Thursday, 18 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Brasil e Irã, mudança de rumo

Os jornais de sexta-feira (25/3) fazem um grande barulho em torno da decisão brasileira de apoiar a resolução da ONU de investigar violações de direitos humanos no Irã. O assunto é destaque em todos os principais jornais do país, que fazem questão de comparar a decisão da presidente Dilma Rousseff com as posições adotadas rotineiramente por seu antecessor, Lula da Silva, cuja diplomacia evitava interferências em assuntos internos de outros países.


A mudança não deveria surpreender os analistas, uma vez que a presidente tem um perfil ideológico e uma biografia muito diferentes em relação a Lula da Silva. Era mais ou menos esperado que em algum momento ela tornasse explícito o princípio segundo o qual atentados contra os direitos humanos são um tema que interessa a toda a humanidade.


Mesmo que o governo seja induzido a tolerar muitas contrariedades em função da necessidade econômica de preservar boas relações com parceiros comerciais, há sempre o ponto de ruptura.


Nó a desatar


No caso do Irã, mandar um observador da ONU investigar a situação das garantias individuais é uma iniciativa que não deve provocar grandes crises de relacionamento, apesar de a imprensa ter noticiado que o governo do Irá acusa o Brasil de ‘dobrar-se’ aos interesses dos Estados Unidos.


Uma das dificuldades do relacionamento comercial com países com governos autoritários é justamente o risco da contaminação. A nova postura do governo brasileiro, explicitamente aprovada pela imprensa, pode também revelar que o Brasil reduz sua dependência de certos mercados onde a sensibilidade política pode prejudicar objetivos mais relevantes.


O que não está dito claramente nos jornais é que para o Brasil não basta ser um protagonista importante no cenário econômico, tanto como destino de investidores como no papel de fornecedor de mercadorias. Para assegurar uma posição de destaque no mercado global, o país precisa também ser reconhecido entre as nações mais influentes e ter participação de destaque nas instituições multilaterais.


Esse é o nó que a presidente começa a desatar com a decisão sobre o irã.


 


Com foice, sem martelo


Demorou, mas o relator do projeto sobre o Código Florestal, deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP), começa a admitir mudanças em sua proposta. Credite-se aos jornais parte dessa decisão, uma vez que a chamada grande imprensa não deixou o assunto desaparecer de vez.


Reportagens sobre algumas discordâncias do governo com relação a certas mudanças no projeto obrigaram o deputado a se manifestar. No entanto, ele ainda insiste em tornar inócuas as regras que punem desmatadores e pretende conservar no texto a permissão para ocupação das áreas às margens dos rios.


Pode parecer a alguns leitores que o parlamentar não tomou conhecimento dos alertas feitos por milhares de cientistas, das manifestações de milhões de cidadãos ao redor do mundo e do consenso geral segundo o qual todas as atividades humanas precisam se adaptar à urgência de preservar o patrimônio natural, como condição para a manutenção da vida humana no planeta. Ele segue dando sinais de seu total engajamento aos interesses privados de parte dos produtores rurais e não se abala com evidências e argumentos.


Comunista atípico


Os principais jornais do país parecem adotar uma posição favorável a um debate mais amplo, não aceitando as mudanças propostas por Rebelo, claramente inspiradas pela bancada ruralista no Congresso Nacional.


Mas há um ponto de divergência sobre o qual parece não haver possibilidade de acordo. Trata-se das multas por desmatamento abusivo, que o deputado pretende ver anuladas. Segundo o Estado de S.Paulo, 90% dos proprietários rurais do país estão na ilegalidade, e pesa sobre eles o decreto presidencial que a partir de junho passará a autuar quem não cumprir a legislação ambiental.


A proposta de Aldo Rebelo pretende premiar aqueles que forçam o fato consumado na certeza de que, ao final, serão anistiados da dívida. Acontece que o governo federal, segundo a imprensa, não aceita esquecer os danos já causados pelos desmatamentos.


Aldo Rebelo foi eleito na bancada de um partido que apóia o governo mas recebeu doações de empresas do agronegócio em sua campanha eleitoral. Trata-se de um comunista atípico: tem a foice, mas não o martelo.