Thursday, 28 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

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COPA 2006
Antonio Brasil

A culpa da televisão pelo fracasso da seleção, 3/07/06

‘‘O segredo da verdade é o seguinte: não existem fatos, só existem histórias’

Epígrafe de Viva o Povo Brasileiro de João Ubaldo Ribeiro

Não faltaram histórias na cobertura da Copa da Alemanha pela televisão brasileira. Faltaram fatos e verdades. Ainda em estado de choque, os brasileiros tentam entender por que o Brasil fracassou. Quem seriam os responsáveis pela derrota da melhor seleção do mundo? Mas, segundo o treinador da seleção Carlos Alberto Parreira, ‘não é hora de buscar os culpados. É hora enterrar o defunto’. Discordo. É hora sim de buscar o segredo da verdade, os fatos antes que eles também sejam esquecidos ou ‘enterrados’. Antes que eles se tornem meras ‘histórias’. É hora de buscar as razões do fracasso de um modelo de seleção e de um modelo de televisão.

Segundo a cobertura ‘excrusiva’, éramos os favoritos, os melhores do mundo e tínhamos o melhor jogador do planeta. O que aconteceu? É hora de investigar se a televisão teria ocultado a verdade e contribuído para um excesso de otimismo para garantir interesses comerciais.

Assim como a nossa seleção, a nossa televisão há muitos anos também está acomodada no passado e não se renova. Privilegia negociações secretas, interesses de patrocinadores e de políticos que garantem monopólios e contratos nebulosos de exclusividades.

Devemos exigir explicações de jogadores, técnicos e dirigentes sobre o fracasso da seleção. Mas também devemos investigar os acordos entre a CBF e a Globo que garantem não só os direitos exclusivos de transmissão de jogos mas também garantem uma cobertura jornalística de interesses mútuos com poucos fatos e muitas histórias.

Logo nos primeiros dias fomos surpreendidos com uma entrevista ‘excrusiva’ com Ronaldinho de carro a caminho da concentração. Longe dos competidores, no ‘sapatinho’, jogadores veteranos e jornalistas privilegiados selavam o acordo e trocavam elogios. A cobertura de muitas histórias e poucos fatos estava só começando.

O discurso afinado de sucesso garantido era contrariado pela verdade das imagens que mostravam um Ronaldinho chegando de jatinho particular, ‘enorme’ de gordo, totalmente desinteressado e fora de forma. A cobertura de TV preferia privilegiar as histórias, ocultar ou ignorar os fatos. A informação é obviamente dispensável ou negociável. O importante era garantir os privilégios de tantas entrevistas ‘excrusivas’ e os lucros da grande audiência para os jogos e para os sorteios ‘nebulosos’ da seleção do Faustão.

Na falta de fatos, a cobertura optou por histórias sem pé nem cabeça, banalidades e patriotadas em um grande festival de besteiras.

As notícias de verdade, os fatos poderiam prejudicar a audiência das transmissões exclusivas.

Nesta época, a competição televisiva é massacrada. Os dados parciais relativos ao Ibope comprovam a impressionante transformação que a Copa provoca no perfil da audiência da TV brasileira. Há destacar, no entanto, o heróico desempenho da equipe da Bandeirantes durante a Copa. Nada de muito criativo ou diferente. Mas valeu o esforço. Um pequeno Davi que enfrenta o gigante Golias. Não vence. Mas não fez feio.

De forma muito oportunista, o foco da cobertura só mudaria neste último final de semana. Ou seja, tarde demais. Após o fracasso o JN e o Fantástico resolveram buscar nas imagens os culpados pela derrota contra a França. Sobrou para o Roberto Carlos. De herói sempre bem humorado, divertido e disponível para tantas entrevistas exclusivas, virou o diabo, o ‘traidor’ da pátria.

Agora, tarde demais, começam a aparecer denúncias que ficaram ocultas durante a cobertura de interesse. Somos surpreendidos com racha entre os jogadores, reclamações contra a comissão técnica e a teimosia do treinador. É o jornalismo de oportunismo. Antes tudo era festa. Pouco jornalismo para garantir altos índices de audiência e ainda maiores interesses comerciais.

Em clima de caça às bruxas, o Fantástico, parafraseando Jean-Paul Sartre, para parecer chique e intelectual, anuncia que o ‘inferno não são os outros’. São certos jogadores e treinadores. Nenhum jornalista. Para mim, o inferno é ter que aturar mais besteiras do Big Brother Bial.

Com uma cobertura de verdade única, a televisão confundiu jornalismo com patriotismo. Jornalistas acompanham a linha de narração dos jogos no estilo Galvão Bueno e, ao invés de informar, torcem e distorcem. E ainda pior, limitam e excluem qualquer competição.

É preciso repensar a Copa do Mundo na TV. Assim como exigimos a renovação da seleção, também deveríamos exigir a renovação da televisão. Não há mais lugar para uma cobertura com excesso de besteiras e pouquíssimas notícias de verdade.

É hora de aposentar Roberto Carlos, Cafu, Parreira, Zagalo, Galvão Bueno, Fátima Bernardes e tantos outros. É hora de inovar e renovar. Não há mais lugar para um modelo único e ultrapassado de televisão.

É importante investigar o que ocorreu com a nossa seleção e com a cobertura da nossa televisão. Mas ‘enterrar’ os fatos? Jamais. É hora de pensar no futuro, nas campanhas eleitorais. Ou será que a Globo também vai garantir os direitos de exclusividade nas próximas eleições?’




Eleno Mendonça

E então, vamos trabalhar?, 3/07/06

‘O comércio fechou mais cedo, a indústria dispensou, o Brasil parou. A venda do Dia dos Namorados, a terceira data em importância comercial, perdeu em relação ao ano passado. Em dias de jogos as vendas caíam até 50% nos shoppings. Tudo isso para não falar nas toneladas e toneladas de apitos, reco-recos, camisetas e outros artigos que só dizem respeito à Copa da Alemanha e que terão de praticamente serem jogados no lixo. Afinal, quem vai comprar uma camisa da Seleção Brasileira a essa altura? Para um país como o Brasil, que precisa crescer, que tem de gerar empregos, é hora de tentar recuperar o terreno perdido, é hora de trabalhar.

Lógico que todo mundo fica maravilhado, hipnotizado, entorpecido pelo Brasil do futebol na Copa. Até os políticos não resistem. Falar todo mundo é forçar um pouco, vamos dizer a maioria. Mas depois da derrota, das exibições pífias do Brasil e das reações dos ‘nossos’ craques, não há quem não tenha pensado: que bobagem ter torcido tanto por isso. A verdade é que os jogadores estão longe demais do Brasil, entendem o futebol sem a dimensão da maioria. Para eles, como eles mesmos disseram, foi apenas um jogo, no qual se perde ou se ganha. Não é bem assim.

Vendo pela TV, quantas personagens entre os brasileiros não fizeram um enorme esforço para torcer, comprar algo verde e amarelo e se sentir, ainda que por alguns dias, igual à maioria. O futebol na Copa tem esse ar mágico de juntar do desempregado ao empregador, o rico e o pobre, todos no mesmo grito. Mas será que a estrutura vale a pena todo esse sacrifício, esse patriotismo que felizmente aflora?

Desde o fim do jogo o que vimos foram jogadores rindo, fazendo sinais de positivo. Ontem, numa entrevista ao programa Pânico, ao vivo e sem se ter combinado nada, Roberto Carlos disse que estava chateado, que tinha ido jantar com amigos em Madri. Ao fundo, o que se ouviam eram gargalhadas. Deve estar sofrendo muito mesmo.

Bem, a verdade é que o Brasil parou, os expedientes foram postos de lado, as empresas estão com produção bem abaixo da média. Isso não contribui com as nossas carências econômicas e sociais. Todo mundo fala que em ano de Copa e de eleições a economia cresce. A imprensa deve se preparar para os números que virão por aí. Além da derrota na Copa há na conta dos ‘nossos’ craques mais esse contencioso. Lógico que se ganhassem todas, ninguém iria pensar nisso, mas perder a Copa, do alto do sapato alto e do favoritismo e ainda ver a economia do País sofrer, ninguém merece.

(*) Também assina uma coluna no site MegaBrasil, é diretor de Comunicação da DPZ e âncora da Bandnews. Ele passou pelo Estado de S. Paulo, onde ocupou cargos como o de chefe de Reportagem e editor da Economia, secretário de Redação, editor-executivo e editor-chefe, Folha de S. Paulo, O Globo e Jornal do Brasil.’

Luís Peazê

A TV Globo não faz jornalismo, apenas entretém, 27/06/06

‘Fonte:Clínica Literária – Carlos Alberto Parreira, técnico da seleção brasileira de futebol, ficou irritado com reportagem da TV Globo que revelou, através de leitura labial, suas exclamações obscenas durante um jogo da Copa do Mundo (2006). Ele alegou que sua privacidade foi invadida, e a TV Globo lhe enviou carta pedindo desculpas. Mais ou menos como o Presidente Lula fez com Ronaldo Fenômeno, depois de brincar de modo inapropriado ao vivo para o país inteiro, de uma sala do Palácio do Planalto, com a espetacularização que vinha sendo feita pela imprensa esportiva sobre o peso do jogador.

Se esta prática de pedir desculpas virar moda, o jeitinho brasileiro terá uma nova versão para se expressar, criando mais um traço negativo na nossa cultura. Mas parece funcionar satisfatoriamente para ambas as partes. O veículo continua de bem com a fonte, conseguindo exclusivas, e a fonte mostra a força de sua influência. Nada mais hipócrita. No caso do Presidente Lula, está claro que foi um golpe, desastrado, de oportunismo eleitoreiro, para vergonha nacional. Já, no caso da TV Globo, há nuances sutis que a classe (de jornalistas) talvez devesse discutir. Sem falar que o grande público talvez não tenha percebido. Vejamos:

É curioso que o técnico da seleção não sinta a sua privacidade invadida, quanto às teleobjetivas (e microfones) da imprensa mundial presentes nos estádios, onde e através dos quais ele se exibe para milhões de pessoas. Muitas perguntas ingênuas suscitam desta questão: então o futebol é um espetáculo tipo cinema mudo? O que os jogadores, técnicos e juízes falam durante o jogo não pode ser publicado? Só o que a torcida grita, em coro? E, se um torcedor em particular tiver o seu grito publicado, terá um pedido de desculpas da TV Globo, se ficar irritado?

Mas é claro, a TV Globo não perderia a chance de continuar tendo exclusivas privilegiadas e imediatamente achou um subterfúgio para contornar a situação. Pediu desculpas publicamente, em cadeia nacional, no horário nobre, pela sua melhor âncora de telejornal, a Sra. Fátima Bernardes. E ela é tão hábil, que foi capaz de ironizar com elegante sutileza, no texto de desculpas, a qualidade de educado do técnico da seleção. Mas traiu-se vergonhosamente, para quem é do ramo, ao iludir o público, e o próprio Parreira, informando que o quadro de leitura labial era uma matéria de entretenimento, da revista digital Fantástico, e que o público assim a interpretava.

Público esse, diga-se, ensandecido por uma euforia romanesca na Copa do Mundo, numa batalha campal de ego-exibicionismo, para entreter extraterrestres, provavelmente. Tudo muito coerente com o cenário urbano midiático, pois, há muito tempo que o jornalismo é quase tão somente entretenimento, show, espetáculo, não é integralmente sério, não é profundo, e raramente é imparcial. Numa metáfora arriscada, poderíamos dizer que há muito tempo o telejornalismo é uma grande leitura labial, apenas.

(*) Luís Peazê (MTB 24338) é escritor e jornalista http://www.clinicaliteraria.com.br/clinicaliteraria.htm

Milton Coelho da Graça

Leitura labial, 28/06/06

‘A encrenca entre o programa ‘Fantástico’ e o técnico Carlos Alberto Parreira bota outra vez em discussão o significado de ‘privacidade’ e os limites nas relações entre a imprensa e as celebridades.

Nada pode ser mais ‘privado’ do que o ocorrido entre o presidente Clinton e a jovem gordinha Mônica Levinski numa dependência da Casa Branca, com as portas fechadas à chave.

Mas, num estádio de futebol, com dezenas de milhares de espectadores, um protagonista de espetáculo esportivo, técnico de um dos times, pode exigir ‘privacidade’ ao comentar ou opinar sobre algo relativo a esse espetáculo?

E o jornalista, em busca de informar da melhor maneira possível o público interessado no espetáculo e seus personagens, tem ou não o direito de revelar o que acontece em campo, nos bancos das equipes, nas tribunas de dirigentes e nos vestiários? Nessa busca, ele tem ou não o direito de colar o ouvido em portas, fingir-se de gandula, usar gravador e, eventualmente, aprender a ler lábios ou pedir a ajuda de quem já saiba fazer isso?

Sinceramente, não vejo qualquer violação da ética profissional no trabalho feito pela equipe do ‘Fantástico’. Com gravador escondido, já fingi ser segurança no salão de banquetes do Waldorf Astoria, para saber o que banqueiros pensavam sobre a dívida externa brasileira. Ou as conversas entre Ayrton Senna e engenheiros japoneses sobre os segredos do motor Honda. Qual é a diferença entre usar gravador ou leitura labial para obter informações que o público tem todo o direito de conhecer?

Parreira tem mostrado um ranço autoritário em relação à imprensa, que o leva até a considerar ‘um exagero’ o número de jornalistas enviados por jornais e tevês à Alemanha. Isso ele achou bacana dizer em entrevista coletiva.

Ele receia trocar Emerson por Gilberto Silva e acha filho da p… ou coisa parecida quem critica a escalação da dupla Ronaldo-Adriano. Isso ele queria que só o Zagalo e o Américo Faria soubessem.

Que tal todos nós aprendermos leitura labial?’



ELEIÇÕES 2006
Carlos Chaparro

Cuidar do jornalismo, não das candidaturas, 30/06/06

‘O XIS DA QUESTÃO – As turbulências, as ganas, as canalhices, as simulações, as espertezas e os falsos acontecimentos que recheiam as campanhas eleitorais, impõem aos profissionais do jornalismo o dever social e político de zelar pela confiabilidade do seu ofício e do seu trabalho. É preciso cuidar do jornalismo, não das candidaturas. E deixar aos candidatos o exercício do convencimento.

1. ‘Artes’ do convencimento

No mesmo dia e na mesma página em que a Folha de S. Paulo informava que, em 2004, o setor bancário abocanhou 22,7% do lucro obtido pela totalidade das empresas de capital aberto, e que em 2005 o lucro dos bancos cresceu 36% em relação ao ano anterior, um título a quatro colunas anunciava a síntese de mais um discurso presidencial: Cuidar de pobres é ‘fácil’ e ‘prazeroso’.

Segundo a Folha, o dito presidencial deu-se na seguinte forma ‘Seria tão mais fácil a gente governar se tivéssemos que cuidar só dos pobres. Os pobres não dão trabalho (…). Não têm dinheiro para ir protestar em Brasília, para fazer passeatas. (…) O pobre quer apenas um pedaço de pão, enquanto o rico, muitas vezes, quando encosta na gente, quer um milhão’. E para amarrar o raciocínio, a revelação de que ‘fazer política para pobre é uma coisa prazerosa (…)’.

Como todos sabemos, o autor da fala é o mesmo Luiz Inácio Lula da Silva que fez carreira de líder popular em passeatas históricas, greves gigantescas e protestos que sacudiram o país, entre vinte e trinta anos atrás. Mesmo que não se leve em conta o contexto de lutas em que Lula construiu história e identidade política, não há como deixar de repudiar a fala infeliz. Por mil razões e mais uma: quem a pronunciou foi alguém que, ao falar, mesmo em performances de candidato, age inevitavelmente como Presidente da República de um país que, em seus objetivos democráticos e republicanos, tem o compromisso de erradicar o vilipêndio social da pobreza.

Acredito que o tropeço retórico saiu num daqueles irresistíveis impulsos de palanque, em mais um dos incontroláveis improvisos do presidente candidato à reeleição. Mas o que foi dito está dito. E dito conscientemente, com significado de ação político-eleitoral, para imediatos efeitos de convencimento.

Sim, no palanque de Contagem (MG), onde o discurso aconteceu, o candidato e presidente Lula praticou, com a já conhecida empolgação, o exercício do convencimento, tentando atrair o voto dos pobres. Fez o que todos os candidatos já fazem em todos os palanques, e mais farão daqui para a frente: tentar mover as mentes, pelo convencimento.

2. Utilização do jornalismo

Para influenciar mentes e vontades, as ações eleitorais vão usar, de forma combinada, seis técnicas de convencimento: a manipulação, a chantagem (nem sempre apenas emocional), a propaganda, a sedução, a demonstração e a argumentação.

Para que tudo dê certo, os estrategistas das campanhas gastam boa parte do dinheiro em pesquisas mais ou menos científicas, para a elaboração de cenários de tendências de voto e de demandas discursivas ou reivindicatórias. É o lado racional das campanhas. Com base nesse conhecimento, definem-se as estratégias de convencimento, traduzidas em táticas oportunistas para mover mentes, táticas com as quais se criam e socializam simbologias e ‘verdades’ sedutoras.

Quando falam, porém, os candidatos usam, fundamentalmente, a argumentação. O que significa dizer: tentam convencer pelo vigor, pela coerência e pela clareza das razões, sem a utilização de qualquer violência – nem física nem persuasiva.

A argumentação é o nível mais nobre e socialmente mais convincente das ações discursivas das campanhas eleitorais. E não por outra razão, a utilização do jornalismo é tão importante para as candidaturas.

Quando Lula, Alckmin e os outros candidatos criam eventos noticiáveis em ritmo diário, a verdadeira ação que realizam é a de utilizar intensamente o jornalismo, com técnicas argumentativas que provoquem ou aumentem, no eleitorado, a adesão às teses que lhe são apresentadas.

3. Zelar pelo jornalismo

Como linguagem e espaço público socialmente confiável, o jornalismo tem aptidões particulares para o exercício do convencimento pela argumentação.

Como esquema de expressão discursiva, a argumentação tem, no jornalismo, classes de texto específicas, especialmente eficazes, a principal delas o artigo, em suas várias espécies. Mas se espalha, também, pelas formas narrativas, em especial pela reportagem e pela entrevista, que servem fundamentalmente à revelação e socialização do que os sujeitos sociais dizem e fazem de relevante.

Quer pelas formas próprias do esquema argumentativo, quer pela utilização que os protagonistas da atualidade fazem da narração jornalística, a argumentação eleitoral se espalhará pela totalidade do jornalismo.

Assim, o jornalismo cumpre o papel importante de se oferecer à sociedade como linguagem confiável e espaço ético dos embates argumentativos do processo eleitoral. Mas as tensões desses embates criam, também, enormes riscos para o jornalismo.

As turbulências, as ganas, as canalhices, as simulações, as espertezas e os falsos acontecimentos que recheiam as campanhas eleitorais, impõem aos profissionais do jornalismo o dever social e político de zelar pela confiabilidade do seu ofício e do seu trabalho.

Em poucas palavras, quero dizer o seguinte, aos profissionais escalados para trabalhar na cobertura jornalística da campanha eleitoral: cuidem do jornalismo, não das candidaturas; deixem o exercício do convencimento para os candidatos, em seus embates; e, na medida em que puderem, ajudem os cidadãos (leitores, telespectadores, ouvintes…) a organizar a argumentação do seu próprio voto – com informação, desvendamento, elucidação, honestidade e independência.

(*) Carlos Chaparro é português naturalizado brasileiro e iniciou sua carreira de jornalista em Lisboa. Chegou ao Brasil em 1961 e trabalhou como repórter, editor e articulista em vários jornais e revistas de grande circulação, entre eles Jornal do Commercio (Recife), Diário de Pernambuco, Jornal do Brasil, Folha de S. Paulo, Diário Popular e revistas Visão e Mundo Econômico. Ganhou quatro prêmios Esso. Também trabalhou com comunicação empresarial e institucional. Em 1982, formou-se em Jornalismo pela Escola de Comunicação de Artes, da USP. Também pela universidade ele concluiu o mestrado em 1987, o doutorado em 1993 e a livre-docência em 1997. Como professor associado, aposentou-se em 1991. É autor de três livros: ‘Pragmática do Jornalismo’ (São Paulo, Summus, 1994), ‘Sotaques d’aquém e d’além-mar – Percursos e gêneros do jornalismo português e brasileiro’ (Santarém, Portugal, Jortejo, 1998) e ‘Linguagem dos Conflitos’ (Coimbra, Minerva Coimbra, 2001). O jornalista participou de dois outros livros sobre jornalismo, além de vários artigos (alguns deles sobre divulgação científica pelo jornalismo), difundidos em revistas científicas, brasileiras e internacionais.’



VIDA DE JORNALISTA
Cassio Politi

A confissão do Maníaco do Parque na capa de Veja, 30/06/06

‘O corredor era longo e cheio de portas. A jornalista escolheu uma entrada qualquer. Não era ali. Dirigiu-se a outra. Também não. Em uma parede ou outra, placas da Polícia Civil eram um lembrete de que os passos eram censurados. Enfim, entrou numa porta e ouviu atentamente o diálogo.

– Você matou algumas daquelas mulheres, Francisco?

– Matei.

– Quais?

– Todas.

– Quantas mulheres você matou?

– Nove.

– Você matou Isadora?

– Matei. Fui eu.

A carteira de identidade do Francisco em questão trazia dois sobrenomes: Assis Pereira. Os jornais o rebatizaram de Maníaco do Parque. O diálogo aconteceu no momento em que ele se encontrava pela primeira vez com seus advogados.

DHPP

A imprensa acompanhava remotamente desde 4 de julho de 1998 a caçada da polícia ao homem acusado de matar mulheres no Parque do Estado, em São Paulo. Ele estivera foragido e, quando foi preso, em 4 de agosto, no Rio Grande do Sul, os repórteres de Veja foram acionados.

Angélica Santa Cruz (hoje em O Estado de S.Paulo) recebeu a missão de cobrir o que acontecia dentro do DHPP (Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa), em São Paulo, com a profundidade que sustenta o conteúdo das revistas semanais. ‘Várias vezes na minha vida, fui para dar o furo e voltei com o ‘climão’. Desta vez, o ‘climão’ virou o furo.

Fontes perdidas

A jornalista acionou fontes, que aceitaram colocá-la dentro do prédio, no dia 05 de agosto, quando o Maníaco foi levado ao DHPP. O plantão de jornalistas na porta, comum na cobertura de crimes de grande repercussão, mal começara. Acompanhada das fontes, ela conseguiu furar o bloqueio à imprensa e entrar no prédio.

Havia pelo menos dois policiais que sabiam da presença de uma jornalista pelos corredores. Eles só não esperavam se perder dela, num dia agitado, em que o preso era uma celebridade macabra. Os policiais levavam Francisco de um lado para o outro, de uma sala para outra. Nessa confusão, Angélica se perdeu das fontes.

Sozinha, entrou em uma sala. Lá dentro, cabeças se viraram curiosas para a porta. Sala errada. Entrou em outra sala, errada de novo. ‘Era uma operação muito perigosa. A qualquer hora, alguém podia falar: ‘minha filha, saia daqui’. Ela chegou a pensar em desistir, mas, na quarta porta, acertou. ‘Não é uma história de heroísmo, mas posso dizer que foi dramático’. A recompensa pela procura foi maior do que ela podia imaginar.

Fui eu

Ninguém na sala reparou naquela jovem de vinte e poucos anos. Ninguém, aliás, imaginou que uma jornalista poderia estar na sala, ouvindo o diálogo de Francisco com seus advogados. Primeiro, ele negou todos os crimes. Angélica ouvia tudo atentamente e reagiu com humor à situação. ‘Fiquei pensando: ‘sou uma mala sem alça mesmo. Me perdi dos caras e agora estou aqui’.

Uma das advogadas aplicou suas técnicas para que Francisco, enfim, admitisse que praticou os crimes. Ela fez uma espécie de emboscada para, finalmente, ouvir o diálogo, que abriu a reportagem de Veja. ‘A partir daí, ele já deu detalhes. Disse, por exemplo, que ouvia vozes’.

Duração do furo

Angélica tinha um furo em mãos, mas não sabia quanto tempo ele duraria. Começava, aí, uma torcida para que o Maníaco do Parque assumisse a autoria dos crimes, mas somente depois que a revista estivesse nas bancas.

Se ele confessasse antes, não seria o furo. Se não confessasse nunca, a informação seria questionada para sempre. ‘É uma pressão muito comum em revistas semanais. Muitas vezes, o jornalista tem o furo, mas ainda está muito longe do dia do fechamento’.

Não fui eu

Um bom sinal veio quando a polícia ouviu Francisco, que negou todos os crimes durante várias horas de interrogatório. A essa altura, já agia sob orientação dos advogados para dizer coisas como ‘nunca matei ninguém’ e ‘devolvi-a inteira ao pai’, referindo-se a Isadora Fraenkel, uma das vítimas. Também antes da confissão, o programa do apresentador Carlos Massa, o Ratinho, teve recorde de audiência ao mostrar o encontro de Francisco com o pai.

A reportagem de Veja foi às bancas no dia 8 e repercutiu rapidamente. Começou a discussão clássica. A imprensa questionou a veracidade da informação. Se o acusado negou à polícia, como Veja poderia obter uma confissão? Depois de explicada a presença da repórter no DHPP, o questionamento passou a ser a legitimidade da entrada da jornalista no prédio da Polícia. A OAB chegou a instaurar procedimento para verificar se os advogados foram responsáveis pelo vazamento da confissão informal a Veja.

Foi ele

‘Saíram matérias questionando como Veja conseguiu aquilo. Em situações como essa, isso é normal, por se tratar de uma situação improvável. No DHPP, policial não sabia quem era advogado e advogado não sabia quem era policial. Chegaram até a falar que eu tinha me passado por advogada’.

No mesmo sábado em que Veja foi as bancas, a advogada de Francisco de Assis Pereira, Maria Elisa Munhol, admitiu que ele era culpado por nove crimes, alegando que os cometeu por ser doente.’



JORNAL DA IMPRENÇA
Moacir Japiassu

A Copa dos espertos, 29/06/06

‘Somos nós o horizonte

onde aportarão os exércitos

sem direção

(Nei Duclós in No Mar, Veremos)

A Copa dos espertos

O considerado Fausto Osoegawa, de São Paulo, conferia no Jornal do Brasil Online as verdades e mentiras sobre o futebol quando divisou esta preciosidade abrigada sob o título Falsos deficientes argentinos descobertos na Copa:

LEIPZIG – Três torcedores argentinos fingiram ser deficientes físicos para conseguir ficar na área reservada para pessoas com essa dificuldade nos jogos contra a Holanda, disputada em Frankfurt, e México, que ocorrerá amanhã em Leipzig.

‘Ainda estamos com vergonha, mas não tínhamos outra alternativa, não podemos pagar 500 euros por um ingresso, se trouxemos 200 para todo o Mundial’, disse Claudio, um argentino de 29 anos.

Claudio e seus amigos compraram três cadeiras de rodas, com as quais conseguiram comprar os ingressos reservados para deficientes físicos. Mas a ‘trapaça’ foi logo descoberta, quando um deles, chamado Ernesto, começou a pular enquanto assistia à partida entre Argentina e Holanda.

‘Ele não sentava, nós não sabíamos como fazê-lo ficar quieto. O alemão que estava do nosso lado achava que tinha acontecido um milagre’, contou o terceiro do grupo, Gustavo.

Janistraquis adorou o ‘golpe’ e mais ainda o ‘milagre’, ó Fausto, mas tem certeza de que os rapazes não eram argentinos, todavia portugueses…

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Crioulo Doido

O considerado leitor está lembrado do Crioulo Doido, aquele genial ‘compositor’ de samba-enredo revelado ao mundo pelo não menos formidável Sérgio Porto/Stanislaw Ponte Preta? Janistraquis imaginava que o sambista estivesse a desfilar no cenário deslumbrante e grandioso da eternidade, porém está vivíssimo e acaba de ser flagrado por Janistraquis:

O amigo torcedor já se ligou na ‘tradução’ dos hinos dos países que disputam a Copa? Pois aquilo saiu da tresloucada lavra do já veterano Crioulo, contratado pela Globo para abrilhantar o evento. Porém, oficialmente o consagrado letrista amoita-se em Brasília, onde escreve os discursos que o presidente Lula decora e depois expele como se fossem improvisos da mais genuína cultura popular.

Êita cabra ladino!

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Leitura labial

A grande sacada do Fantástico foi a leitura labial do técnico e jogadores da Seleção. Janistraquis, que anda a confundir fair play com replay, festejou:

‘Excelente forma de aproveitar aqueles closes geralmente recheados de cusparadas e dedo no nariz, considerado! E, de quebra, ainda ficamos sabendo o que Parreira acha da imprensa esportiva…’

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Nei Duclós

Leia no Blogstraquis o poema intitulado Senha, do livro No Mar, Veremos (Editora Globo, 2001), cujo excerto é a epígrafe desta coluna.

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Bandido cassado

O considerado Julio Caldas Alves de Brito, de Petrópolis, passeava os olhos nas páginas de O Globo quando encontrou este título: Responsável por chacina cassado pelos cúmplices. O leitor foi assaltado pela certeza de que alguém comeu mosca lá na Redação do jornal:

O traficante Humberto Ferreira da Silva, vulgo Beto, do morro Santo Amaro, no bairro do Catete, deve, então, ser membro do CBC (Congresso Brasileiro do Crime); os cúmplices querem retirar seus direitos políticos, por ter comandado uma chacina. Se não fosse membro do CBC, seria caçado e não cassado, né mesmo?

Janistraquis concorda, ó Alves de Brito, mas teme que, futuramente, passem a cassar os bandidos e caçar os políticos.

‘Ou vice-versa, se é que me entendem’, esclareceu.

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Santo chinês

Deu nos jornais sob o título Cardeal quer apurar massacre de 89 na praça da Paz Celestial:

PEQUIM — No 17º aniversário do massacre ocorrido na praça da Paz Celestial, o cardeal Joseph Zen, maior autoridade da Igreja Católica na China, pediu uma revisão aberta e total de todas as mortes ocorridas durante o confronto entre forças militares do governo chinês e estudantes pró-democracia em 1989. Nunca houve uma contagem oficial dos mortos no incidente.

Louvei a macheza do, digamos, purpurado, com meus ultrapassados conceitos de sertanejo, porém Janistraquis alertou-me, ele que é um velho lobo de outras batalhas, como Djalma Santos em 1958:

‘Não é nada disso, considerado; o cardeal quer apenas virar santo e o caminho mais fácil é provocar as autoridades chinesas; ali, como sabemos, botar a boca no trombone é martírio certo.’

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O lobo da Suécia

Recordo a cena, pois a maioria da torcida brasileira ignora a história do lobo na primeira Copa vencida pelo Brasil: o lateral-direito titular da seleção em 1958 era o sãopaulino De Sordi. Até hoje se discute o motivo, mas na partida final, contra a Suécia, ele foi substituído pelo palmeirense Djalma Santos, o qual, como se diz, comeu a bola, anulou inteiramente a grande estrela do time adversário e inspirou esta frase do entusiasmado locutor Oduvaldo Cozzi:

‘Procuro Skoglund, o deus louro dos estádios escandinavos, e encontro o negro Djalma Santos, velho lobo de outras batalhas!…’

Djalma jogou apenas a partida final (Brasil 5 x 2 Suécia) e foi eleito o melhor lateral-direito da Copa.

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Veadagem

O leitor Carlos Augusto Lemos, de Belo Horizonte, jura que chutou o preconceito para escanteio, mas não entende por que nenhum jornal, rádio ou TV, nem mesmo os blogs comentam a obviedade segundo a qual o técnico da Alemanha, Jürgen Klinsmann, é uma ‘tremenda bichona’:

O considerado não acha que há evidências demais? Durante os jogos, o ex-craque está sempre acompanhado de um guapo rapaz e os dois parecem aqueles cachorrinhos do uísque Black&White; dizem que mora ‘na Califórnia’, mas vive mesmo em São Francisco, que é muiiiiiiiiito diferente de Hollywood e se transformou, há décadas, em refúgio da veadagem internacional.

Janistraquis acha que você é preconceituoso, sim, ó Carlinhos; afinal, hoje em dia a veadagem prolifera, viçosa, em todos os lugares; o chamado ‘Dia do Orgulho Gay’ não é ruidosamente comemorado até em Arapiraca?

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Mais frescura

Perplexo, Janistraquis foi informado de que a polícia precisa de autorização judicial para grampear telefone de bandido encarcerado:

‘É o fim da picada! O bandido está preso, comanda a quadrilha por meio do celular contrabandeado e mesmo assim a escuta policial só é possível com o jamegão do excelentíssimo juiz?!?!?!?!’

É, sem dúvida, excesso de frescura, mas estamos no Brasil e aqui, como sabemos, é grande o respeito de todos até no cabaré de Maria Leite.

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Demofobia

Leia no Blogstraquis o excelente artigo do considerado Elio Gaspari, intitulado A demofobia ajuda Lula, como ajudou Vargas e cujo ‘olho’ arregala-se assim: Se petista é festejado pelos banqueiros, é tido como um regenerado; se é festejado na favela, é um degenerado.

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Planta do segmento

O considerado Roldão Simas Filho, diretor de nossa sucursal no Planalto, de cujo varandão debruçado sobre o galinheiro é possível ouvir Lula a cacarejar sobre ovos alheios, como disse FHC (está no blog do Josias de Souza), pois Roldão dava uma olhada na página de economia do Correio Braziliense quando deparou com esta noticinha:

‘A Sadia inaugurou ontem (dia 26), em Uberlândia, sua segunda fábrica de margarinas e cremes vegetais. É a primeira planta deste segmento no estado de Minas Gerais.’

Roldão já avisou uma vez e avisa novamente:

Usada dessa forma, a palavra ‘planta’ é anglicismo perfeitamente dispensável. Em nossa língua, planta só tem dois sentidos: o de indivíduo vegetal e o de desenho de engenharia. Para o termo inglês plant temos outros sinônimos além de fábrica: usina, unidade (industrial), estabelecimento (industrial).

Roldão tem razão; é muito bom saber inglês, mas convém conhecer português.

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Nota dez

Robertão Porto escreveu em seu blog, que mudou de endereço e agora bate um bolão no UOL:

Confesso que, mesmo depois da vitória de 3 a 0 sobre a modesta equipe de Gana – que fica mais ou menos na diagonal da costa brasileira – não consigo entender por que o boletim Chance de Gol, que recebo por e-mail em casa – aponta a Seleção Brasileira com 32% de possibilidades de conquistar o título mundial e 49,5% de chegar à final.

Ah, como gostaria de entender esses números…

Leia a íntegra desse e de outros excelentes artigos de um Mestre da melhor crônica esportiva que o jornalismo brasileiro já produziu: Robertão Porto.

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Errei, sim!

‘DÚVIDA CRUEL – O Correio Popular, de Campinas, ao esculpir o perfil do piloto Rubens Barrichello: ‘(…) Tanto tempo envolvido com carros de corrida o fez terminar o colegial’. Eu derrapei em dúvida cruel: Rubinho teria terminado o curso e abocanhado o diploma? Rubinho teria terminado o colegial, isto é, posto um ponto final e se quedara semi-alfabetizado? Janistraquis acha que tanto faz como tanto fez, pois o colegial, no Brasil, mais galopa que acelera.’ (outubro de 1992)’



SLATE, ANO 10
Mario Lima Cavalcanti

Slate comemora 10 anos com grande história, 27/06/06

‘Cada vez que vejo um veículo online completando dez anos de vida (ou mesmo cinco), fico muito feliz. Primeiro porque eu já trabalhava com conteúdo online quando era comum publicações virtuais nascerem e morrerem num piscar de olhos, a tal Bolha da Internet. Depois porque, de certa forma, tal conquista – atravessar uma década – contribui com o enriquecimento, amadurecimento e credibilidade do meio online.

Na semana passada, a Slate, a famosa revista virtual americana de variedades, completou sua primeira década de vida. Para celebrar o aniversário, o veículo lançou no último dia 25 de junho seu novo layout. Entre as principais mudanças estão um novo logotipo, uma exploração de imagens maiores e uma home page mais larga. Jacob Wesberg, editor da Slate, e Julia Turner, editora associada, apontaram ainda – em artigo assinado pelos dois – que a revista passou por ‘uma série de outras modificações que devem tornar a navegação mais fácil’.

Reformas gráficas à parte, no caso da Slate, o mais atraente é a grande história que o site carrega. Uma das publicações virtuais de maior sucesso no mundo todo, ela está entre as principais responsáveis pela evolução do formato ‘revista virtual’ e, mais que isso, uma das responsáveis por se criar a cultura de ler na Internet, de sentir prazer em acessar um veículo digital.

Foi a Slate que fez internautas e jornalistas lamentarem, em junho de 2002, a morte de Scott Shugger [leia aqui o artigo no Comunique-se]. O jornalista ganhou destaque como editor do weblog ‘Today’s Paper’, que analisa os principais jornais americanos e que é mantido pela Slate desde 1997. Sua morte seria uma das primeiras perdas do jornalismo online.

Foi a Slate também que se mostrou lúcida ao perceber cedo o fenômeno do podcasting e ao experimentar [leia aqui artigo no Comunique-se] recentemente o envio de textos para iPods, dispositivo que tem a transmissão e execução de áudio e vídeo como sua principal característica. E, falando em lucidez, ainda como parte da comemoração da primeira década de vida, a revista convidou diversas, digamos, personalidades do meio online para escreverem sobre ‘o que há de errado com a Slate’. Os artigos foram reunidos e viraram uma série (aqui).

Difícil é apontar um veículo que cubra mídias digitais e não tenha dedicado uma boa nota ao aniversário da Slate. Alguns, como a ZDNet, foram além de pequenas notas. O portal de informações sobre tecnologia e negócios publicou um artigo com análises dos dez anos da revista feitas por críticos de renome na Web, entre eles Jeff Jarvis – do weblog Buzzmachine.com-, Jay Rosen – professor de jornalismo da Universidade de Nova York e autor do PressThink – e, pasmem, David Talbot, editor da revista virtual Salon, principal rival da Slate (que delícia!) – (aqui)

Certamente, foram dez anos bem construídos. Um exemplo para a informação online. Vida longa à Slate. E até a próxima! 😉

Em tempo

– Slate aposta em textos para iPods

– Jornalismo online órfão de Scott Shugger

– Notícias sobre a Slate publicadas no JW’



PDV NO ESTADÃO
Eduardo Ribeiro

Estadão cria plano de demissão incentivada, 28/06/06

‘Há várias semanas corriam, no mercado, rumores sobre uma lista de dispensa no Estadão. Falava-se que a empresa iria demitir um grupo de funcionários com salários elevados, para contratar jornalistas mais jovens por uma remuneração menor.

O movimento de fato estava sendo preparado e se iniciou na última semana, quando a empresa chamou para conversar vários de seus jornalistas com 20, 30, 40 anos de casa, disposta a negociar com eles uma saída honrosa e um pacote de benefícios que pudesse representar um prêmio para todos.

A empresa, pelo que apurou este Jornalistas&Cia, tinha como principal meta renovar seus quadros e também conseguir um alívio progressivo na folha de pagamento, uma vez que esses funcionários, em função do tempo de casa, tinham salários muito acima da média de mercado.

Foram dois anos de estudos, buscando soluções que pudessem contemplar os objetivos da empresa, sem levar prejuízos para seus mais antigos e fiéis colaboradores. Coisa rara no mundo da mídia, que não costuma sensibilizar-se com questões humanas, como estamos cansados de ver. Aliás, PDV em empresa jornalística, como foi quase o caso do Estadão, é coisa rara, raríssima.

No caso do Estadão, a empresa criou um plano, que denominou de Plano de Aposentadoria Incentivada. O diretor de Redação, Sandro Vaia, disse a este Jornalistas&Cia que trata-se de ‘um movimento de pessoal rotineiro provocado por razões operacionais internas. Há profissionais saindo, como haverá outros chegando. Em alguns casos há mudanças de relações de trabalho, em outros há trocas, tudo feito de comum acordo e com a participação ativa de todos os envolvidos. Faz parte do projeto de renovação e atualização permanente de nossas redações.’

Como um plano dessa natureza e com esse escopo, como era de se esperar, mexeria, como de fato está mexendo, com a vida de profissionais muito antigos, dedicados e com história dentro da empresa, buscou-se, na sua implementação, viabilizar os acordos com o menor impacto possível na vida das pessoas. Houve, inclusive, alguns profissionais que se anteciparam e pediram para fazer parte do processo, embora não seja o caso de todos. De um lado, buscou-se mostrar aos profissionais as razões da empresa, e, de outro, se ofereceu a eles um pacote de benefícios, analisado caso a caso, como um reconhecimento aos bons serviços prestados à organização. O pacote prevê pagamento de salários por anos trabalhados, extensão do plano de saúde em até um ano e vantagens vinculadas ao plano de previdência privada do Grupo Estado.

Algumas das festas de despedida tiveram direito a choro e a emoção, sobretudo a do repórter Mauro Carvalho da Silva (Cidades, Estadão), o Mug, que depois de anos incorporou o apelido ao nome, passando a assinar Mauro Mug. Além dele, outros dois repórteres que deixaram a empresa, todos com mais de 30 anos de casa, são Valdir Sanches e Marinês Campos (ambos do JT).

Outro profissional de grande identificação com o Estadão que está saindo é Eduardo Martins, 46 anos de empresa e autor de um dos maiores best sellers editoriais do Brasil, o Manual de Redação e Estilo do Estadão, que idealizou, editou e vem atualizando desde então. Eduardo era o chefe da Qualidade, ou seja, a pessoa que zelava para que o jornal tivesse o menor número possível de erros. Mas ele tem convite da empresa e está em acertos finais para continuar cuidando, como pessoa jurídica, do Manual de Redação e do corretor de texto, cujas palavras é ele quem controla, e também para ministrar cursos e escrever uma coluna no jornal. Nessa nova fase, ele passará a atuar em seu próprio escritório, atendendo no 11-3031-8121, e-mail eemartins@terra.com.br .

Deixam ainda a empresa a editora de Cidades Márcia Glogowski, que ficará no cargo até 3/7, quando regressa de férias, o sub Sérgio Pompeu, os repórteres Luiz Carlos Ramos e Luiz Roberto de Souza Queiroz, o redator Eduardo Magri (Internacional, Estadão) e os correspondentes Biaggio Talento (Salvador) e José Rodrigues (Santos).

O processo estendeu-se ao Arquivo, de onde saem Maria Aparecida Buorgermino e Marco Aurélio Tabosa, que tinham respectivamente 27 e 40 anos de casa.

As mudanças vão prosseguir e envolvem também a segunda parte que é a das contratações. Duas delas, aliás, já foram definidas: Eduardo Barella, vindo da Veja (editoria de Internacional), para o caderno Vida &, como sub, no lugar da Flávia Varella, que está de mudança para o Rio e ali atuará como colaboradora do jornal; e Chico de Góis (ex-Folha de S.Paulo) que trabalhará na cobertura das eleições, a partir de 3/7.

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E chega ao Brasil o diário gratuito, de grande porte

O Brasil está efetivamente entrando no circuito dos diários gratuitos, a exemplo do que já ocorre nos principais centros, na Europa e nos Estados Unidos, onde já circulam cerca de 160 jornais dessa natureza. O primeiro diário de grande porte, com tiragem de 200 mil exemplares, será lançado no próximo dia 6 de julho em São Paulo, com o nome de Destak. De olho no jovem, quer atingir pessoas de bom poder aquisitivo e situadas na faixa etária entre 18 e 35 anos, urbanas e modernas, com escolaridade média e alta e que buscam informação em revista, tevê e internet.

O novo jornal será distribuído em locais estratégicos da cidade, como estações do metrô, centros empresariais, universidades, shopping centers, hospitais e cruzamentos de avenidas como Faria Lima, Paulista, Brasil e Europa.

Nos planos da empresa está também a busca de receitas complementares através de ações inovadoras de marketing, como samplings de produtos anunciados e peças publicitárias com formatos diferenciados.

O novo diário tem 70% de investimento do empresário brasileiro André Jordan e 30% do grupo Cofina, um dos maiores grupos editoriais de Portugal.

Equipe – Destak será dirigido por Fábio Santos, ex-editor de Primeira Leitura e que passou ainda por República, Folha da Tarde e Agência Folhas, entre outros veículos; e terá como editora-chefe Bárbara Leite, ex-correspondente dos diários Correio da Manhã e Jornal de Negócios e da revista semanal Sábado, todos de Portugal.

Estão confirmados também os editores Majô Casarotto, ex-editora-chefe da Chiques e Famosos e com passagens por outras revistas da Símbolo, e Amauri Segalla, que foi 14 anos da Abril, com passagens por Veja, Placar etc; mais o editor-assistente José Carlos Pegorin, vindo de Primeira Leitura e que foi anteriormente do Diário do Grande ABC e da Folha de S.Paulo, e a editora de Arte Helena Jacob, ex-diagramadora de Estampa (Valor Econômico) e que também passou por Lance.

Completam a equipe: Marcelo Salinas, Liuca Yonaha, José Antonio Lima, Rodrigo Borges, Luiz Federico, Vinícius Vieira, Luana Sanches, Guilherme Jeronymo, Daniel Vardi e Ana Paula Santos. Outros jornalistas se juntarão à equipe, mas ainda não assinaram ou não se desvincularam de seus atuais empregos.’



HOJE SÃO BERNARDO
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Hoje São Bernardo estréia oferecendo toda tiragem como cortesia, 30/06/06

‘Estreou no ultimo dia 30/06 o jornal Hoje São Bernardo, que, buscando fidelizar seu público, vem oferecendo seus dez mil exemplares em caráter de cortesia na cidade do ABC Paulista. Com 36 páginas e formato standard, o jornal deverá encerrar a promoção na próxima sexta-feira (07/07), uma semana após seu lançamento, e passar a cobrar R$ 1,50 por exemplar.

O principal diferencial do jornal é seu foco local, com 12 páginas dedicas exclusivamente a cobrir a cidade de São Bernardo do Campo. A proposta da Empresa Jornalística Correio de Notícias, que lançou o jornal, é estabelecer uma rede de cinco periódicos na região, todos seguindo essa linha editorial de privilegiar a cidade onde atuam. Os jornais Hoje São Caetano, Santo André, Diadema e Mauá estarão nas bancas até o final do ano. A edição de Mauá cobrirá ainda as cidades de Ribeirão Pires e Rio Grande da Serra.

Com a proposta de atuar em rede, apenas as 12 páginas dedicas ao noticiário local irá diferir de um jornal para o outro. As outras editorias, como Esportes, Internacional e Política, terão conteúdo comum a todos os diários. Com essa iniciativa, o grupo pretende bater 35 mil exemplares de tiragem. Atualmente, o Diário do Grande ABC, estabelecido na região, roda 30 mil exemplares todos os dias.

Rose Rosa, diretora de redação, e Vanilda Oliveira, editora executiva, desenvolveram o projeto e formaram a equipe de estréia, que está completa desde 01/06, e vem trabalhando desde então para afinar o grupo e produzir um trabalho final mais bem acabado.’



JB & SEGURANÇA
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Jornal do Brasil cria nova editoria, 30/06/06

‘Junto com o confronto bandidos x polícia que parou São Paulo nasceu a editoria Segurança Pública no Jornal do Brasil. O caderno de apresentação foi publicado em 04/06 e, inicialmente, seria veiculado somente aos domingos. No entanto, segundo a editora do Segurança Pública, Inês Garçoni, o material produzido é tão grande que já ganhou mais dois dias fixos: segundas e quintas.

A idéia partiu do diretor de jornalismo do JB, Augusto Nunes. A editoria aborda grandes questões da segurança pública. ‘Sempre que acontecem grandes casos, como o de São Paulo, por exemplo, vemos os meios de comunicação fazendo matérias de análise e que se relacionam às políticas de segurança pública. Mas depois que a fumaça desce, ninguém mais fala no assunto. Com esta editoria, nós vamos sempre tratar dessas questões com o aprofundamento que o tema merece’, afirma a editora.

Juliana Rocha e Branca Nunes são as repórteres da editoria.’



JORNALISMO & SAÚDE
Luís Peazê

A saúde da imprensa, 3/07/06

‘Fonte: Clínica Literária – Desde que o rum creosotado deixou de ser vendido em armazéns de secos & molhados, a imprensa está doente de um mal que ela abomina, mas não percebe. A parcialidade. Pelo menos no que se refere à cobertura da saúde.

Não há enfermidade pior para um jornalista do que ser parcial. E a pior doença é aquela em que o ser enfermo não sente dor, os sintomas ficam escondidos, e quando eclodem já é tarde.

Depois dessa intoxicação de metáforas, logo no lead, vamos desatar o nó gordiano do título.

Quando a saúde é a pauta de um jornal, ser parcial é um erro devastador. É comum os repórteres entrevistarem médicos da medicina oficial, lesional, estrutural, hegemônica, e não contextualizarem com fontes de ‘outras medicinas’. É comum repórteres abordarem as questões dos remédios sintéticos, da indústria farmacêutica, da indústria química, e não contraporem às várias outras formas de terapêuticas ‘naturais’. Sem esgotar a lista de parcialidades, é comum repórteres abordarem o sistema de saúde pública e privada do ângulo dos hospitais, do Conselho de Medicina e do Ministério da Saúde, cegos aos riscos dessas liturgias sociais. Mas acredito que o fazem por pura ignorância.

Hermético? É o seguinte: o jornalismo não passa de uma crônica superficial de um mundo que se tornou complexo ao extremo. Só um idiota não percebe quanto ‘mal’ esconde este pano ‘um mundo complexo ao extremo’. Que esconde ‘bem’ também. Ou alguém discorda que o mundo de hoje é tão simples quanto o mundo do tempo do feuilleton?

As próximas linhas tentarão envelopar um assunto que demandaria laudas, pois ninguém mais lê artigo que ultrapasse 700 palavras, segundo os entendidos em textos ‘finger food’:

As simples expressões ‘outras medicinas’ e ‘naturais’, utilizadas acima, certamente levam a mente do jornalista apressado para um canto que ele julga ser de atores menores do cotidiano. Também não vale defender que há fartura de matérias sobre a homeopatia, por exemplo, os fitoterápicos, a medicina ortomolecular e etc. Por isso mesmo, porque essas matérias destacam essas terapêuticas como alternativas, no sentido menor do termo.

Teria o jornalista que cobre a saúde se transformado num Janus tolo, aprisionado onde a empresa, a coisa, a instituição são mais importantes do que o indivíduo? E por isso ele faz a sua pauta oficial somente daquilo que é oficial, como se o oficial fosse o mais saudável? Ele mesmo estaria se vendo como jornalista, não como um ser independente que pensa, ou melhor, que computa ergo sum, que processa informação? Enxerga que o empreendimento erguido em prol da saúde estatística adoece o indivíduo? Enxerga que a indústria de drogas (propriedade de conglomerados financeiros) é um dos mercados mais promissores da bolsa de valores, e isso tem efeitos colaterais? Que a ciência vem florescendo em prol do capital e da sua astúcia, em efeito viral? Enxerga que o estado adota esse enredo sórdido porque também não enxerga o indivíduo, só vê o contribuinte na coluna receita?

O bonde errado

Um ex-diretor financeiro de um laboratório farmacêutico americano declarou para o Herald Tribune (01/03/2003): ‘O primeiro desastre é se você mata pessoas. O segundo desastre é se as cura. As boas drogas de verdade são aquelas que você pode usar por longo e longo tempo’.

E é comum uma matéria de jornal atacar a notícia de que os remédios estão cada vez mais caros, mais proibitivos, como se isso fosse um mal. Consegue o jornalista enxergar outro ângulo? Que sinaliza para o mal que as drogas causam ao organismo humano; que sinaliza para os equívocos da terapêutica hegemônica. Por esse ângulo, seria bom que os remédios fossem mesmo proibitivos, proibidos, na verdade.

Só a Aspirina mata anualmente 10 mil pessoas por sangramento digestivo nos Estados Unidos. Recentemente a revista Época recomendou a adoção de Aspirina para prevenção da velhice. A terapêutica da medicina oficial se baseia apenas nos efeitos esperados das drogas sintéticas. Ignora os demais efeitos, não esperados e gerados pelo próprio organismo humano que tende a eliminar substâncias estranhas a ele, sobrecarregando suas funções, estressando-se além da conta. A medicina oficial condena à infelicidade do paciente qualquer complicação adicional, ou piora do seu quadro clínico, lava as mãos. Não é por acaso que os remédios nos Estados Unidos têm um mark up que chega a 1000%; para atender às eventuais demandas judiciais; e seus ciclos de vida são gerenciados pelo método da obsoletização em cinco anos.

Por fim, porque acabou o espaço aqui, a medicina é uma disciplina, não é ciência. E a medicina baseada somente na ciência e tecnologia mata mais do que as doenças e guerras podem arcar sozinhas; há várias medicinas modernas e tradicionais que tratam da saúde do ser humano fiéis à primeira lei de Hipócrates ‘primeiro não lesar’. O jornalista não está consultando essas fontes.

Assim, a própria imprensa adoece o mundo com o seu modo parcial de fazer a crônica diária da saúde. Veja, ilustre jornalista, o belo tipo faceiro que o senhor tem ao seu lado. E, no entanto, acredite: ele adoce, morre, porque o senhor pegou o bonde errado.’



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Clique nos links abaixo para acessar os textos do final de semana selecionados para a seção Entre Aspas.

Folha de S. Paulo – 1

Folha de S. Paulo – 2

O Estado de S. Paulo – 1

O Estado de S. Paulo – 2

O Globo – 1

O Globo – 2

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