Thursday, 25 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

À espera de um furo

Confesso que estou ansioso por um furo de reportagem sobre o nebuloso parceiro do Corinthians. Não vejo o momento de bater os olhos numa manchete definitiva – daquelas que não deixam pedra sobre pedra.

Muito se falou sobre os negócios da empresa Media Sports Investiment Group (MSI). Mas, por enquanto, as notícias divulgadas pela mídia pouco efeito causaram aos envolvidos no caso. Uma centelha de indício sobre o passado e o presente do sócio da MSI, o iraniano Kia Joorabchian, tem merecido amplo destaque nos jornais, na rádios, na TV e nos sítios de notícias em tempo real.

Quem sou eu para dar lições de jornalismo a muitos profissionais que estão nas redações dos maiores veículos de comunicação do país! Mas é fato que não será dessa forma que a mídia vai desnudar a parceria MSI-Corinthians. Pautas mal apuradas têm apenas reforçado o desejo do iraniano de permanecer no Brasil. A continuar sendo fonte de matérias improdutivas, sem conteúdo, Kia vai sobreviver por muito mais tempo. Sua estada por aqui poderá ser abreviada com tiros certeiros. Nada mais que isso.

A revista Caros Amigos publicou farto material sobre a vida pregressa do sócio da MSI. Mas não o bastante para atrapalhar os projetos do iraniano no Brasil. Até agora não li (posso estar enganado) qualquer reportagem em que a fonte seja, por exemplo, o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), poderoso órgão vinculado ao Ministério da Fazenda, responsável pela investigação de crimes sobre lavagem de dinheiro no Brasil. Nada escapará das investigações de um trio que faz tremer qualquer infrator: Receita Federal, Banco Central e Coaf.

Se houver irregularidades que justifiquem, por exemplo, o cancelamento de todos os atos praticados pela MSI no Brasil, essa trinca de órgãos vai descobrir e, em conseqüência, punir os envolvidos. Mas, ao que parece, a mídia quer pegar Kia por negócios imorais. E não por atos ilegais. A ilegalidade dá cadeia; a imoralidade, nem sempre.

Desembarque planejado

A impressão que se tem é que Kia Joorabchian vai se transformar em um novo Ricardo Teixeira, um Eurico Miranda, ou Eduardo ‘Caixa D’Água’ Vianna, o polêmico presidente afastado da Federação do Rio de Janeiro, ou ainda o próprio Alberto Duailib, presidente do Corinthians. Esses dirigentes têm sido, ao longo dos anos, inocentados diariamente pela mídia esportiva. Por quê?

Porque o açodamento da maioria das reportagens envolvendo essas ‘personalidades’ levou o torcedor a tratar com descrença tudo o que se publica sobre elas. De tanto se informar sobre supostas irregularidades cometidas por esses dirigentes – e, de quebra, não conhecer o resultado dessas investigações – o torcedor brasileiro encarregou-se de inocentá-los.

As denúncias contra Ricardo Teixeira e Eurico Miranda são provas de que uma matéria mal apurada – publicada somente para alimentar rixas pessoais – serve apenas de forte munição para os acusados. Ambos os cartolas saíram imunes de grande parte das acusações que lhe foram imputadas (algumas ainda não julgadas) graças à incompetência dos que se propuseram a denunciá-los. Pode até ser que tudo o que saiu sobre esses cartolas tenha sido coisa verdadeira. Não duvido. Mas os tribunais não julgam em cima de situações subjetivas, de remoques pessoais, e sim sobre fatos concretos, com provas documentais.

O caso de Kia Joorabchian, infelizmente, parece seguir por esse mesmo caminho. Há centenas de reportagens publicadas sobre o assunto. A maioria delas expõe o iraniano como uma pessoa marcada por falcatruas no exterior, dono de várias identidades e nacionalidades etc. Ocorre que o negociador estrangeiro não aportou em nosso solo brasileiro desarmado, como tentam fazer crer algumas matérias. Kia conhecia o terreno onde se propôs pisar.

Repórteres, psiu!

Antes de escolher o Brasil para fazer seus ‘investimentos’, Kia procurou inteirar-se não somente sobre a legislação que regula a transferência de jogadores brasileiros para a Europa, como também a que trata da permanência de estrangeiros com negócios no país. Kia não nos acha bobos. O Ministério do Trabalho, por exemplo, atirou no escuro ao concluir que o iraniano não tinha condições legais para continuar no Brasil. Deu sobrevida maior ao estrangeiro. Tudo porque uma funcionária do alto escalão do governo quis aparecer mais do que as autoridades que estão cuidando do caso, como procuradores e delegados de polícia.

Para piorar, todos os dias surgem ‘fatos novos’ envolvendo o iraniano. Mas ele se mantém inatingível graças ao açodamento de parte da mídia esportiva. O silêncio de alguns veículos, necessariamente, não significa que o caso foi esquecido. Ao contrário. Pode mostrar ao leitor, por exemplo, que o veículo de comunicação parou apenas de atirar a esmo, reduzindo o número de pautas mal apuradas. Que o pior (para os envolvidos na parceria corintiana, claro) está por acontecer.

O silêncio pode, sim, começar a preocupar Kia e seu grupo. Enquanto o estrondoso furo jornalístico sobre a MSI não é publicado – aquele que levará, de fato, a parceria para o fundo do buraco –, Kia apenas se fortalece com as notícias aparvalhadas do dia-a-dia. Portanto, repórteres, psiu! Muito barulho por nada pode acordar (e armar) aquele que é visto como o inimigo número 1 do futebol brasileiro. Só não vale hibernar como os ursos.

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Jornalista em Brasília