Friday, 29 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

A causa dos professores no Paraná

Para o site G1 e para o jornal Gazeta do Povo, de Curitiba, quando diferentes governos sacrificam direitos de trabalhadores e prejudicam a educação pública, por meio de medidas de contenção econômica, não estamos necessariamente diante do mesmo fenômeno. Antes de falarem o que deve ser falado, ou seja, que trabalhadores e educadores estão na mira dos pacotes de contenção financeira, é preciso, ao menos para essas duas fontes de notícias, antes verificar qual é o partido que está lesando o interesse público. Se for o partido do governo federal, a estratégia é gritar e fazer repercutir ao máximo possível a aberração que é lesar o trabalhador e a educação – como fizeram, e precisava ser feito, na época em que as medidas econômicas do novo ministro da Fazenda atingiram em cheio o trabalhador e a educação, mesmo depois do discurso da presidente que anunciava uma pátria educadora.

Mas a desonestidade com o leitor começa quando atitudes parecidas, ou seja, o sacrifício de servidores públicos do estado e de professores em benefício de ajustes econômicos, são muito menos repercutidas por estarem sendo praticadas pelo partido contrário – no caso, o do governador do Paraná.

Em duas matérias bastante parecidas, do dia 10/02, o site G1 (ver aqui e aqui) destaca o recuo do governo do Paraná, em reunião com 37 deputados na Assembleia Legislativa, e a preservação de benefícios (palavra que causa mal estar na população desinformada, sabemos disso), que seriam derrubados pelo pacote de contenções econômica, como se esse gesto de recuar tivesse sido decidido cordialmente pelos deputados ali presentes, e não pela pressão de professores e servidores que estão lutando para não verem suas conquistas alteradas.

A “tragédia iminente”

O tom impresso pelo site leva a crer que há quase uma ingratidão por parte dos professores e servidores, afinal, para quê proporcionar aquela cena de invasão justamente quando o governo está preservando os benefícios. Mas é claro que a ordem dos acontecimentos não é essa. A própria matéria explica que havia uma pressa enorme em aprovar o tal pacote econômico que, não fosse a resistência da classe trabalhadora, derrubaria os tais benefícios tão “gentilmente” preservados. E mais: a matéria menciona, sem esclarecer, um prejuízo que o pacote desencadearia à carreira dos professores. É no mínimo frustrante não esclarecer uma das principais reivindicações de quem invadiu a Assembleia.

Por seu turno, o editorial da Gazeta do Povo de 12/02 destaca a queda de popularidade da presidente da república que, desesperada, estaria recorrendo novamente ao marqueteiro de plantão, evidenciando, o jornal, a vontade de não deixar repercutir atitudes do governo Beto Richa que, quando praticadas pelo outro lado (outro partido), devem ser transformadas em debates fomentados pela mídia.

A cereja do bolo veio na manhã do dia 13/02, quando o mesmo jornal destaca a seguinte manchete em sua versão online: “Na iminência de tragédia na Assembleia, Richa retira pacotaço”. Isso sugere, claro, que aquilo que poderia ser interpretado como uma vitória do trabalhador que lutou por seus direitos invadindo uma casa que, segundo consta, é do povo, na verdade deve ser associado, segundo o jornal, a uma tragédia iminente.

Prestar serviço a determinadas bandeiras

E não bastasse a tentativa de desmerecer a vitória parcial dos servidores e professores do estado, o periódico, por meio de seu editorial, prefere opinar sobre os acordos de paz na Ucrânia. A importância histórica desse acordo, concordamos plenamente, é de interesse universal, mas me pergunto se estaria na lista de prioridades do Gazeta caso a vitória dos trabalhadores-invasores-de-assembleias fosse contra o governo federal ou contra qualquer outro estado governado pelo PT.

A estratégia adotada por esses periódicos entristece porque revela a covardia de uma imprensa que não toma mais para si o elemento mais nobre e eficiente desse ofício, a capacidade de abalar estruturas de poder com sua liberdade.

Quando ouvimos ou lemos os poderosos meios de comunicação deste país clamando por liberdade de expressão, podemos colocar não um, mas os dois pés atrás, pois no dia-a-dia desse jornalismo que temos testemunhado a escolha já está feita, eles não querem liberdade, querem apenas prestar serviço a determinadas bandeiras.

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Cristiano de Sales é professor de Comunicação Social