Thursday, 28 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

Comunicação do governo é ‘errática’

Análise interna do Palácio do Planalto, feita pelo ministro da Secretaria de Comunicação Social (Secom), Thomas Traumann, e encaminhada à presidente Dilma Rousseff, diz que o país vive um “caos político” e que dificilmente o governo conseguirá reverter esse quadro. Segundo a avaliação, a comunicação do governo é “errada e errática”, e a presidente ficou encastelada no começo do segundo mandato. Também afirma que os aliados do Planalto estão levando uma “goleada” da oposição nas redes sociais. O texto critica ainda a escolha de Joaquim Levy para o Ministério da Fazenda e as medidas do ajuste fiscal.

O GLOBO teve acesso ao documento, que não tem a marca do governo federal nem assinatura. O texto é dividido em três capítulos _ Onde estamos, Como chegamos até aqui e Como virar o jogo. “De um lado, Dilma e Lula são acusados pela corrupção na Petrobras e por todos os males que afetam o País. Dooutro, a militância se sente acuada pelas acusações e desmotivada por não compreender o ajuste na economia. Não é uma goleada. É uma derrota por WO”, avalia.

O documento começa com uma dura avaliação da comunicação, mas diz que a crise é maior do que os erros de interlocução com a sociedade: “A comunicação é o mordomo das crises. Em qualquer caos político, há sempre um que aponte ‘a culpa é da comunicação’. Desta vez, não há dúvidas de que a comunicação foi errada e errática. Mas a crise é maior do que isso.”Mesmo admitindo o erro, a Secom cobra mais ação da militância petista, que, segundo a análise, perdeu a disputa nas redes sociais e nas ruas, desde as manifestações de 2013: “Ironicamente, hoje são os eleitores de Dilma e Lula que estão acomodados com o celular na mão, enquanto a oposição bate panela. Dá para recuperar as redes, mas é preciso, antes, recuperar as ruas.

“O segundo capítulo discorre sobre os equívocos do governo Dilma desde a eleição de 2010, criticando políticas adotadas pelo Ministério da Cultura e pela Secom, quando comandados por Ana de Hollanda e Helena Chagas, respectivamente. Diz que no início do primeiro mandato de Dilma houve um “rompimento com a militância digital”, considerada fundamental para rebater boatos da campanha eleitoral.

“A defesa ferrenha dos direitos autorais pelo Ministério da Cultura e o fim do diálogo com os blogues pela Secom geraram um isolamento do governo federal com as redes que só foi plenamente reestabelecido durante a campanha eleitoral de 2014”, afirma o documento, acrescentando que esse erro se repete neste momento. Pela avaliação, as redes sociais a favor de Dilma foram murchando a partir de novembro e hoje estão praticamente extintas.

A avaliação é que houve um descolamento entre o governo e seus apoiadores, a partir de novembro, devido à escolha de Levy e o anúncio das medidas do ajuste fiscal, com o endurecimento das regras de acesso ao seguro desemprego e a benefícios previdenciários, como a pensão por morte. O texto diz que, nas redes sociais, há uma mágoa dos eleitores de Dilma com a postura da presidente e as ações do governo após a posse: “A ausência de agendas públicas da presidenta da eleição ao carnaval, a mudança nas regras do seguro desemprego e pensão por morte, o desastrado anúncio de cortes do FIES, o aumento nos preços da gasolina e energia elétrica e o massacre nas TVs com as denúncias de corrupção naPetrobras geraram entre os dilmistas um sentimento de ‘abandono’ e ‘traição’.

“Fale mais, explique mais”

“As páginas dos deputados e senadores do PT, segundo a análise, pararam de defender o governo. Diz que o deputado Jean Wyllys, do oposicionista PSol, “tem um peso na defesa do governo maior que quase toda a bancada federal” petista. Constata ainda que a principal página do Facebook pró-Dilma não oficial, a Dilma Bolada, começou a perder fãs em fevereiro, “o que pode significar uma situação de quebra de imagem”.

Segundo o texto, as páginas oficiais do Planalto e do PT atingim apenas os aliados: “Ou seja,o governo e o PT passaram a só falar para si mesmo”. Enquanto isso, o PSDB manteve ativos os mecanismos de comunicação da campanha, nas redes sociais. Os tucanos, segundo a avaliação da secom, teria gastado R$ 10 milhões para manter esses instrumentos, mas o resultado seria positivo. Em fevereiro, a campanha da oposição teria chegado a 80 milhões de brasileiros, enquanto as páginas do Planalto e do PT, 22 milhões. “Ou seja, se fosse uma partida de futebol estamos entrando em campo perdendo de 8 a 2”, diz.

Na conclusão, o texto diz que “não será fácil virar o jogo”, mas aponta caminhos, começando por uma ação coordenada de comunicação do governo, do PT e dos partidos aliados. “A guerrilha política precisa ter munição vinda de dentro do governo, mas ser disparada por soldados fora dele”, afirma.

O documento critica o discurso adotado pelo governo e o PT nas respostas ao escândalo da Petrobras e na situação da economia brasileira, especialmente em relação à inflação. “Óbvio que essa reconquista não é apenas um trabalho de comunicação. Não adianta falar que a inflação está sob controle quando o eleitor vê o preço da gasolina subir 20% de novembro para cá ou a sua conta de luz saltar em 33%.

O dado oficial IPCA conta menos do que ele sente no bolso. Assim, como um senador tucano na lista da Lava Jato não altera o fato de que o grosso do escândalo ocorreu na gestão do PT”, diz o texto.

Avalia como positiva a entrevista da presidente, anteontem, mas diz que Dilma precisa aparecer mais:

“É preciso que a PR fale mais, explique, se exponha mais”. Também prega a unificação do “núcleo de comunicação estatal, juntando numa mesma coordenação a Voz do Brasil, as páginas de sites, twitter e Facebook de todos os ministérios, o Facebook da Dilma e a Agência Brasil”.

Além de concentrar a publicidade oficial em São Paulo, reforçando as parcerias com a Prefeitura. “Não há como recuperar a imagem do governo Dilma em São Paulo sem ajudar a levantar a popularidade do Haddad. Há uma relação direta entre um e outro”, diz.

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Luiza Damé e Simone Iglesias, do Globo