Friday, 19 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Jornalistas na linha de fogo

A cobertura jornalística das manifestações, iniciadas em junho de 2013, contra o aumento das passagens de ônibus está cada vez mais perigosa. Além dos riscos para a atuação dos profissionais de imprensa, em meio a bombas de efeito moral, gás lacrimogêneo e confrontos com uso de pedras e artefatos caseiros, há outras ameaças. Repórteres, cinegrafistas e fotógrafos enfrentam a hostilidade de ambos os lados dos protestos, seja dos que se intitulam black blocs, seja da polícia.

No ano passado, segundo a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), 114 profissionais foram feridos em todo o país durante a cobertura dos protestos, sendo 23 casos no Rio. Na lista, há profissionais de todos os grandes jornais, emissoras de televisão e agências de notícias. Este ano, já houve pelo menos três casos de violência. Na quinta-feira, durante uma manifestação na Central, o cinegrafista Santiago Ilídio Andrade, da Rede Bandeirantes, foi atingido na cabeça por um rojão. Ele já passou por uma cirurgia de quatro horas e está em estado grave, segundo boletim divulgado nesta sexta-feira [7/2].

Entidades de classe estão mobilizadas e preocupadas com o aumento das agressões contra profissionais de imprensa. O presidente da Abraji, José Roberto de Toledo, ressaltou a importância da punição para os responsáveis:

– A cada protesto, mais jornalistas viram notícia por serem alvo de violência. Torço para que voltem a ser apenas os narradores e não o sujeito das reportagens. Mas, para que isso aconteça, é preciso que o Estado (Executivo e Judiciário) procure, encontre e puna os responsáveis por essa violência.

ANJ vê atentado à liberdade de imprensa

Marcelo Moreira, conselheiro do International News Safety Institute (Insi) no Brasil, entidade que trata da segurança dos profissionais de imprensa, também acompanha as investigações:

– Em muitas situações, o jornalista está sendo alvo, e não ferido por acidente. Um jornalista é um guardião da sociedade, e qualquer restrição ao seu trabalho, de qual for a origem, é um atentado aos direitos humanos. Esperamos que as autoridades brasileiras cumpram seu papel e identifiquem logo os responsáveis, para não haver impunidade.

Em nota, o vice-presidente da Associação Nacional de Jornais (ANJ), Francisco Mesquita Neto, disse que o fato constitui um grave atentado “à liberdade de imprensa, ao direito da população de ser livremente informada e ao cidadão de exercer sua profissão”. A entidade pediu que os responsáveis pelo ataque sejam punidos com todo o rigor.

A violência, segundo relatos dos profissionais, também tem sido incitada por representantes das chamadas mídias alternativas, que, muitas vezes, se colocam contra profissionais de veículos tradicionais. Por causa das ameaças, os profissionais chegam a ocultar a identificação do local onde trabalham. O repórter do GLOBO Sérgio Ramalho afirma que a hostilidade parte de ativistas mais radicais:

– O repórter passa a ocultar o crachá de identificação para evitar agressões.

O fotógrafo Marco de Paula, do jornal “Estado de S.Paulo”, tem no corpo a marca dos protestos do Sete de Setembro. Ele estava em frente ao batalhão da PM na Praça Tiradentes, quando manifestantes começaram a jogar pedras e bombas no prédio. Os PMs revidaram com gás lacrimogêneo. Uma das pastilhas incandescentes do artefato atingiu o seu antebraço esquerdo, e a queimadura deixou uma cicatriz. Na mesma semana, ele passou por outro momento de tensão, na Central do Brasil:

– Um integrante das mídias alternativas, todas engajadas nas manifestações, apontou um repórter de uma grande empresa e começou a chamar um grupo para agredi-lo. Houve tumulto.

Pablo Jacob, fotógrafo do GLOBO, foi agredido por PMs durante protesto no Dia dos Professores:

– Três PMs me abordaram de forma violenta, batendo o cassetete nas minhas costas. Um deles me deu voz de prisão e me acusou de falsidade ideológica. Disse que o meu crachá era falso e que eu não era do GLOBO. Uma advogada interveio.

O presidente da Associação Brasileira de Imprensa (ABI), Fichel Davit, também se pronunciou:

– São muito preocupantes casos como esse em que jornalistas são atingidos quando estão exercendo sua profissão A gente vê com muita inquietação, porque o papel do jornalista é informar.

A necessidade de punição exemplar para o ato violento foi destacada pelo presidente da Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), Celso Schroder:

– Precisa ser repudiado e precisa ser punido exemplarmente. Não só por entidades ligadas à comunicação, mas pela sociedade brasileira como um todo. E o Estado brasileiro precisar reagir à crescente violência contra os jornalistas.

Por nota, a Associação Brasileira das Empresas de Rádio e Televisão (Abert) pediu rigor na apuração do caso e a criação de novos métodos, que assegurem o direito da população à manifestação pacífica e respeitem o trabalho de profissionais de imprensa. O Sindicato dos Jornalistas do Rio, também por nota, condenou as empresas que não fornecem equipamentos de segurança adequados para os profissionais. A Bandeirantes informou que seus cinegrafistas, normalmente, “usam colete à prova de balas durante coberturas em áreas de conflito”. Na quinta-feira, segundo a emissora, Santiago estava a uma certa distância dos pontos de confronto. A Bandeirantes disse ainda que estão sendo apurados todos os detalhes do episódio.

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Célia Costa, do Globo