Friday, 19 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Ampliar espaços para conscientizar a sociedade

Nos dias 17 e 18 de agosto de 2008, aconteceu em São Paulo (SP) a sétima edição do ‘Congresso Brasileiro de Jornais’, oportunidade em que a jornalista Clarice López de Alda, diretora do Comitê de Responsabilidade Social da Associação Nacional de Jornais, abordou a longa caminhada rumo à conscientização do setor de jornais para a importância do tema ‘sustentabilidade’ em todas as suas nuances e implicações. O assunto originou o artigo ‘Jornais precisam unir reflexão e prática nas suas ações de responsabilidade social’, escrito por Fátima Cardoso para o Instituto Ethos, divulgado pela revista digital de Envolverde e reproduzido neste Observatório (ver aqui).

Segundo declarou à jornalista Fátima Cardoso, Clarice de Alda acredita que a responsabilidade social não pode se resumir a investimento social privado. ‘E nós precisamos discutir responsabilidade social na dimensão exata do que seja responsabilidade social empresarial: sob a perspectiva da sustentabilidade. E esse é um exercício que passa, necessariamente, pela reflexão interna que possa verificar como o setor atua em termos de responsabilidade quanto aos conteúdos que oferece à sociedade.’

Ações relevantes e desconhecidas

Para Clarice, este é o momento certo para construir e entregar ao setor de jornais uma ferramenta que ajude seus gestores na construção de mudanças essenciais à prática da sustentabilidade sob a perspectiva não apenas do negócio, mas também de mercado, sociedade e planeta. Ela revela já haver jornais associados que demonstraram entender que a proposta visa auxiliá-los a pensar melhor sobre seu próprio desempenho e, conseqüentemente, sua sustentabilidade e responsabilidade social.

De acordo com o artigo, as empresas brasileiras de comunicação geralmente restringem seu envolvimento com o tema ‘responsabilidade social’ a editoriais que publicam. Ou seja, elas se vêem responsáveis por retratar práticas boas ou ruins identificadas em vários segmentos da sociedade, mas não exercitam o mesmo em seu próprio funcionamento enquanto empresas.

Clarice declara que muitas empresas de comunicação já desenvolvem ações incorporando conceitos de responsabilidade social em sua gestão. Estão se modernizando, refletindo sobre novos conceitos e mudando algumas práticas. Finaliza dizendo que ‘todos os segmentos produtivos que buscam longevidade estão hoje reconhecendo e trabalhando na melhoria de seu impacto, de seu relacionamento social. Disso depende o tamanho e relevância da sua presença no mundo de hoje e do futuro’.

Portanto, a meu ver, os meios de comunicação precisam colocar em suas pautas, por que não até de primeira página, temas que contribuam para uma formação mais ampla do leitor. Na sociedade, há inúmeras pessoas desenvolvendo ações de grande relevância que são desconhecidas. Como é o caso da experiência da médica Lucia Cerqueira Gomes, que trabalha com doentes terminais e originou um artigo recente da Folha de S.Paulo. Há uma releitura dele neste blog e ainda outros temas como exemplo, susceptíveis de destaque em veículos midiáticos.

Qualidade e capacitação

‘A responsabilidade social da mídia para o desenvolvimento sustentável da sociedade’ foi um dos temas discutidos na Conferência Internacional Ethos 2008. Segundo a jornalista Sucena Shkrada Resk (Planeta Sustentável, 27/5/2008), o debate chegou a um consenso de que hoje é iminente um maior empenho nas mudanças de paradigmas, em que o aspecto econômico da empresa não sobressaia à sua função social, em detrimento da qualidade de vida dos profissionais e da democracia das informações.

Sucena cita Pollyana Ferrari, professora de Jornalismo e Multimeios da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC), que diz: ‘A grande mídia não tem feito a lição de casa direito. Hoje existem mais de 260 mil blogs que tratam do tema responsabilidade social em língua portuguesa e, na mídia, o espaço é efêmero, e tende a priorizar catástrofes e animais.’

Conforme relata a jornalista Sucena Resk, o diretor de jornalismo da TV Cultura, Júlio Moreno, considera que, no caso das emissoras públicas, o exercício da responsabilidade social se torna mais presente. Ele diz que a TV Cultura, por exemplo, admirada pela postura ética, realizou um trabalho pioneiro nos anos 1990 em relação à sustentabilidade, ao cobrir a ‘Eco 92’. Dessa iniciativa surgiu o programa Repórter Eco, que até hoje está no ar e tem a supervisão editorial do respeitado jornalista Washington Novaes, que enfatiza a cidadania.

‘Falta educação dos conglomerados da comunicação quanto ao tema. Não existe curso para cobrir responsabilidade social. O profissional tem de procurar sozinho o caminho’, considera a jornalista Pollyana Ferrari. Para complementar, Júlio Moreno revela que, para manter a qualidade, é preciso capacitação. Para isso, a TV Cultura começou a promover workshops internos com temas como sustentabilidade.

Inserções nas telenovelas

Na verdade, há leitores que muitas vezes se sentem angustiados com as primeiras páginas do jornal. Há sempre uma sede das empresas de comunicação pelos acontecimentos que mais vendem o veículo. Questões a respeito da classe política, crimes e tragédias, desencontros da economia e gols do futebol dificilmente deixam de compor o elenco das manchetes jornalísticas. Será tão impossível, ao menos algumas vezes por semana, transformar também em manchete temas que possam amenizar angústias e/ou efetivamente provocar mudanças de hábitos das pessoas fazendo-as agir como verdadeiros cidadãos? De que adianta apenas bombardear o leitor com calamidades e desesperanças? É preciso contrabalançar os diversos tipos de notícias.

Penso que um entendimento mais amplo dos termos ‘responsabilidade social’ e ‘sustentabilidade’ passa pela questão de se trabalharem, na base, informações específicas, que possam contribuir para formar consciências de inúmeros leitores.

Depositar irresponsavelmente lixo nas ruas pode parecer algo sem grande relevância. Pessoas sobrevivendo de esmolas nas ruas, fazendo das calçadas os seus aposentos noturnos, também é outro fato sobre o qual poucos têm sensibilidade para refletir. Pensar em sustentabilidade passa primeiro por atitudes individuais, por atitudes no edifício em que se mora e na empresa em que se trabalha. Pensar em sustentabilidade não é apenas comentar com os outros os conteúdos lamentáveis que compõem o noticiário e apontar o dedo para o que há de errado. Sustentabilidade requer ação individual, ação do jornal, ação de todos os segmentos da sociedade.

É neste sentido que, acredito, deva estar também a preocupação dos veículos de comunicação. E vou até mais além: a preocupação das novelas de redes de televisão, inserindo em suas estórias ao menos algum personagem que possa transmitir com freqüência algo instrutivo para a população.

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Jornalista