Friday, 26 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Agora é caso de polícia

A Polícia Federal (PF) e o Ministério Público Federal (MPF) em São Paulo vão investigar os indícios de irregularidades contábeis cometidas pelo PanAmericano, que culminaram no rombo de R$ 2,5 bilhões no banco. A PF instaurou inquérito para apurar a eventual prática de crimes contra o Sistema Financeiro Nacional, como gestão fraudulenta, prestação de informações falsas aos órgãos competentes e inserção de elementos falsos em demonstrativos contábeis. O procedimento de investigação está a cargo da Delegacia de Repressão a Crimes Financeiros (Delefin), da Superintendência Regional de São Paulo, e foi aberto com base no fato relevante divulgado pelo PanAmericano, na terça-feira [9/11], e na nota divulgada pelo Banco Central (BC), na quarta-feira.

O Ministério Público também abriu um procedimento investigatório criminal. A condução do inquérito pelo MPF ficará a cargo dos procuradores da República Rodrigo Fraga Leandro de Figueiredo e Anamara Osório Silva. Anamara também foi autora da denúncia que levou à condenação o banqueiro Edemar Cid Ferreira e seu sobrinho, o diretor financeiro-administrativo Ricardo Ferreira de Souza e Silva, por tentativa de bular a lei em caso ligado à falência do Banco Santos.

Ao detectar que havia inconsistências financeiras nos balanços do banco PanAmericano, em agosto deste ano, o Banco Central começou uma busca por informações em outras instituições, sobretudo as que tinham comprado carteiras de crédito do banco controlado pelo Grupo Silvio Santos. A autoridade monetária fez uma espécie de varredura nesses números para dimensionar a provável fraude. Entre as instituições às quais foram solicitadas informações estão bancos no topo do ranking nacional, assim como instituições de médio porte.

O objetivo da varredura era fazer um cruzamento de dados e bater todas as informações dos dois lados: do PanAmericano e dos compradores das carteiras.

BC diz que poderá aperfeiçoar análises

A cessão de carteiras é uma operação normal de mercado. Os financiamentos concedidos são ativos dos bancos e valem dinheiro – o pagamento do crédito concedido. Ao repassar a terceiros, a instituição detentora daqueles créditos antecipa o recebimento dos recursos, que se transforma em capital novo para empréstimo.

Segundo o BC, até setembro passado, foi vendido o equivalente a R$ 42,9 bilhões no país em carteiras de crédito. Ao todo, foram 55 bancos que venderam suas carteiras a outras 36 instituições financeiras. O volume total negociado, ainda segundo o BC, equivale a apenas 2,6% do saldo total de crédito no mercado nacional, que, também em setembro, era de R$ 1,6 trilhão. Por causa do sigilo bancário, o BC não informa quais foram os bancos que negociaram essas carteiras de crédito.

O BC detectou que há indícios de fraude nessas operações feitas pelo banco do Grupo Silvio Santos e que, ao todo, somam quase R$ 2,1 bilhões. O rombo total chegou a R$ 2,5 bilhões porque envolveu problemas também com cartões de crédito, no valor de R$ 400 milhões.

O PanAmericano continuava contabilizando em seus ativos as carteiras de crédito que não mais lhe pertenciam, depois de vendê-las a outras instituições, inflando seus resultados. Além disso, vendeu uma mesma carteira de crédito a mais de uma instituição, igualmente gerando caixa de forma artificial. A desconfiança maior é que isso tenha sido feito para melhorar o bônus da cúpula do banco.

As análises do BC duraram cerca de um mês. A maquiagem operada no balanço pelos supostos fraudadores foi bem sofisticada, indicando que havia muito conhecimento contábil para evitar rastros.

Toda a cúpula do PanAmericano, como seus ex-diretores, alguns conselheiros e administradores, está sendo investigada pelo BC. O material coletado já seguiu para o Ministério Público Federal.

Com o problema detectado, e solucionado com o empréstimo de R$ 2,5 bilhões feito pelo Fundo Garantidor de Créditos (FGC) ao Grupo SS – todas as empresas do apresentador de TV e empresário Silvio Santos, incluindo o canal de televisão SBT, foram dadas como garantia –, o BC passou a fiscalizar normalmente o sistema financeiro.

A autoridade monetária admite que, com esse episódio, poderá aperfeiçoar as regras e metodologia de análises.

O BC considera a solução dada para evitar a quebra do PanAmericano perfeita, porque não causou prejuízos ao FGC nem aos acionistas do banco, como a Caixa Econômica Federal, dona de 49% do capital social do PanAmericano.

A avaliação do BC também é que, apesar do que ocorreu com o PanAmericano, não existe nenhum indício de que outros bancos – inclusive de pequeno e médio portes – estejam com problemas de solvência. Ou seja, a solidez do sistema financeiro nacional continua intacta.

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O comunicador que quis ser presidente

Zean Bravo

Nascido no Rio de Janeiro em 12 de dezembro de 1930, Senor Abravanel tornouse nacionalmente conhecido como Silvio Santos. Administrador de empresas e um dos maiores comunicadores da televisão brasileira, o dono do SBT começou a trabalhar como camelô aos 14 anos, vendendo capas de plástico para documentos e canetas-tinteiro.

Com seu inegável carisma, logo chegou ao rádio, voltando depois ao trabalho nas ruas.

Aos 18 anos, integrou a Escola de paraquedistas, do Exército, em Deodoro, no Rio de Janeiro. Anos mais tarde, Silvio foi para a televisão, adaptando o formato dos shows e sorteios que realizava no circo.

Sua estreia no vídeo foi com o programa Vamos brincar de forca, de 1962, exibido pela TV Paulista. No fim da década de 1960, o comunicador levou seu Programa Silvio Santos para a grade da TV Globo.

O ano de 1975 foi importante na trajetória profissional do empresário. O então presidente Ernesto Geisel assinou o decreto 76.488, outorgando a Silvio Santos o canal 11 do Rio de Janeiro. Silvio passou a transmitir seus programas simultaneamente na Tupi e na TVS (TV Studios). Após a falência da Rede Tupi, em 1980, o ‘Programa Silvio Santos’ foi transferido para a Rede Record, em São Paulo.

Nos primeiros anos da década de 1980, Silvio chegou a ser dono de 50% da emissora do empresário Paulo Machado de Carvalho.

Com tino para os negócios, o apresentador já pretendia investir numa rede nacional de TV. Em agosto de 1981, entrou no ar o Sistema Brasileiro de Televisão (SBT).

Em 1988, Silvio resolveu transitar na seara política e se candidatou ao cargo de prefeito de São Paulo, em anúncio feito em um de seus programas. Mas a candidatura não foi adiante. Um ano mais tarde, encaminhou sua candidatura ao governo do estado de São Paulo, mas mudou de planos e se lançou candidato a presidente. A iniciativa, porém, acabou fracassada. A candidatura foi impugnada pelo Tribunal Superior Eleitoral, por irregularidades no registro do PMB.

Após a frustrada iniciativa política, Silvio voltou-se para seus negócios. Em fevereiro de 2001, o comunicador recebeu homenagem da escola de samba carioca Tradição. Sua trajetória foi contada no enredo ‘Hoje é domingo, é alegria. Vamos sorrir e cantar!’. O apresentador desfilou como destaque em um carro alegórico.

Em agosto desse mesmo ano, Silvio passou por momentos de sofrimento quando, no dia 21, sua filha Patrícia Abravanel foi sequestrada na porta da própria casa, no Jardim Morumbi, em São Paulo. Após um período de negociação, o resgate foi pago e a jovem, libertada. Perseguido pela polícia, o sequestrador Fernando Dutra Pinto ficou foragido. E invadiu a casa de Silvio Santos em 30 de agosto. O apresentador estava se exercitando em sua academia particular quando sua casa foi invadida. Pinto manteve toda a família refém. O próprio Silvio se empenhou em contornar a situação. Para liberar seus outros familiares, ele ficou em cativeiro em sua própria casa durante sete horas. A situação só se resolveu quando o então governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, entrou pessoalmente na negociação.

O caso mudou a rotina do empresário.

Dono do Grupo Silvio Santos, que engloba negócios como o Baú da Felicidade e o problemático banco PanAmericano – que sofreu um rombo de R$ 2,5 bilhões –, o comunicador apresenta atualmente seu programa de gincanas nas noites de domingo, no SBT.

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Repórteres de O Globo