Friday, 26 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Com o Legislativo será mais complicado

A façanha de extinguir o nepotismo no Judiciário tem três heróis. Pela importância da sua atuação: o recém-criado Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que considerou a questão como prioritária; o expressivo endosso do Supremo Tribunal Federal, que liquidou qualquer dúvida sobre a validade da decisão (o único voto contrário não entrou no mérito do assunto); e, finalmente, a mobilização da imprensa, apenas razoável (poderia ter sido mais vigorosa desde o início).


O respeito e as esperanças que envolvem o CNJ são, paradoxalmente, um doloroso lembrete para a mídia brasileira. A moderna democracia não pode dispensar a existência de agências, conselhos e órgãos reguladores, devidamente legitimados, com ou sem poder efetivo, mas capazes de identificar as novas zonas de conflito e indicar soluções. O Judiciário relutou, mas aceitou um conselho fiscalizador.


A mídia brasileira perdeu, talvez definitivamente, uma oportunidade histórica para dispor de uma instância de discussão quando o senador José Sarney resolveu esvaziar o Conselho de Comunicação Social – órgão auxiliar do Senado criado pelos constituintes de 1988 – dois anos após a sua instalação (2002). Graças à arbitrariedade do ex-presidente da República, o debate sobre questões como a TV Digital trava-se agora nos corredores palacianos entre lobbies, quase às escondidas. Para a felicidade das redes de televisão (das quais Sarney é beneficiário) e do governo federal (mais preocupado com as eleições e o apoio da mídia do que com qualquer outra questão).


Teste definitivo


Talvez por estranhar a existência do CNJ ou não ter repórteres especializados para cobrir as suas atividades nossa imprensa tenha demorado a reagir aos renitentes magistrados adeptos do nepotismo.


E agora, como é que esta imprensa vai levar adiante a tarefa de enfrentar o nepotismo nos demais poderes da República? Como forçar os legisladores a abrir mão de um privilégio já institucionalizado? Se o Legislativo não pode ser submetido a um órgão regulador ou fiscalizador – e se os próprios legisladores são as fontes de informação para a imprensa – como e onde é que os repórteres obterão as informações para alertar a sociedade?


A batalha contra o nepotismo no Legislativo tem todos os ingredientes para se transformar num teste definitivo da garra, espírito público e a independência da nossa imprensa.