Friday, 26 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Após denúncia, NYT vira alvo de críticas

O artigo do New York Times sobre a espionagem de cidadãos americanos autorizada por George W. Bush pegou mal para o presidente, mas também não caiu tão bem para o jornal. A denúncia, assinada pelo repórter James Risen, é grave. Com aprovação do governo federal e sem mandados judiciais, a Agência de Segurança Nacional (NSA, sigla em inglês) investiga, desde outubro de 2001, telefonemas e correspondências de moradores dos EUA com pessoas no exterior. O objetivo, justifica o governo, é evitar novos ataques terroristas.


A notícia despertou críticas de todos os lados – e para todos os lados. Bush reclamou da atitude do jornal, dizendo que, ‘como resultado, nossos inimigos tiveram conhecimento de informações que não deveriam ter’. ‘A revelação não-autorizada deste esforço prejudica nossa segurança nacional e coloca nossos cidadãos em risco’, disse o presidente. Washington foi tomada por discussões a respeito dos grampos, com políticos democratas e republicanos dizendo que foi um erro de Bush autorizar a investigação da NSA sem a permissão de um tribunal especial.


Na berlinda


O próprio Times entrou no debate; não como participante, mas como objeto de discussão. Em nota, o editor-executivo Bill Keller afirmou que o jornal tinha a história engavetada há mais de um ano a pedido de funcionários do governo, que alegavam que a divulgação da notícia poderia ser ‘útil’ para os terroristas. Keller diz que o jornal concordou em não publicar a matéria naquela ocasião, mas continuou a apurar a história. O texto publicado na semana passada não incluiu detalhes técnicos que, segundo o Times, poderiam prejudicar o trabalho do governo e beneficiar terroristas.


Políticos e parte da imprensa americana questionam os motivos que levaram o jornalão nova-iorquino a só agora dar a matéria. Um dos supostos motivos seria a publicação, em janeiro próximo, do livro State of War. De autoria de James Risen – mesmo repórter que assina a matéria no jornal –, o livro traria a informação sobre os grampos autorizados por Bush. Alguns críticos dizem que o Times resolveu divulgar a informação agora para promover o livro de seu funcionário; outros defendem que o jornal quis evitar ser furado por seu próprio repórter.


Já alguns conservadores sugerem que a data de publicação escolhida pelo Times teve como objetivo persuadir membros do Congresso a fazerem oposição à renovação do Patriot Act, lei federal antiterrorismo que dá poderes ampliados à polícia e a forças de segurança nacionais no combate ao terror. Outro motivo seria ofuscar um período relativamente positivo para Bush, com as eleições no Iraque.


Keller refuta estas alegações. ‘A publicação [da matéria] não foi coordenada com a eleição no Iraque, com o debate sobre o Patriot Act, com o livro de Jim [Risen] ou com qualquer outro evento’, afirma ele. ‘Nós publicamos a matéria na data em que publicamos porque, depois de muito trabalho duro, ela estava bem apurada, checada e pronta, e porque, após ouvir respeitosamente às objeções do governo, estávamos convencidos de que não havia uma boa razão para não publicá-la.’


Sugestão de ilegalidade


Segundo artigo de James Rainey no Los Angeles Times [20/12/05], dois jornalistas do NYT, que pediram para não ser identificados, afirmaram que alguns editores do jornal consideraram divulgar a história antes da eleição presidencial de novembro do ano passado, que levou Bush a assumir seu segundo mandato. Depois da decisão por segurá-la, as discussões sobre ela recomeçaram após as eleições, com pressões por parte de Risen e do repórter Eric Lichtblau, co-autor da matéria, pela publicação. ‘Quando [os editores] viram que a história ia sair no livro, de qualquer maneira, eles concordaram em publicá-la’, afirmou um dos jornalistas.


O rival Washington Post foi um dos que questionaram as motivações do Times. Na matéria de Risen, não é explicado aos leitores por que a informação só foi revelada agora. O livro do jornalista também não é citado. O sítio CounterPunch, em artigo assinado por Alexander Cockburn e Jeffrey St. Clair [17/12/05], afirma que a matéria publicada pelo jornalão, por mais que seja comprida, é fraca. Além da polêmica revelação do grampo, não há nada, diz o texto, que justificasse um ano de apuração por parte dos repórteres. O modo como as informações são colocadas na matéria também foi questionado. Segundo Cockburn e St. Clair, reportagem publicada pelo Post logo em seguida é muito mais incisiva, enquanto a do Times apenas sugere, e só no terceiro parágrafo, a ilegalidade da investigação autorizada por Bush. Com informações de Paul Farhi [Washington Post, 17/12/05], AP [17/12/05], CNN [16/12/05] e Jonathan Alter [Newsweek, 19/12/05].