Thursday, 18 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

A bola da vez

A bola da vez agora é o ex-ministro José Dirceu. Como o mundo gira, é natural que o primeiro volte a ocupar esse lugar mais cedo ou mais tarde. A execração pública a que José Dirceu foi submetido após as denúncias de Roberto Jefferson, são comparáveis, apenas, ao que as Organizações Globo haviam feito com a imagem do então governador do Rio de Janeiro, Leonel Brizola.

A partir daquele ‘Sai daí, Zé, que você vai fazer réu um homem inocente!’, uma enxurrada de ilações, calúnias e denúncias infundadas pautaram a nossa mídia sem que uma única voz se levantasse – não politicamente, mas legalmente – contra a arbitrariedade que estava sendo cometida contra um cidadão.

Nossa mídia, que sempre se empenhou tanto na liberdade de imprensa que garante a democracia plena, pareceu bastante desinteressada dos direitos e garantias individuais dos cidadãos. Princípios básicos que balizam o direito foram substituídos pela necessidade de manter o circo das CPIs.

A grande mídia e seus operadores determinaram que todos seriam culpados até prova em contrário; opinião pessoal virou prova testemunhal e artigo de revista virou prova documental, inclusive nas mãos de uma juíza no Congresso Nacional.

Autor perdeu o direito de desistir da ação e o termo cassação política transformou-se em fundamento que justificasse condenação sem provas. Provar não era mais tarefa de quem alegava, cabia ao réu provar a sua inocência.

Mídia limpa

E choviam denúncias, desde troca de favores para obtenção de emprego para ex-mulher até envolvimento em assassinato de companheiros, sem que uma só delas viesse a ser confirmada e, mais ainda, as matérias relacionadas ao não envolvimento mereceram, no máximo, duas ou três linhas escondidas no meio daquilo que se convencionou chamar jornal.

À nossa mídia pareceu ser fácil acreditar que pronunciamento de procurador equivalia a sentença, e poderíamos perder dias aqui desfiando o rosário de absurdos jurídicos cometidos em nome da ética elitista midiática. Não é o que me interessa, até porque as OAB de São Paulo e Mato Grosso do Sul, contrariando a absoluta maioria de seus representados, e mais ainda arvorando-se no direito de sobrepor-se à vontade da população, sugeriram, por duas vezes, como entidade da sociedade civil, o impeachment do presidente que mais tarde seria reeleito pela maioria da população. Também não é importante, visto que as eleições para as regionais mostraram a vontade de grande parte dos advogados.

O que importa agora é que depois de tudo isso nossa imprensa saiu desacreditada – e não foi por fala de empenho. Há meses lutamos por uma mídia limpa aqui mesmo neste Observatório. Nem sempre os debates são cordiais, mas é inegável o fato de todos aqui queremos o melhor jornalismo, a melhor informação, a liberdade real para a imprensa nacional.

Opinião pessoal

Qual não foi a minha surpresa, depois de todo esse tempo discutindo aqui mesmo acerca do comportamento leviano de determinados jornalistas e/ou veículos de comunicação, ao deparar-me na primeira página do jornal O Globo de domingo (3/12), em matéria de Gerson Camarotti, tratando de informar a população da preocupação permanente do presidente Lula com o lobista José Dirceu, inclusive mencionando outros veículos de comunicação, o que foi prontamente desmentido por todos. 

Francamente, parece que começaremos uma nova rodada de ilações. Não acredito que a imprensa devesse tentar mais uma vez e, sinceramente, começo a acreditar que os jornalistas têm uma parcela enorme de responsabilidade no descrédito absoluto que envolveu a nossa mídia. Estamos aqui, advogados, engenheiros, comerciantes, médicos, professores, donas-de-casa e estudantes tentando reverter um quadro que é péssimo, inclusive para os próprios jornalistas. Talvez esteja na hora de um movimento interna corporis. Vão à luta, isso é um vexame.

Agora volta José Dirceu, e depois? Hugo Chávez está reeleito. E agora? Ninguém está interessado na opinião de um ou dois articulistas sobre quem é Chávez ou Morales, ou quem quer que seja. Só queremos informações. Quando quisermos a opinião pessoal de cada jornalista ou editor, faremos o que fazemos quando queremos conversar com alguém: chamamos para um chope. Se não está bom assim, pelo menos, não cobrem pelo jornal.

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Advogada (OAB/RJ 85771)