Friday, 26 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Gasto de estatais com publicidade sobe 65%

As empresas estatais controladas pelo governo federal aumentaram em 65% seus gastos com publicidade de 2000 a 2013, já descontada a inflação, alcançando no ano passado um desembolso recorde de R$ 1,48 bilhão.

A despesa total das estatais com publicidade atingiu R$ 15,7 bilhões nesses 14 anos. A Petrobras, a Caixa Econômica Federal e o Banco do Brasil responderam por 86% do investimento total.

Os valores foram corrigidos pelo IGP-M, índice de preços da Fundação Getúlio Vargas. Eles não incluem gastos das estatais com patrocínio cultural e esportivo.

O dinheiro foi destinado à promoção dessas empresas em TVs, rádios, jornais, revistas e internet. As estatais representam fatia significativa da despesa total do governo federal com publicidade.

Como a Folha revelou em abril, o governo federal despendeu R$ 2,3 bilhões com propaganda no ano passado, um recorde. As estatais foram responsáveis por 64%. Os R$ 800 milhões restantes foram gastos pela Presidência da República e pelos ministérios.

Esta é a primeira vez que o governo divulga informações detalhadas sobre gastos das estatais. Os dados só foram liberados por causa de uma decisão do Superior Tribunal de Justiça, que deu ganho de causa a uma ação movida pela Folha e pelo jornalista Fernando Rodrigues, do UOL, empresa do Grupo Folha.

Para manter sob sigilo essas despesas, a Secom (Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República) alegava que sua divulgação prejudicaria as empresas estatais na negociação com os veículos de comunicação dos valores pagos pelos anúncios.

Os dispêndios das estatais com publicidade cresceram quase todos os anos. Houve redução em 2002, último ano do governo Fernando Henrique Cardoso (PSDB), em 2003, primeiro ano do governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT), e 2007, quando teve início seu segundo mandato.

No governo da presidente Dilma Rousseff, houve uma pequena retração em 2011, primeiro ano de seu mandato, e um salto a partir de 2012.

Os dados mostram ainda que houve uma pulverização dos veículos que recebem propaganda das estatais, seguindo orientação dos governos do PT de buscar maior penetração em internet e mídia regional. Eles saltaram de 4.398 em 2000 para 10.817.

O governo diz que seu objetivo é levar a mensagem oficial ao maior número de brasileiros, e que a audiência dos veículos é o critério principal para distribuição das verbas.

Grupos

Os maiores grupos de comunicação do país aparecem entre as que mais receberam publicidade das estatais. A Secom liberou dados sobre 10 mil veículos de comunicação, sem indicar o setor em que atuam, o que dificulta a análise dos gastos e sua separação por grupo empresarial.

No topo da lista aparece a Rádio Globo de São Paulo, que recebeu R$ 4,2 bilhões nesses 14 anos. De acordo com a Secom, a maior parte desse dinheiro foi usada para pagar anúncios veiculados pela Rede Globo de Televisão.

Em seguida vêm a TV Record (R$ 1,3 bilhão), o SBT (R$ 1,2 bilhão) e a Bandeirantes (R$ 1 bilhão). O primeiro grupo da lista de empresas que não tem TV como seu principal negócio é a Abril, que recebeu R$ 298 milhões das estatais, seguida pela Editora Globo, com R$ 248 milhões.

A Empresa Folha da Manhã, que edita a Folha e o jornal Agora São Paulo, aparece em 11º lugar na lista, com R$ 206 milhões. Em seguida vem o jornal O Estado de S. Paulo, com R$ 188 milhões.

O UOL, que pertence ao Grupo Folha, aparece em primeiro lugar na lista dos portais de internet, com R$ 45 milhões em publicidade.

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Sites alinhados ao governo também foram beneficiados

Acusados pela oposição de serem financiados pelo Palácio do Planalto e o PT, sites e publicações que adotam em linhas gerais uma posição de defesa do governo também receberam recursos de publicidade das principais estatais brasileiras nestes 14 anos.

Essas publicações negam, entretanto, que tenham a sua linha editorial e seus posicionamentos influenciados pelo recebimento de recursos das estatais federais.

A CartaCapital, a revista semanal de menor circulação, aparece como destinatária de R$ 44,3 milhões. A Veja, líder do segmento, é englobada nos pagamentos direcionados para a Abril, uma das principais destinatárias da verba de publicidade das estatais, mas é impossível especificar o quanto a publicação recebeu.

Já a revista Caros Amigos, identificada com posições de esquerda, recebeu R$ 4,7 milhões.

Na internet, sites e empresas de jornalistas que se alinham do lado do governo na batalha virtual entre PT e PSDB também foram destinatários do dinheiro da publicidade estatal nesses 14 anos – entre eles Luis Nassif (R$ 5,7 milhões) e Paulo Henrique Amorim (R$ 2,6 milhões).

Um dos principais defensores do governo na internet, o site Brasil 247 recebeu R$ 1,7 milhão desde 2011.

A sua receita com a publicidade das empresas estatais dobrou em 2012 e mais do que dobrou em 2013.

Autodeclarado “o portal de esquerda”, o Carta Maior recebeu R$ 9,1 milhões de 2003 a 2013. O Opera Mundi e a revista Fórum, também ligados ao campo da esquerda, receberam R$ 2 milhões e R$ 1,7 milhão, respectivamente, no mesmo período.

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Empresas dizem que procuram fortalecer marcas

Empresas estatais afirmaram que os critérios de distribuição de suas verbas são aqueles que atendam o objetivo de fortalecimento da marca, além da diversidade.

A Secom não respondeu ao questionamento, mas sua política baseada em audiência e abrangência para distribuição de recursos é pública.

“No planejamento de mídia são consideradas cobertura, penetração e afinidade dos veículos junto ao público-alvo. O planejamento inclui tanto veículos que representam grandes grupos de comunicação, quanto os de menor porte”, afirmou a assessoria do Banco do Brasil.

A assessoria da Caixa disse que o banco leva em conta diferentes fatores, “buscando dar força à marca na mídia, através da presença em diferentes ambientes”.

Os Correios disseram usar pesquisas de mídia para averiguar as melhores formas de atingir o resultado de comunicação esperado. A Petrobras não respondeu.

Veículos de comunicação apontados pela oposição como parceiros do governo afirmam que o repasse de verbas publicitárias não tem influência sobre a linha editorial.

“A gente também bate [em posições do governo]. Temos um posicionamento: somos uma revista de esquerda. Não acreditamos no não tem um lado”, disse Wagner Nabuco, diretor-geral da revista Caros Amigos. Ele afirma que a maior fonte de renda da revista vem das assinaturas. “Sugerimos à direção da Folha de S.Paulo a leitura da CartaCapital para perceber a nossa independência”, disse a revista em e-mail.

“Os anunciantes que veiculam no 247 buscam atingir uma audiência ampla, mais de 4 milhões de visitantes únicos/mês e 581 mil seguidores no Facebook, e também influente, sem qualquer contrapartida na linha editorial”, afirmou Leonardo Attuch, criador do site Brasil 247.

O jornalista Luis Nassif disse que seu blog “é eminentemente jornalístico, sem nenhuma vinculação partidária”. Ele afirmou que a receita de publicidade de estatais e outros órgãos do governo representa metade da receita do jornal GGN, onde o blog está hospedado: “Basta ler o blog para conferir posts críticos à política econômica. O blog é eminentemente jornalístico, sem nenhuma vinculação partidária e liderado por um jornalista com 40 anos de profissão e que já conquistou todos os prêmios da categoria.”

O site Carta Maior afirmou que seu diretor estava em viagem. A reportagem não obteve resposta do blog Conversa Afiada, do jornalista Paulo Henrique Amorim, e da revista Fórum. Não conseguiu contato com o Opera Mundi.