Friday, 19 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Carlos Eduardo Lins da Silva

‘John Pilger é uma espécie de Mike Moore australiano. Jornalista, faz documentários para cinema e TV e escreve para diários e semanários britânicos e de seu país. Sempre com um alto tom de engajamento político em defesa de causas da agenda da esquerda tradicional.

Nessa condição, tornou-se uma das vozes mais agressivas contra a invasão do Iraque pelos Estados Unidos em todo o mundo. Como Moore, virou um militante da campanha contra Bush (e contra o premiê australiano, John Howard, que foi um dos pouquíssimos chefes de governo além de Tony Blair que se alinharam integralmente com Bush).

‘Os Novos Senhores do Mundo’, que acaba de ser lançado no Brasil pela editora Record, é um exemplo bastante completo do estilo de Pilger. Pessoas como ele são necessárias para o debate público pela convicção com que defendem seus pontos de vista. Mas nem sempre a qualidade das informações que publicam passa por um exame rigoroso.

O livro é composto por quatro capítulos, dedicados a bestas do apocalipse contemporâneo, como a comunidade das organizações financeiras multilaterais (FMI, Banco Mundial) e a santa aliança entre a Casa Branca e Downing Street 10 no século 21.

Certamente, Pilger está quase sempre certo nas posições que defende, de resto compartilhadas pela imensa maioria da opinião pública mundial. O problema com o livro é a contaminação do jornalismo pela propaganda. O autor não está apenas construindo argumentos contrários às posições de Bush, Blair, Howard e outros. Ele pretende estar relatando fatos que comprovam a correção de tais argumentos.

Muitas vezes os fatos descritos são públicos, incontestáveis e bastariam para dar base à lógica desenvolvida pelo autor. Mas ele parece não se satisfazer com pouco, quer requintar com detalhes abomináveis a crueldade de seus inimigos ideológicos e, para tanto, quase sempre lhe faltam evidências conclusivas. Mesmo assim, Pilger mantém todas as acusações indiferenciadamente.

É verdade que Pilger quase sempre se documenta, faz ouças afirmações completamente gratuitas, ao contrário de muitas figuras menores que se comportam como ele. Mas uma declaração de um ex-ministro paquistanês à BBC de que ele havia sido informado por fontes americanas não especificadas, por exemplo, é a única prova oferecida para atestar que em julho de 2001 (antes dos atentados terroristas de Nova York e Washington, portanto), o governo americano já havia se decidido a invadir o Afeganistão.

Assim ocorre em diversas outras situações: trechos de ‘um documento de informação entregue a Bush’ sem que se diga quem redigiu tal documento, a opinião de um acadêmico notoriamente ligado à esquerda, artigos de colegas são outros indícios considerados definitivos para atestar alegações da mais alta gravidade.

‘É um tipo de jornalismo que insinua, dá a entender, escolhe um ou outro judas e recua’, afirma Pilger para atacar erros cometidos pela grande imprensa americana e britânica (especialmente ‘Observer’ e ‘The New York Times’) na cobertura dos acontecimentos posteriores ao 11 de setembro de 2001. Ele tem razão. Mas o comentário poderia ser aplicado com igual justiça a muitos dos seus próprios textos.

Aliás, diversos parágrafos do livro são gastos em críticas a jornalistas, classificados como alguns dos principais responsáveis pela política externa belicosa da dupla Bush e Blair, num aparente acerto de contas entre coleguinhas que desmerece a maior parte de ‘Os Novos Senhores do Poder’, que apesar de todas as restrições e discordâncias possíveis é um trabalho sério.

Lamentavelmente, o livro sai no Brasil desatualizado. Originalmente publicado em 2002, um de seus capítulos tem como premissa importante o que ainda era uma hipotética (embora muito previsível) invasão do Iraque pelos americanos e britânicos. Apesar de não comprometer a linha geral do raciocínio (por sinal às vezes pesado e tortuoso pelo excesso de saltos cronológicos e mistura de lembranças pessoais com narrativa em terceira pessoa), esse atraso histórico provoca desconforto ao leitor.’



LÍNGUA VIVA
Deonísio da Silva

‘Presença do latim no português’, copyright Jornal do Brasil, 23/02/04

‘Diz-se que o latim é língua morta. Na internet, encontramos um sítio ou ‘saite’, em latim. É o ‘Situs interretialis fautoribus Passionis, illa Productio Icon a Mel Gibson confecta’ (Sítio ou ‘saite’ dos fãs do filme ‘A PAIXAO DE JESUS CRISTO’ da Icon Production, de Mel Gibson).

O latim morreu? Depende do ponto de vista. Um dos melhores exemplos são as encíclicas. Foi o papa Bento 14 quem, em 1840, cunhou a expressão littera encyclica, carta circular, depois reduzida a encíclica apenas. Designa documento que periodicamente o Sumo Pontífice envia a toda a cristandade. É publicado primeiramente em latim e depois em muitas outras línguas. Em caso de dúvida nas traduções, recorre-se ao original latino. Sua influência sobre a sociedade e a cultura dispensa comentários.

Várias outras palavras e expressões latinas são transcritas literalmente no português e invocadas com freqüência, pois integram o arsenal de nossas palavras. A priori, presente em tantos textos, designa conhecimento admitido previamente, dispensando a experiência. Surgiu na Idade Média e servia aos filósofos para eximi-los de justificar certas afirmações, de que é exemplo a admissão de que nosso intelecto aceita certas categorias previamente, como o tempo e o espaço. Seu contrário é a posteriori, que identifica argumentos, provas, raciocínios e demonstrações que, a partir de fatos, leve a conclusões gerais e se baseiam na experiência.

Outro exemplo é apud, invocado como principalmente nas citações bibliográficas. Apud quer dizer junto a. Significa que o autor encontrou apoio em outro texto e dele extraiu seu argumento.

O crítico literário Fábio Lucas narra episódio que envolve escrivão de cartório muito cioso de seus conhecimentos em latim, ainda que precários. Um advogado apressado chega ao fórum e pede um processo. O escrivão demora a encontrá-lo. O advogado identifica a pasta no meio de uma torre de papel e começa a puxá-la. É interrompido pelo escrivão: ‘a fortiori, não’. A expressão latina significa que determinado argumento é ainda mais forte que os já referidos. O escrivão entendeu que era apenas ‘à força’.

Idem, o mesmo, e ibidem, no mesmo lugar que têm o fim de evitar repetições, são outros exemplos. Com eles brincou o Barão de Itararé, imaginando tabela de preço num açougue em que a carne custava um tanto; a carne com osso aparecia como ‘idem, com osso’, seguida de ‘ibidem, sem idem’, designando, certamente em insólito eufemismo, apenas o osso.

Ipsis litteris e ipsis verbis também aparecem com freqüência, principalmente em textos jurídicos. São invocadas para reforçar a argumentação com as ‘mesmas letras’ ou as ‘mesmas palavras’ utilizadas por outros autores. Também ad hoc ( para isto) é expressão muito utilizada.

O professor Cláudio Moreno explica que a preposição e o pronome latinos podem ser usados ‘para criticar uma regra ou uma solução que tenha sido criada especificamente para resolver um problema que não se consegue enfrentar com um determinado princípio ou teoria’. E dá o seguinte exemplo: ‘O governo está cometendo o equívoco de tentar deter o défice comercial com uma medida ad hoc, que só pode ser temporária e não vai resolver o problema’. O professor aportuguesou outra palavra latina de largo uso no português: deficit, terceira pessoa do singular do presente do indicativo do verbo deficere, faltar. Seu contrário é superavit, que os dicionários registram com acento: superávit. No latim é a terceira pessoa do singular do pretérito-perfeito, significando ‘superou’.

Ipso facto (pelo mesmo fato), o latim não é língua morta, quod erat demonstrandum (o que era preciso demonstrar).’



DESGRAÇA REAL
O Globo

‘Família real defende Harry’, copyright O Globo, 21/02/04

A família real britânica está furiosa com a colunista Carol Sarler, do jornal inglês ‘Daily Express’, que classificou o príncipe Harry, filho mais novo do príncipe Charles com Diana, como uma ‘desgraça nacional’. O motivo, segundo a colunista, são as farras do príncipe em boates da Austrália e do Lesoto, país africano, e a folga de um ano que tirou passeando entre a África e a Oceania. A assessoria do príncipe Charles disse que ele enviou uma carta furiosa à jornalista, referindo-se aos ataques a Harry como injustos e sem sentido.

— Entendo que os colunistas sejam pagos para manifestar suas opiniões com vigor mas o artigo intitulado ‘O mimado e preguiçoso Harry é ímpar’ foi grosseiramente incorreto e desinformado — declarou o secretário de comunicação de Charles, Paddy Harverson.

Harry, de 19 anos, já causou polêmica ao se envolver com drogas e bebidas alcoólicas há alguns anos. Atualmente o príncipe está no Lesoto, após passar três meses na Austrália em um ano sabático que decidiu tirar antes de começar a faculdade.

Na quarta-feira, a jornalista começou sua coluna dizendo: ‘Que o príncipe Harry é uma desgraça nacional não é novidade. Suas façanhas têm sido manchetes há anos: a bebedeira, o uso de drogas, a vadiagem, o desperdício da mais cara educação do país, o explícito desdém pelas classes inferiores, as crescentes travessuras sexuais em público. Nós já vimos tudo isso, já ouvimos tudo isso.’

A colunista disse que Harry passou o tempo na Austrália em frente da TV e se comportando mal nas partidas de rúgbi. Na África, ele era figura fácil em festas de boates e teve que ser convencido, com muito custo, a gastar um pouco do tempo de viagem visitando pessoas carentes. O assessor de Charles rebateu os comentários:

— Na Austrália, Harry passou a maior parte de seu tempo trabalhando sob altas temperaturas numa fazenda de gado, onde os empregadores o consideram um trabalhador consciente e tenaz. Na África, Harry insistiu em trabalhar em projetos para crianças carentes e suas famílias em vez de fazer visitas ao estilo dos VIPs. Foram opções corretas.’



FONTES NO POST
O Globo

‘‘Washington Post’ muda regras para citar fontes’, copyright O Globo, 21/02/04

‘WASHINGTON. O jornal americano ‘The Washington Post’ estabeleceu novas diretrizes para o uso de fontes confidenciais e declarações em suas páginas. A decisão de modificar os padrões vigentes no diário, um dos mais importantes dos Estados Unidos, aconteceu após meses de discussões, por um grupo de editores do ‘Post’, do caso Jayson Blair. O repórter do ‘New York Times’ envolveu-se num escândalo jornalístico em maio de 2003, quando o próprio jornal o desmascarou, acusando-o de inventar, plagiar ou falsificar muitas de suas histórias.

As novas diretrizes foram anunciadas pelo editor-executivo Leonard Downie Jr. num memorando interno enviado na quarta-feira aos funcionários do jornal.

— Decidimos que, no rastro de algumas das coisas que têm acontecido em outros lugares, devíamos preparar um guia mais detalhado para as nossas políticas, atualizar algumas delas, e deixá-las mais claras — justificou Downie. — Há dois objetivos primordiais: um é sermos justos e exatos nas nossas reportagens; o outro, sermos mais transparentes com nossos leitores.

Repórteres não corrigirão mais as declarações

Entre as mudanças mais significativas introduzidas pelo jornal está a reprodução de declarações dos entrevistados. A partir de agora, todas elas deverão ser transcritas exatamente como foram colhidas pelos repórteres.

— Acho que, com boas intenções, as pessoas tentaram corrigir a gramática em alguns casos — disse Downie. — Tudo mais deve ser parafraseado.

Há também novas regras no que diz respeito à utilização de fontes nas reportagens. O ‘Washington Post’ exige agora que pelo menos um editor conheça a identidade de uma fonte confidencial usada em determinada história. Segundo o editor-executivo, dessa forma caberá aos chefes do jornal decidir se o uso da fonte é ou não pertinente.

Garganta Profunda ainda seria usado como fonte

O ‘Post’ determinou que as entrevistas em off, sem que a fonte se identifique de forma alguma, não devem mais ser utilizadas. As novas diretrizes recomendam aos repórteres do jornal que não se envolvam mais em conversas desse tipo. Já as informações sem atribuição da fonte, mas com algum tipo de identificação, podem ser usadas. A fonte deverá ser identificada, por exemplo, como ‘um funcionário da Casa Branca’.

Já informações vindas de pessoas com conhecimento profundo de alguma área continuarão a ser usadas sem serem atribuídas a uma pessoa específica. Segundo Downie, o misterioso personagem Deep Throat (Garganta Profunda) — que deu aos repórteres Carl Bernstein e Bob Woodward as informações que levaram à queda do presidente Richard Nixon no Caso Watergate nos anos 70 — é o caso clássico desse tipo de fonte. Acredita-se que Deep Throat fosse um membro do primeiro escalão do governo Nixon, com acesso a informações importantes sobre a tentativa do presidente de espionar os democratas, o que levou à sua renúncia.’



ITÁLIA
O Estado de S. Paulo

‘Câmara ‘salva’ rede de televisão de Berlusconi’, copyright O Estado de S. Paulo, 21/02/04

‘A Câmara de Deputados da Itália aprovou ontem projeto de lei que ‘salva’ uma das redes de televisão do primeiro-ministro Silvio Berlusconi – a Retequatro. A emissora poderá continuar a difundir sua programação pelo sistema analógico. Pela lei anterior, ela deveria adotar o sistema digital, via satélite, o que, segundo seus diretores, resultaria em grande prejuízo comercial e demissões em massa.’