Friday, 26 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

De onde vêm as idéias

Byron Calame confessa, em sua coluna de 7/5/05, que uma de suas grandes curiosidades em seus 40 anos de carreira é entender de onde e como surgem as idéias para os artigos dos jornais – excluindo, é claro, as notícias sobre os acontecimentos do dia. O ombudsman fala sobre os textos que analisam algum aspecto específico de um tema maior, como a guerra do Iraque ou as celebridades de Hollywood.

Além de querer saciar sua própria curiosidade, Calame conta que resolveu abordar o assunto por causa dos leitores. Há dois fatores ligados aos leitores, ele explica: primeiro, há aqueles leitores desapontados que acham que determinado artigo não deveria ser publicado ou criticam a suposta parcialidade na escolha e no tratamento do tema. Segundo, há os leitores que esperam que o jornal adicione algo a sua vida, ao antecipar em seus textos futuros desenvolvimentos ou ao fornecer análises ricas em questões complicadas, por exemplo.

Pesquisa

Desta forma, é a habilidade dos repórteres e editores em bolar boas e inovadoras idéias para estes artigos que determina o quanto o Times ‘adiciona valor’ à vida de seus leitores. Para entender o processo de ‘criação de idéias’ e avaliar se ele tem funcionado no jornalão em que trabalha, Calame fez uma pesquisa. O ombudsman analisou a primeira página das oito maiores seções da edição dominical do Times de 16 de abril. Ele excluiu as notícias do dia e os textos de colunistas. Sobraram 23 artigos. Com a ajuda de seu assistente, Calame enviou e-mails aos repórteres que assinaram os textos pedindo que contassem como surgiu a idéia para cada um deles.

As respostas revelaram que os repórteres tiveram grande parte das idéias, seguidos por seus editores. A idéia inicial de 16 dos 23 textos veio do repórter. Editores foram responsáveis pelas idéias básicas de cinco matérias, e não houve nenhum relato de que alguma idéia tenha ‘descido’ de um dos 13 editores do alto-escalão. Apenas duas das 23 histórias começaram com idéias sugeridas por assessores de imprensa.

Iraque, Baby Boomers e filhos de famosos

Calame dá alguns exemplos dos artigos encontrados em sua pesquisa. No texto ‘No Iraque dividido, ecos da Bósnia para as tropas americanas’, o repórter Jeffrey Gettleman descreve o trabalho das tropas que acompanhou em sua última vista ao Iraque. Ele ficou em uma área onde xiitas e sunitas se misturavam, e voltou aos EUA sem nenhuma pauta na cabeça. ‘Mas alguns dias depois’, contou Gettleman ao ombudsman, ‘eu me dei conta de que as tropas que acompanhei estavam tratando das tensões sectárias de maneiras novas, e isso virou a história. Um aspecto interessante era que o coronel destas tropas havia sido um pacificador na Bósnia e tendia a enxergar o Iraque sob um prisma da Bósnia’. O editor aprovou a idéia, e o topo do artigo foi dedicado ao coronel.

Alguns repórteres contaram ter conseguido as idéias de apurações para matérias anteriores. Foi o caso de Bill Pennington, que, quando fazia um artigo sobre o aumento de ferimentos entre atletas adolescentes, ouviu de um ortopedista que o mesmo estava acontecendo com seus pais. O jornalista diz que guardou a informação e passou a pesquisar dados que a corroborassem. O resultado foi o artigo ‘Baby Boomers se mantêm ativos, e seus médicos também’.

Entre os editores que tiveram a idéia inicial para cinco dos 23 artigos pesquisados, três tinham uma noção específica do que esperavam da pauta. As outras duas matérias surgiram de perguntas jogadas no ar pelos editores e desenvolvidas pelos repórteres. O editor da seção de Estilo, Trip Gabriel, é um destes exemplos. O repórter Alex Williams, autor de um artigo sobre nomes de filhos de celebridades, conta que, depois que a atriz Gwyneth Paltrow batizou seu novo filho de Moses, Gabriel divagou se haveria algo de novo a ser abordado sobre o tema. Williams passou a pensar no assunto, fez algumas pesquisas, e apresentou ao editor um novo ângulo: ‘nomes incomuns para filhos de celebridades tornaram-se o equivalente a um título real para esta nova classe de aristocratas americanos’.

Após sua pesquisa, Calame conclui que o Times parece ter um bom processo de ‘criação de idéias’, com profissionais interessados e habilidosos – o que permite que o jornal adicione valor à vida dos leitores.