Thursday, 28 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

Propaganda não decide eleição

Seja qual for o resultado, a campanha presidencial de 2014 já terá prestado enorme serviço ao Brasil se os políticos quiserem enxergar alguns fatos que ela já produziu. Há décadas, partidos e líderes políticos fazem concessões e traem ideais e biografias (Lula no jardim de Maluf com Fernando Haddad, por exemplo) para conseguir alguns minutos a mais no horário eleitoral gratuito.

Tudo devido à crença generalizada, apesar de várias negativas da ciência e da história, de que as pessoas se deixam manipular pelos meios de comunicação de massa: quem aparecer mais tempo na TV vencerá. Não foi assim em 1989: Ulysses Guimarães tinha o dobro do tempo da propaganda eleitoral e Aureliano Chaves 60% a mais do que Lula e Collor juntos. Estes, não aqueles, passaram ao segundo turno.

Lula tinha menos tempo que Serra, em 2002, e que Alckmin, em 2006, mas ganhou as duas eleições.

Nos três exemplos, o vitorioso foi percebido pelos eleitores como quem tinha mais condições de realizar o que a maioria desejava para o futuro. Pouco importou que aparecessem menos tempo na TV.

Outra lenda é que o partido que mais gasta com marketing leva vantagem. Em 1989, o PMDB de Ulysses investiu 13 vezes mais em propaganda que o PRN de Collor e cem vezes mais que o PT de Lula.

Ainda assim, a campanha de 2014, prevê-se, será a mais cara da história porque os partidos acham que devem despender fortunas em programas de rádio e TV.

Com convicção

Neste ano, Dilma tem quase seis vezes mais tempo que Marina, e Aécio mais que o dobro que a candidata do PSB, mas só ela disparou nas pesquisas. Marina também tem sido objeto de raríssima campanha de críticas na internet e do jornalismo que torna aliados (talvez pela primeira vez) líderes da chamada “mídia progressista”, que sempre defendem o PT, e próceres do que eles chamam de “Partido da Imprensa Golpista”, que invariavelmente o atacam.

Apesar desse consenso incomum, Marina se mantém. Isso não surpreende quem acompanha a pesquisa acadêmica na área de comunicação. Em 1940 e 1944, Paul Lazarsfeld fez um pioneiro estudo metódico nos EUA sobre comportamento eleitoral e consumo de informação dos cidadãos. Sua conclusão foi que os meios de comunicação exerceram influência pequena ou nula sobre a decisão de voto das pessoas. Nos 70 anos seguintes, a literatura científica tem corroborado as suas conclusões.

Na coluna de 31 de agosto (ver “Por que a Folha não assume?“), a ombudsman desta Folha mostrou que desde 1960 o New York Times (e a maioria dos principais veículos de imprensa do país) tem apoiado o candidato do Partido Democrata à Presidência. Mas nos 14 pleitos entre 1960 e 2012, democratas e republicanos ganharam sete vezes cada. Foi a mídia que elegeu os democratas? Caso sim, por que eles não ganharam as 14 vezes?

No Brasil, o PT venceu três eleições presidenciais seguidas, apesar de o partido propalar que a imprensa o persegue. Quando um dia vier a perder, o PT vai atribuir à imprensa sua eventual derrota?

Meios de comunicação, como seu nome deixa claro, são apenas meios. O que define a preferência do eleitor é a mensagem do candidato e o quanto ele a identifica como parte de suas próprias aspirações.

Ao contrário da atitude condescendente e diminutiva com que leitores apressados e equivocados da Escola de Frankfurt tratam os cidadãos, estes sabem o que querem e não se deixam manipular.

Os eleitores podem até errar em suas decisões, mas o fazem convictos de que acertam.

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Carlos Eduardo Lins da Silva, 61, livre-docente e doutor em comunicação pela USP, é autor do livro “O Marketing Eleitoral” (Publifolha). Foi secretário de redação e ombudsman da Folha de S.Paulo