívida seu grande sofrimento diante das manifestações agressivas de seu filho de 13 anos, com sérios problemas mentais, e basicamente o associa, publicamente, a um potencial serial killer. 

Seu desabafo parece estar diretamente relacionadoincidentes por ela vividos, como aquele em que seu filho o ameaçou com uma faca. O artigo, escrito na primeira pessoa, apresenta a foto do menino, ainda que não recente, mas não divulga seu nome.

O problema todo é que esta mãe identifica-se nominalmente neste artigo, expondo assim, com a ajuda de um jornalista da Blue Review, a intimidade de uma criança a todo o planeta. O título do artigo foi extraído de uma passagem do mesmo, pelo jornalista que o publicou, na versão que ganhou circulação viral. 

Diante dos protestos que circulam na rede pela atitude desta mulher, a mesma emitiu um comunicado, afirmando que não podia imaginar o alcance que seu artigo teria nas redes sociais. A NBC divulgou imagens onde a mesma mãe lê trechos de seu artigo-desabafo sem ser nominalmente identificada. 

Sob o tapete

Do episódio, ficam várias perguntas que, como em todas as situações que envolvem um dilema ético, são de difícil resposta: Não seria o caso de se ter mais cautela na preservação da identidade desta criança, agora estigmatizada por sua ligação a um crime que talvez jamais venha a cometer? Ou esta mãe teria prestado um serviço à sociedade, alertando-a para um risco bastante provável? 

Eu tendo a achar que nada justificaria a exposição a este nível da criança, incapaz de se defender da suspeita agora lançada. Mas sou solidário ao sofrimento desta mãe que, como milhares de outras neste planeta, com filhos com sérios problemas mentais, carregam um espinhoso quinhão, em geral sem qualquer apoio de governos ou Estados.

No justo desespero por incluir tais pessoas na sociedade, as dificuldades destes pais são colocadas para baixo do tapete na mídia. A impressão que dá é que a vida destas mães, tal como retratada pela imprensa, não tem sequer as dificuldades enfrentadas por uma mãe de uma criança dita “normal”. 

O debate é bom. Qual sua opinião? 

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[Cláudio Cordovil é jornalista em Ciência, PhD, pesquisador em Comunicação e Saúde]